Accenture Digital Business: 2020 Fjord Trends (2.ª parte)

Tendência 4 – Pessoas líquidas

Em “As muitas faces do crescimento”, revelamos que o capitalismo está a ter uma crise de meia-idade, já que os valores sociais em mudança e a pressão das pessoas forçam os negócios a repensarem o seu enfoque numa definição limitada de crescimento. Pessoas Líquidas é o outro lado da mesma moeda: implica a reavaliação das pessoas sobre si próprias, sobre as suas vidas e o seu impacto no mundo à sua volta. Estamos todos a começar a questionar o que significa ser cliente e colaborador. O que está para lá do consumismo? O que está para lá da noção do trabalho simplesmente como uma forma de ganhar a vida?

  • O que está a acontecer?

O consumo não está morto, mas está a mudar. Durante anos éramos o que comprávamos, o que conduzíamos, o que vestíamos e o que comíamos. No contexto profissional e pessoal, éramos o nosso cargo e o que fazíamos. Estas ideias são agora desafiadas – juntamente com outros símbolos que antigamente usávamos para definir o nosso lugar no mundo, como a nacionalidade, a religião, a comunidade – porque aquilo que compramos e a razão pela qual trabalhamos se tornaram mais fluídas. Esta mudança está a ser estimulada por uma gama de factores, incluindo questões sobre alterações climáticas e um maior enfoque no bem-estar pessoal.

As pessoas sempre decidiram gastar mais em certos itens e menos noutros, considerados menos importantes. A diferença é que agora é mais habitual e visível. Por exemplo, muitos consumidores de carne não se importam de não a comer durante a semana, alguns clientes de moda sustentável continuam a viajar de avião e muitos colaboradores de empresas globais gerem projectos comunitários alternativos. Ou seja, procuramos um conjunto de diferentes valores naquilo que consumimos para lá da satisfação do consumo ou estatuto. O “valor acrescentado” que os marketeers procuraram durante décadas está a mudar de formato e a tornar-se ligado a formas imprevisíveis de auto-consciência.

O que se segue?

A tendência Pessoas Líquidas não é um derivado de novas definições de crescimento empresarial – é muito mais pessoal e profunda. Inicialmente deverá ganhar mais força nos mercados ocidentais, mais desenvolvidos, mas o seu impacto será abrangente com o passar do tempo. Eventualmente, a reformulação que as pessoas farão dos produtos que vêem como tendo falta de função ou como sendo dispensáveis também verá a redefinição do próprio valor.

Pessoas Líquidas sugere que precisamos de ligar muito mais profundamente a experiência do cliente à dos colaboradores. Se clientes e colaboradores procuram objectivos semelhantes, porque não ligá-los implícita ou explicitamente nessa procura? Imaginem que os colaboradores ficavam muito mais satisfeitos com os seus empregos se pudessem oferecer novos tipos de valor acrescentado aos clientes? Afinal de contas, 60% dos jovens que estão a começar as suas carreiras querem um emprego com impacto social.

Esta tendência não é uma mudança entre gerações – por outras palavras, não envolve apenas os millennials. O número de pessoas a pensar desta forma aumenta, à medida que se vão conhecendo melhor e compreendendo a sua quota de responsabilidade para com o planeta. Consequentemente, todas as organizações terão de pensar melhor no modo como criam e comunicam com as gerações de clientes e colaboradores.

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Reformular ofertas para a era do consumo consciente

  • Pensar
    Como é que uma marca permite que as pessoas se definam para lá do que consomem, do trabalho que fazem ou do salário que recebem? Como é que o negócio pensa nas pessoas para lá dos rótulos de “cliente” ou “colaborador”?
  • Afirmar
    Segundo a Accenture, é necessário que as empresas retirem a palavra “consumidor” do seu vocabulário, oferecendo às pessoas escolhas que lhes permitam flexibilizar e explorar a sua identidade.
  • Fazer
    Criar equipas de Perspectivas Humanas em vez de Perspectivas dos Clientes – as empresas devem concentrar-se menos no número de pessoas que estão a seguir acções específicas e mais nos contextos que rodeiam as suas decisões ajudando as pessoas a ultrapassar a ansiedade inerente às escolhas éticas.

