Randstad Insight: Darwin e a Inteligência Artificial

Por Pedro Empis | Executive business director outsourcing da Randstad Portugal

A tão badalada transformação digital continua a dar passos largos no modo de fazer negócios, estando cada vez mais presente nas nossas vidas. A face mais controversa desta evolução passa pela utilização da inteligência artificial (IA), que, quer sejamos cépticos ou entusiastas, rápidos ou mais lentos, conservadores ou progressistas a todos irá impactar, sendo que os seus efeitos visíveis se irão manifestar a um ritmo muito acelerado até ao final desta década.
Como em todas as grandes alterações de paradigma, é importante olhar para trás e interpretar os factos de forma realista, ainda que cautelosa, tendo em conta as diferenças da presente transformação em relação às anteriores. Historicamente é um facto que estas mudanças são geradoras de emprego líquido e a verdade é que, só desde março deste ano, os anúncios que solicitam experiência e conhecimentos baseados em inteligência artificial aumentaram 2000% na Randstad a nível global.
Mas ainda que possamos olhar para este momento de forma otimista, é fundamental ter presente que é necessária uma grande capacidade de adaptação das pessoas e das empresas. Neste domínio há que destacar os resultados do último estudo Randstad Workmonitor, em que a maioria das pessoas (52%) assume que a IA vai impactar a sua indústria ou o seu posto de trabalho, dividindo-se depois em cerca de metade (47%) que se considera entusiasmada com esta perspetiva e um pouco mais de um terço (39%) que se mostra reticente e preocupada com a evolução desta temática.
Muitas pessoas (55%) querem mais formação na forma de interagir com a inteligência artificial, de maneira a estarem preparadas para o futuro, mas, também para o presente, já que 33% dizem já hoje interagir com sistemas que utilizam IA. Mas na realidade, apenas uma pequena minoria (13%) indica já ter recebido formação específica neste domínio, o que deve ser um alerta para as empresas, pois é certo que as que tiverem o talento mais preparado serão certamente as vencedoras desta corrida.
Mas há um outro lado desta questão que muita discussão tem fomentado e assim continuará nos próximos tempos. E a regulação? Irão os Estados chegar a tempo desta vez? A IA vai ganhar autonomia e ultrapassar os seus criadores? Se o mundo em geral se tem ocupado da primeira parte do problema que descrevi inicialmente, os atores da IA estão bem avançados nesta discussão, sendo que um número relevante até já se juntou a propor um congelamento do desenvolvimento até termos regulação a nível mundial. Serão os mais atrasados na corrida a querer ganhar tempo ou estão genuinamente preocupados com o efeito que uma utilização desregulada desta tecnologia pode ter no nosso futuro?
A humanidade tem-se deparado com inúmeros paradigmas e tem vindo a resolver um após outro e estou certo de que não será diferente desta vez. Caberá a cada um estar atento e participar civicamente neste debate e, por outro lado, garantir que se prepara para o futuro. A teoria da evolução das espécies de Charles Darwin parece continuar tão atual como há 160 anos. A seleção natural será a chave e, uma vez mais, não serão os mais fortes a singrar, mas os que mais capacidade de adaptação à mudança demonstrarem, seja enquanto indivíduos, empresas ou sociedade.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 211 de Outubro de 2023