Analistas chineses consensuais sobre importância estratégica de apoiar Rússia

A opinião dominante entre analistas chineses é que a China ganha mais do que perde ao apoiar a Rússia, apurou o grupo de reflexão Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), numa altura em que Pequim tenta reorganizar a ordem internacional.

Entre os analistas existe, no entanto, uma “clara frustração” com a incapacidade demonstrada pelo exército russo, indica ECFR, ‘think tank’ com presença em sete capitais europeias.

O relatório, intitulado “China e Ucrânia: O Debate Chinês Sobre a Guerra da Rússia e o seu Significado para o Mundo”, expõe a visão dos intelectuais chineses sobre a invasão russa do país vizinho em 2022 e a relação entre Pequim e Moscovo, com base em dezenas de entrevistas.

“Quase todos os analistas entrevistados referiram o fraco desempenho militar da Rússia, alguns com escárnio palpável”, lê-se no relatório, assinado por Mark Leonard e Alicja Bachulska. “Muitos parecem pensar que a Rússia não merece mais o estatuto de grande potência”, acrescenta.

O estudo indica, porém, que, a nível estratégico, os analistas chineses consideram que uma “lógica estrutural une intimamente a China e a Rússia”, perante uma ordem mundial liberal liderada pelos Estados Unidos e que ambos os países julgam antagónica aos seus interesses.

“Simplificando: se os EUA são o principal rival da China, é crucial que a América não derrote e humilhe a Rússia”, aponta o relatório sobre a visão dos analistas entrevistados.

Um proeminente académico chinês citado pelo ‘think tank’ considerou mesmo que os destinos políticos dos líderes da China e Rússia, Xi Jinping e Vladimir Putin, respetivamente, “estão interligados”.

“Como líderes dos dois maiores estados autoritários do mundo, ambos com ambições revisionistas, o seu objetivo comum é reorganizar a ordem internacional liderada pelos EUA para torná-la mais segura para as autocracias e a sobrevivência dos seus regimes”, observa o relatório.

Em fevereiro de 2022, duas semanas antes do início da invasão russa, Xi e Putin proclamaram uma “amizade sem limites” entre os dois países, durante um encontro em Pequim.

Numa declaração conjunta, os dois líderes opuseram-se ao alargamento da NATO na Europa de leste, numa tomada de posição inédita por um líder chinês sobre a arquitetura de segurança europeia.

Após o início da guerra, a China manteve uma posição ambígua, na qual apelou ao respeito pela “integridade territorial de todos os países”, incluindo a Ucrânia, e atenção às “preocupações legítimas de todos os países”, em referência à Rússia.

O relatório do ECFR indica que os analistas chineses “compartilham fortemente” dos argumentos de Moscovo, de que a Rússia tem “interesses de segurança legítimos” na Ucrânia.

“Nessa perspetiva, a Rússia aparece como ator racional, que simplesmente defende a sua posição no mundo da agressão ocidental, enquanto a Europa e os EUA parecem irresponsáveis e antagónicos”, argumenta o grupo de reflexão.

“Os intelectuais [chineses] tendem a não ver a Ucrânia como um importante ator independente no conflito. Isto alimenta a visão de que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia se transformou numa luta por procuração entre os Estados Unidos e a China – os únicos dois países a beneficiarem do conflito até agora”, lê-se.

“De acordo com essa lógica, a China beneficia da guerra porque coloca a Rússia numa posição mais dependente e faz os EUA parecerem os ‘promotores da guerra’”, observa.

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