Tendência 5 – Criar a inteligência

A inteligência artificial (IA) está a seguir em frente. Embora, ao início, fosse principalmente utilizada para melhorar a eficiência através da automatização inteligente, a sua próxima iteração implicará mais o aumento de novo valor e o apoio à criatividade humana. Se conseguirmos criar sistemas que ligam eficazmente as competências das pessoas à IA, seremos também capazes de conceber estratégias de negócio disruptivas, de capacitar pessoas para que lidem com o aumento da complexidade no trabalho e de melhorar a experiência humana.

  • O que está a acontecer?

Para muitas empresas, os primeiros sucessos da IA envolveram a automatização, tornando os dois sinónimos – um mal-entendido reforçado por uma narrativa persistente de que o aumento da IA reduz os custos laborais. Contudo, as organizações estão a começar a reconhecer que as máquinas têm limitações que as pessoas não têm: a IA têm dificuldade em reconhecer eventos imprevisíveis, em manter-se a par dos sistemas em evolução e em compreender como estas coisas afectam as pessoas.

À medida que os efeitos positivos e negativos da IA são revelados, testemunhamos opiniões divididas. Os negócios estão a acelerar os seus programas de IA, com 80% a revelarem que esta está agora em produção dentro da sua organização de alguma forma, embora os clientes e os colaboradores estejam a ficar desgastados com o impacto nas suas vidas. Para reconciliar estas diferenças, as organizações devem pensar para lá da automatização e começar a ver a IA como uma ferramenta dinâmica que os colaboradores podem usar para melhorar o negócio. Isto exige ferramentas mais adequadas e uma melhor ponderação dos efeitos económicos e sociais da apresentação da tecnologia. Conceber para a IA significa conceber para a inteligência humana e optimizar a relação entre pessoas e máquinas.

  • O que se segue?

Segundo a Accenture, as empresas de abordagens novas e sistemáticas para desbloquear todo o potencial da colaboração humana com a IA. Fizemos algumas perguntas importantes em 2018 que continuam por responder: como iremos interagir com as máquinas, como aprenderemos a trabalhar com as máquinas, o que irão aprender connosco e como iremos criar uma comunicação bilateral?

Se bem concebida, a IA pode ser usada para criar experiências que, além de serem personalizadas, nos ajudam a expandir as nossas capacidades. Pode melhorar a nossa visão, expandir os nossos conhecimentos, fazer-nos aprender melhor e comunicar de forma mais consciente. Além disso, ajuda- -nos também a lidar com a complexidade. A combinação da transformação digital com a globalização aumentou a velocidade, a complexidade e a escala das infra-estruturas empresariais. Isto exigiu que a maioria das grandes organizações estabelecessem equipas internas de ciência de dados. Contudo, para transformarmos as suas perspectivas em acções, temos de incluir ferramentas e serviços baseados na IA nestes sistemas cada vez mais complexos e dinâmicos.

IA e pessoas vêem o mundo de modos muito diferentes e se aproveitarmos a IA para a inovação, podemos obter ideias com as quais nunca sonhámos. Juntar esta inovação radical com consciência social humana tem potencial para resolver problemas de uma escala e complexidade ainda por imaginar. Não é uma corrida contra as máquinas, mas sim com as máquinas.

