“Queremos ter um frango para cada um”

Por Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

 

Confesso que estou um pouco farto de estatística e epidemiologia. Independentemente de saber da sua utilidade e importância. Mas vem-me sempre á memória a velha anedota estatística da divisão dos frangos: se eu comer dois e tu não comeres nenhum, entre nós ambos comemos um frango. Ou seja está tudo bem.

Portanto não vou falar de estatística mas de jovens, nomeadamente do desemprego jovem. O desemprego não é mais alto do que na anterior crise de 2008, mas é preocupante neste segmento, pois representa 48% do aumento do desemprego (até 34 anos). As medidas apresentadas recentemente pelo governo para alterar a legislação de trabalho apenas pretendem reforçar o controle e inspeção (ou seja os custos de contexto das empresas), a contratação pública (aumentar o emprego público faz lembrar a lógica dos “frangos”), a contratação colectiva e o reforço dos sindicatos, a obrigatoriedade de realizar contratos de trabalho menos flexíveis (num mundo sem rumo, pasme-se…). Em lugar de estimular a criação do emprego, a flexibilização do mesmo, a legislação e estímulo das novas formas de trabalho e das novas profissões, a promoção do “work life balance”. Bem como Estimular o empreendedorismo e auto-emprego, através da inovação.

Apresenta uma ideia peregrina de “Promoção do emprego sustentável e combate à precariedade, em particular nos jovens”, quando os próprios jovens não pretendem vínculos longos e são verdadeiros “globetrotters” globais laborais. O emprego para toda a vida acabou há 2 gerações atrás, mais por vontade dis jovens, do que das empresas. Os contratos não permanentes dos jovens em Portugal representam 62% dos contratos quando na Europa 43%. Esta precariedade tem muito a ver com a falta de flexibilidade da legislação laboral Portuguesa, em minha opinião.

Apresenta também um chavão paradoxal: “Reforçar os serviços públicos da administração do trabalho e a simplificação administrativa”. Simplificar implica digitalizar os serviços públicos, o que vai vai gerar desemprego ou então funcionários públicos que não têm nada para fazer, que no limite terão de ser recolocados. Para serem recolocados, têm de aceitar, saber para onde é que vão ser recolocados e têm de ser treinados para tal. Acho difícil, mas… Ser politicamente de esquerda não significa acabar com os ricos, deveria significar acabar com os pobres. Mas assim vamos conseguir recriar um código que não estimula a criação de emprego (aliás como o actual). Um código que protege os incompetentes (pois um incompetente em Portugal é impossível de ser despedido por questões materiais mas apenas por questões formais); senão vejamos um exemplo prático de um comercial (cujo objectivo primordial é atingir objectivos comerciais) que não vende nada, mas em Portugal é impossível de ser despedido caso tenha contrato sem prazo, desde que cumpra os horários e todas as formalidades (portanto é preferível não contratar ou trabalhar a “recibos verdes”). Um novo código que promove o recurso ao trabalho temporário sob novas formas ou afugenta as empresas de criar emprego com medo da falta de flexibilidade caso este se torne desnecessário (em caso de sazonalidade ou um projecto específico, recorre-se a empresas de trabalho temporário). Um novo código que assegura que os tribunais de trabalho continuem a decidir litígios em prazos impensáveis de mais de 10 anos, com recursos garantisticos das partes nos processos que os arrastam eternamente. Que mantém sem controle as inspeções de trabalho (que são reforçadas nestas propostas como um recurso fundamental), de autoridades que não têm meios, logo não têm prazos para apresentar decisões das inspeções feitas, mas também não têm espírito pedagógico de melhoria do tecido empresarial português composto por PMEs. Finalmente um intrincado de leis mal feitas, que nem mesmo o melhor dos advogados conhece em profundidade, quanto mais o gestor de uma PME que tem de aplicá-las e entretanto, já agora, pagar taxas, impostos, salários e gerar ebitdas positivos.

Em suma, vemos mais “medidas e receitas velhas” num mundo que é novo e não tem nada de “novo normal”, mas de “novo anormal”. Pelo que se exigia pragmatismo ideológico e político, não cedências aos extremismos de alguns partidos, com um governo que até já mostrou coragem para racionalizar decisões que á primeira vista pareceriam negativas mas tiveram resultados surpreendentes. Lembrem-se que “Queremos ter um frango para cada um”!

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