O luto é uma treta

Por Nuno España, Gestor

Por mais que se fale ou se tente descontruir, o luto é uma treta. Por muito que se queira e por muito que se antecipe, ninguém está preparado para o luto. Mesmo quando é evidente e inevitável que vá acontecer e mesmo que se assuma que é o que faz mais sentido e o que tem de ser, quando acontece, acaba sempre por ser muito mais duro e difícil do que alguma vez imaginámos.

O luto vive-se de muitas formas e pelos mais variados motivos. Fazemos luto de pessoas, de coisas e até de quem fomos e deixámos de ser. Quando alguém morre, quando alguém parte das nossas vidas, quando um amor termina ou até quando um determinado bem do qual algures no tempo gostámos muito desaparece das nossas vidas.

Melhor ou pior preparados, mais ou menos precavidos, mais ou menos experientes e maduros, todos passamos por uma fase de negação. Negar faz-nos perder tempo e aumentar a dor exponencialmente. Depois, uma vez vencidos pela exaustão de negar (que também obriga a muita força), aprendemos progressivamente a viver com essa perda, baixar a guarda e deixarmo-nos ir e sentir as coisas. Choramos, ficamos tristes, afundamos. Muitas vezes não sabemos mesmo como vamos sair desta. Mas a verdade é que acabamos por fazê-lo, de uma forma ou outra, uns mais rápido, outros nem tanto. Só assumindo a dura realidade, é que conseguimos avançar e continuar a nossa vida.

Naturalmente, as perdas tornam-se parte de nós. Com elas, também vai uma parte de nós. E de repente mudámos. O que éramos antes também foi. E também temos de fazer luto desta mudança. Com os lutos vamos mudando e até a própria forma de fazer o luto se vai alterando, quase como se fossemos adquirindo defesas.

Acho que já experimentei um pouco do que é o luto. Através da morte do meu Pai ou da Rita, através dos amores que achei que seriam para sempre, depois do meu divórcio ou até quando fiquei sem a minha primeira mota. Sei que sou um poço de emoção, senti que morria em qualquer uma delas. Mais uma vez, a verdade é que as ultrapassei todas e hoje algumas, pela forma como as vivi, fazem-me rir.

Também eu me fui defendendo. Aprendi que celebrar a perda e torná-la parte do nosso quotidiano é uma forma de torná-la mais ligeira e um ganho na nossa vida. Celebrar o amor e aceitar que o perdemos, mesmo que tenhamos ganho muito através dele, prepara-nos para ser mais e melhores, e dá-nos a humildade de fazer mais e melhor da próxima vez. Muitas vezes, é pelo sofrimento que se cresce. Talvez estas perdas me tornem mais humano e com uma noção clara da minha posição no mundo. Para mim, é fantástico que o mundo não pare para sofrermos. E saber que não serei o único a sofrer e relativizar o meu sofrimento, dá-me forças para “seguir com a minha cruz”. A forma como a vivemos determina muito quem somos e queremos ser.

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