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Reformular a criação da Inteligência Artificial para que a inteligência humana passe para o próximo nível de criação de valor

  • Pensar
    Como podem as empresas tornar a IA parte de um processo de decisão estratégica e não apenas como automatização de tarefas individuais? Onde é que, nos seus processos, o contributo humano acrescenta mais valor e onde é que a IA é mais adequada? Quais as qualidades humanas que devem incluir intencionalmente na IA? Como é que podem gerir eficazmente a interface e a transferência entre pessoas e máquinas?
  • Afirmar
    Para facilitar os processos, a Accenture sugere que as organizações falem sobre IA em termos simples segundo aquilo que esta pode fazer – ver, ouvir, recomendar – em vez de descrições técnicas, como “visão de computador”.
  • Fazer
    As empresas devem confiar nos dados de IA para tomarem decisões e fazer um protótipo da vossa IA antes de investirem fortemente nela – os obstáculos para obter protótipos de IA caíram drasticamente, graças a plataformas online de protótipos.

Tendência 6 – Duplos Digitais

Tal como o 3D e os modelos de dados, só temos de tornar os gémeos digitais úteis, seguros e de fácil interacção. Agora estão a ficar pessoais e começou a corrida para criarmos manifestações virtuais de nós próprios. Inicialmente, oferecerão oportunidades de entretenimento personalizadas. Pouco depois, combinarão com outros serviços. Eventualmente, tornar-se-ão um lar virtual para todos os nossos dados sobre os quais teremos controlo (pelo menos teoricamente). Como requisito fundamental, marcas e serviços públicos devem aprender a conceber para os nossos novos duplos digitais – os poucos que aprenderem a criá-los serão os vencedores.

  • O que está a acontecer?

Para a Accenture, a agregação de algumas informações pessoais não é uma ideia nova; mas o que se avizinha vai para lá de um ponto de acesso central para dados estáticos. Na sua essência, um duplo digital trata-se de um conceito fácil de compreender. Agora só temos de o tornar útil, seguro e de fácil interacção. Neste momento, um gémeo digital é um modelo virtual de um processo, de um produto ou de um serviço físico. A combinação de virtual e físico permite que análises de dados e sistemas de monitorização lidem com problemas, mesmo antes de eles surgirem. Recentemente, os gémeos digitais começaram a passar para novas esferas. Várias outras áreas – como os serviços financeiros, os cuidados médicos e os locais de trabalho – começaram a reconhecer o seu potencial.

Os gémeos digitais estão também a ser reconhecidos com uma ferramenta valiosa para as marcas revelarem soluções relevantes quando as pessoas estão mais receptivas a ofertas baseadas nos seus interesses únicos, estimulando o futuro da lealdade do cliente. E os empregadores estão a recolher dados para melhorar a produtividade e monitorizar pró-activamente os atritos – a implementação de estratégias de dados responsáveis pode ajudar a estimular a confiança dos colaboradores e gerar um crescimento de receitas sustentável. À medida que os gémeos digitais e as realidades sintéticas se juntam, assistimos ao aparecimento da próxima geração, o equivalente pessoal – duplos digitais que combinam dados, contexto e informação externa agregada.

  • O que se segue?

A Accenture acredita que, num futuro próximo, as pessoas comecem a criar e a controlar os seus próprios ecossistemas, dominados por algoritmos que possuem e que servem todos os seus interesses – não os das empresas. A ausência contínua de uma verdadeira portabilidade de dados tem sido culpada por manter monopólios e também por prejudicar colaboradores. Por sua vez, isto perpetuou uma situação em que as pessoas geram dados que trocam por serviços com empresas de redes sociais, motores de busca, retalhistas online, governos e bancos. Os duplos digitais irão reescrever este modelo: ao trabalharem com empresas e oferecerem aos utilizadores as melhores soluções para eles, começarão a tornar-se os guardiões das nossas vidas digitais.

A consideração mais importante para as pessoas será: em quem confio para acolher o meu duplo digital? A consideração mais importante para as organizações será: como podemos conceber certeza e segurança para dar às pessoas a confiança de nos escolherem para as acolherem? Será importante criar também uma experiência pessoal de duplo digital para a tornar empolgante, transparente e integrada. A interface e as interacções devem estar alinhadas com o modelo mental – e devem ser simples e claras.

