70% dos portugueses defende que decisões importantes devem ser tomadas por referendo

Cinquenta anos após o 25 de Abril, um estudo recente revela que mais de metade dos portugueses (70%) deseja que as decisões mais importantes para o país sejam tomadas por referendos populares. Além disso, a esmagadora maioria (mais de 80%) é crítica em relação à classe política, considerando que “as elites defendem apenas os seus privilégios e regalias”, “são muitas vezes desonestos e corruptos” e “falam muito mas fazem pouco”.

Manuel Meirinho Martins, coordenador do projeto de investigação “50 anos de Democracia em Portugal: Aspirações e Práticas Democráticas – Continuidades de Mudanças Geracionais” do ISCSP/CAPP, explica ao Público, parceiro no projeto, que, apesar de os portugueses preferirem a democracia em detrimento de outras formas de governação, estão descontentes com o seu desempenho. “O profundo descontentamento e insatisfação com a classe política não é de agora”, afirma Martins.

O estudo, realizado pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa em parceria com o jornal, também mediu a adesão a diferentes atitudes populistas entre os eleitores portugueses. Segundo Martins, “os portugueses alinham-se com a ideia de uma sociedade dividida entre o ‘povo puro’ e a ‘elite corrupta’, uma visão frequentemente explorada pelos partidos da direita radical”.

Embora as eleições legislativas de 10 de Março tenham registado a maior participação desde 1995, a maioria dos portugueses não confia no processo democrático representativo. “70% são favoráveis à ideia de dar ‘às pessoas’ o poder de ‘tomar as decisões mais importantes para o país, através de referendos'”, destaca o estudo.

Quanto às atitudes antissistema e antielitistas, o estudo revela uma adesão significativa em todo o espectro político, com 76% no bloco central e 17% na extrema-direita. “É por ser tão consensual que os resultados eleitorais no espectro que mais cavalga o populismo – o Chega – conseguem esse nível [de percentagem de votos nas eleições legislativas]”, conclui Martins.

No que diz respeito à imigração, apenas 17% dos portugueses acreditam que a presença de imigrantes e refugiados é uma desvantagem para o país. No entanto, em Novembro de 2023, um estudo indicou que os movimentos anti-imigração em Portugal estão “cada vez mais organizados”, com manifestações recentes lideradas por grupos como o Grupo 1143 e o militante de extrema-direita Mário Machado.

Apesar das tendências populistas, Martins ressalta que “Portugal é uma democracia em consolidação” e que os portugueses valorizam a pluralidade de opiniões. “Apenas 3,7% consideram que ‘não é importante fazer compromissos entre diferentes opiniões e pontos de vista'”, afirma o coordenador do estudo.

Os portugueses que mais aderem a atitudes populistas são adultos com baixo nível de escolaridade, entre os 35 e os 64 anos, desempregados e com condições económicas precárias. “Estes dados mostram o que já tinha sido confirmado na população em geral: esta retórica populista ‘está fortemente enraizada'”, conclui Martins.

Quanto aos jovens, embora confiem menos nos políticos e alinhem-se na visão antissistema e antielitismo, são menos críticos em relação à imigração. “É na imigração que os jovens entre os 16 e os 34 anos mais diferem da restante população, ainda que apenas em quatro pontos percentuais”, revela o estudo.

O acumular de “casos e casinhos” políticos tem contribuído para uma maior desconfiança no eleitorado, com mais de 70% dos inquiridos a revelarem exposição a informação política, tanto nos meios tradicionais como nas redes sociais.

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