Reinventar para ganhar o futuro

Por Francisco Pinheiro Catalão, professor universitário e Ph.D. em Gestão

Em termos globais, a pandemia da COVID-19, foi o mais recente acontecimento disruptivo que tem forçado, desde há cerca de ano e meio, empresas em todo o mundo a mudar a forma como faziam negócios ou a fechar portas. Quebras de vendas, disrupções tecnológicas e alterações nos padrões de consumo obrigaram as empresas e os seus gestores a repensar de forma profunda as suas estratégias e as suas cadeias de valor.

Também em Portugal, uma grande parte das empresas sai fortemente fragilizada e descaracterizada pela pandemia – exatamente quando o país parecia iniciar um ciclo sustentado de crescimento económico. Se, por um lado, avançamos décadas em muitos setores, com a digitalização e  a abertura de novos canais de vendas como o comércio eletrónico, noutros setores a destruição é grande e a recuperação não será simples.

Hoje, a prioridade passou a ser a recuperação destas empresas, mas o caminho para esta recuperação e para a retoma do crescimento é diferente para cada empresa e cada setor, exigindo uma combinação de planeamento estratégico e capacidade de tomar decisões. E como vivemos numa época de grande transformação, mesmo as empresas de maior sucesso têm que olhar para os seus planos estratégicos e reescreve-los de raiz para conseguirem conservar os seus ganhos.

No entanto, por onde começar esta recuperação, se o caminho para sairmos da pandemia está ainda repleto de riscos e incertezas, com constantes avanços e recuos? Quando atingiremos a imunidade de grupo? Será preciso nova campanha de vacinação nos próximos invernos? As vacinas atuais serão mesmos eficazes e seguras? Estas são algumas das dúvidas que se colocam, entre muitas outras.

Assim, as empresas têm que incluir esta incerteza nos seus planos estratégicos e nos seus exercícios de orçamentação para os próximos anos. Mas têm também que se tornar mais ágeis e flexíveis, de modo a conseguirem responder a novas vagas desta, ou de futuras pandemias. A capacidade das empresas para sobreviver e se tornarem mais fortes dependerá da forma como conseguem reagir num contexto de incerteza.

A capacidade de reinvenção de negócios e empresas tem sido e continuará a ser a chave do sucesso. No entanto, reinventar sobre pressão acarreta mais riscos do que numa situação normal de mercado, especialmente quando esta reinvenção é uma consequência e não uma opção e traz consigo o peso da recuperação. O ponto de partida para muitas empresas é já o de terrenos negativos.

Confinamentos, manutenção de distanciamento social, novos hábitos sociais, irão levar a novos choques, com mais alterações de padrões de consumo, que por sua vez irão obrigar novamente as empresas a reinventarem-se. O novo normal poderá ser a necessidade de reinvenção sucessiva para lidar em cada momento com a anormalidade e a inexistência de regras e padrões como os que tínhamos até 2019.

Neste ambiente de incerteza e de constantes alterações e transformação dos negócios, apenas as empresas flexíveis, que saibam planear e modelizar adequadamente o risco, ao invés de resistir à mudança, conseguirão ter sucesso e tomar a dianteira da recuperação. Mas também as que sabem gerir novas dinâmicas de consumo, a vontade de mudanças dos seus funcionários (teletrabalho), sem deixarem de investir, quer em inovação, quer em novas aquisições, com o objetivo de reforçar a sua posição competitiva.

A resiliência que muitas empresas demonstraram durante a crise, ao conseguirem melhor que outras adaptar-se às circunstâncias da crise de saúde pública, advém muito da rapidez de adaptação estratégica que lhes permitiu perceber, antes das outras, onde estavam os desafios e as oportunidades. Onde muitos viram dificuldades, alguns viram oportunidades e traçaram objetivos ambiciosos, agiram primeiro e investiram com força, tornando-se first movers o que lhes permitiu moldar o mercado à sua imagem e vontade. Estas empresas, em vez de criarem previsões e ficarem a vê-las falhar, desenharam cenários, geriram o risco, anteciparam incertezas e incorporaram estratégia de forma dinâmica e não cristalizada, muitas vezes revendo estas variáveis mensalmente.

O desafio, hoje, é que as empresas se organizem para que os processos de transformação sejam facilitados e efetuados com a menor dor possível.

Se a presente necessidade de reinvenção advém, sobretudo, da atual pandemia, esta não se esgota com o final desta emergência de saúde pública. É uma necessidade que sempre existiu e que existirá ainda mais no futuro e com intervalos de ocorrência mais curtos, fruto de novas disrupções tecnológicas, impactos geopolíticos, crises financeiras, alterações climatéricas, apenas para nomear os que me parecem mais relevantes.

Para estar preparada para se reinventar, uma empresa precisa que os seus gestores sejam, a cada momento, conhecedores das áreas com dificuldades em cumprir os objetivos com a qualidade e rentabilidades esperadas, bem como conhecedores do mercado e da sua evolução e, principalmente, que tenham identificados os principais focos que impedem a mudança, seja a nível organizacional, cultural, ou dos recursos humanos da empresa que lideram.

Independentemente da dimensão e do setor da empresa, tem-se observado ao longo do tempo que a reinvenção é muitas vezes a única resposta às crises e aos avanços tecnológicos. As empresas que conseguem reinventar-se sucessivamente, com uma visão de longo-prazo, coragem para investir em momentos complicados e capacidade para apresentar respostas consistentes em cada momento, são aquelas com maior capacidade de resiliência e de sucesso futuro.

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