A FJORD SUGERE…
Reformular a representação das pessoas

  • Pensar
    Quais as categorias de interacções que podem ser ampliadas pelos duplos digitais? As empresas devem criar a estratégia com duplos digitais para três casos de utilização: 1 – Delegar tarefas por nós; 2 – Esconder a presença; 3 – Moldar o comportamento ou futuro.
  • Afirmar
    É necessário certificar que as pessoas – e não as empresas – controlam os seus próprios dados e demonstram que a plataforma é de confiança para ganharem clientes, assim como colaboradores.
  • Fazer
    A Accenture sugere que as empresas assegurem a fiabilidade dos dados, sem depender demasiado dos mesmos – incluindo sempre a “realidade vivida”. Devem evitar cair na armadilha da gamificação, jogando e experimentando, já que estamos perante um cenário novo com propriedades ainda por determinar.

Tendência 7 -Design centrado na vida

As nossas tendências este ano examinam como as organizações estão a trabalhar para definirem novas formas de crescimento além do lucro, e como as pessoas estão a deixar de sentir que os itens que compram e o trabalho que fazem definem aquilo que são. Como parte do mesmo cenário, revelam que o enfoque das pessoas na conveniência, viabilidade e exequibilidade está a passar do “eu” para “nós”. À medida que isto acelera, o design centrado no utilizador será cada vez mais egoísta e a ênfase no design passará para um design para toda a vida.

  • O que está a acontecer?

À medida que vamos testemunhando uma passagem do “eu” para o “nós” no espectro político e social, vemos também uma evolução no design, de uma centralidade no utilizador para uma centralidade no humano e, agora, uma centralidade ainda maior na vida. Estamos a começar a afastar-nos do design para um e começar a aproximar-nos do design para o colectivo – ou seja, para todo o planeta.

A sobreposição perfeita entre a conveniência, a viabilidade e a exequibilidade trata-se de um produto ou de um serviço sustentável e/ou desejável, mas que também seja rentável.

  • O que se segue?

Durante alguns anos, a aplicação de um design apenas centrado nos utilizadores e nos humanos, apoiada por muitos, acabou por separar frequentemente as pessoas dos ecossistemas. Agora, os designers têm de começar a abordar as pessoas como parte de um ecossistema e não como estando no centro de tudo.

O compromisso entre os nossos desejos e a conveniência – entre saúde, alegria e comodidade – terá de ser gerido cuidadosamente. A Accenture acredita que as marcas de sucesso serão cada vez mais as que ajudam as pessoas a lidar com as suas ansiedades éticas sobre o consumo ao oferecerem experiências alternativas.

As marcas que forem incapazes de passar das palavras aos actos, de mostrarem provas do seu propósito e de aumentar as suas métricas ambientais e sociais passarão por dificuldades. Em suma, o design deve agora ir para lá do seu próprio ecossistema.

A FJORD SUGERE…
Reformular o papel do design em 2020

  • Pensar
    Redefinir conveniência, viabilidade e exequibilidade no trabalho. Como é que a oferta de uma empresa se pode tornar regenerativa por design, incluindo itens apagados que desaparecem da vista? Como se pode usar o design como ferramenta central para criar alinhamento à volta da mudança?
  • Afirmar
    As empresas devem definir que consideram os ecossistemas naturais, políticos e sociais como iguais – praticando o “não prejudicar” em todas as áreas, em vez de se limitarem a falar. É necessário que demonstrem que o design centrado na vida é a nova norma, e não apenas mais um projecto.
  • Fazer
    É preciso que as organizações actualizem o conjunto de competências de design com um pensamento de sistemas. A colaboração com outras disciplinas como cientistas, técnicos e futuristas é bem vista, criando activamente em sistemas que encorajam as pessoas a reduzir a sua utilização de recursos.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 170 de Maio de 2020

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