Tempo é dinheiro?

Desde 2009 que é CFO da Novabase e assume a sua paixão pelo seu trabalho. Na Novabase os dias são agitados, mas não lhe tiram o foco daquele que é o seu objectivo primordial: assegurar a sustentabilidade da empresa, com mais de 2000 colaboradores. Missão impossível? Nem por isso…

Em que consiste, actualmente, a função de um CFO numa empresa?

O CFO desempenha um papel de mediador, nas organizações, entre os detentores dos activos de origem financeira e a aplicação desses activos, ou seja, a forma como os emprega na organização. Dentro destes dois pilares, ele é fundamental na captação de financiamento das organizações, definindo a forma como estas se financiam em todas as suas diferentes vertentes. Tem ainda um papel importante na análise e decisão dessas origens de financiamento: qual o investimento, qual o retorno, que selecção?

É também alguém que tem de fazer uma pré-selecção, para que depois outro alguém possa voltar a decidir. Todas estas funções já existiam há 30, 40 ou 50 anos e continuam a ser, por definição, o core daquilo que é o papel de um CFO: um papel regulador e central na origem e no emprego dos fundos. Sendo esta definição muito abstracta, há um conjunto de funções agregadas a estes dois pilares e que são mais de 30 ou 40. Há muitas organizações que não terão tantas, mas sobretudo em empresas muito grandes, é isto que acontece. Nestas pode existir um departamento de 50 pessoas que se encarregam, em exclusivo, da gestão da dívida, uma das subfunções do CFO. Mas depende muito da dimensão da empresa.

Um CFO tem, antes de tudo, que ser um bom líder. Concorda?

Sim, creio que sim, mas qualquer função deve pressupor uma boa liderança. Não vejo a liderança como intrínseca, ou seja, não acredito num líder que seja bom em todos os papéis que desempenha. Um bom líder faz a diferença, até porque a própria liderança vai aprendendo as suas capacidades e aperfeiçoando a sua acção, consoante os desenvolvimentos que as circunstâncias apresentam.

Os avanços da tecnologia (Inteligência Artificial, digitalização, robótica) estão a alterar o paradigma daquilo que é hoje um CFO?

Nos dois pilares conceptuais de que falei anteriormente, não. Mas a sua forma e o seu desenvolvimento são brutais. Trabalho no sector financeiro há 30 anos, e tudo é hoje muito diferente do que era quando comecei. A tecnologia mudou muito as organizações. Tem forçado diferentes modos de organizar política e estruturalmente as próprias empresas, e isso afecta toda e qualquer função. Uma mudança decorrente da tecnologia, que abrange toda a sociedade de uma forma geral, gera estruturas diferentes e formas de organização para responder aos problemas que aparecem, proporcionando processos novos e maneiras diferentes de fazer. Quando comecei a trabalhar, a capacidade computacional disponível para um técnico que estivesse à secretária era limitada. Havia empresas que não tinham computador, ou melhor, os computadores estavam entregues a um ou outro director, que não sabiam muito bem como trabalhar com eles. Os próprios computadores não tinham capacidade de processamento ou os aplicativos que têm hoje.

A tecnologia, para além de ter mudado a sociedade e as empresas, trouxe um aumento dos recursos e da produtividade que, por si só, maximizaram a capacidade produtiva. Um departamento financeiro de uma empresa, com alguma dimensão, era muito grande, tinha muita gente. Ainda me lembro que quando era miúdo, ainda havia as dactilógrafas… Filas e filas de secretárias. Quando cheguei à profissão, começou a ouvir-se falar dos ERP (Enterprise Resource Planning) e isso aconteceu devido à capacidade computacional. Ficou mais acessível para as empresas adquirirem, quer a capacidade computacional, quer a parte aplicacional, o que originou um conjunto de soluções que eliminaram dramaticamente um grande número de colaboradores. Houve uma redução da capacidade laboral, sem reduzir a produtividade, muito pelo contrário. Uma pessoa que hoje trabalha numa empresa tem que ter, por norma, o mínimo de valências abrangentes, ao contrário do que antigamente acontecia. Houve um upgrade qualitativo das pessoas, tanto na área financeira como em todas as outras. Hoje, as pessoas mais estanques não têm tanto valor, porque não se consegue retirar o retorno na sua plenitude. Ao contrário do que se possa pensar, esta é uma profissão aliciante.

Houve também um salto tecnológico muito grande…

Sim, houve um aumento na qualidade e na quantidade, mas o salto tecnológico não vai parar. O mundo tornar-se-á mais interessante e melhor porque a tecnologia só tem trazido coisas boas. A vida que um indivíduo hoje consegue ter estava antes exclusivamente destinada às pessoas de classes superiores. Acredito infinitamente na especialidade humana, porque a espécie chegou até aqui e conseguiu resolver problemas muito mais complexos. Não deveríamos temer vir a ser dominados pelas máquinas, pela tecnologia ou robótica.

Como é que é o seu dia-a-dia?

Tenho a rotina comum a todos, que consiste em começar por ver os emails. Tenho prazos de resposta obrigatória, nem que seja para dizer que ainda não tenho resposta. (Risos) Mesmo que não tenha nada previsto para fazer, há sempre pequenos problemas para serem resolvidos, pequenos esclarecimentos. Estou inserido numa organização com uma determinada estratégia. Essa estratégia define um conjunto de objectivos a três ou quatro anos. Esse é o nosso mapa orientador das tarefas e actividades do dia-a-dia. Depois, há todo um conjunto de objectivos que são marcados pelos stakeholders, independentemente da estratégia adoptada. Objectivos legais, reportar contas, amortizar um empréstimo ou financiamentos, aspectos determinados por lei ou contrato e que têm que ser controlados. As equipas têm que estar orientadas para cumprirem os seus objectivos. Há ainda os pedidos dos clientes, dos colegas… Muita coisa passa pela área financeira. Mesmo que a decisão não esteja no departamento financeiro, é provável que passe por ele. A nós cabe-nos cumprir todos os objectivos: os nossos, os dos nossos colegas, os dos stakeholders, os da organização… O meu dia-a-dia depende muito da altura do ano, das circunstâncias face a estes equilíbrios permanentes da organização. Tenho um princípio base e inabalável: evito deixar alguém à minha espera.

Não gosta de perder tempo?

Não, e sobretudo de fazer perder tempo à minha equipa. Sou responsável pela produtividade de toda e qualquer pessoa numa equipa de cerca de 20 pessoas. O chefe é responsável por cada minuto que uma pessoa esteja parada à espera da sua decisão. Pessoas capazes que estão paradas à espera de uma decisão minha? Causa-me muito stress, é um desperdício brutal.

Estratégia ou gestão: de que forma é que desenvolve a sua actividade na Novabase?

Passa pela gestão com maior frequência, acho. As pessoas recorrem muito à área financeira, e não penso que seja por ser um árbitro, mas a verdade é que está permanentemente a ser solicitada. Quando não há consenso, há normalmente o recurso à área financeira, que é muito absorvida pelos temas de gestão no dia-a-dia. A estratégia não está tão presente no nosso departamento, até porque os temas estratégicos são menos intensos.

Quais são os seus maiores desafios?

O meu desafio permanente é ter um nível muito elevado de produtividade das minhas equipas. É garantir que sejam úteis e que tenham uma grande capacidade de produção, ao nível das expectativas, ou até superior. Este é um objectivo mais egoísta, se quisermos.

Outro desafio é evitar o desperdício… Sei que é impossível evitá-lo completamente, mas a minha regra é: desperdício mínimo. No que diz respeito à organização, gostaria que ela conseguisse impor, através de um conjunto de processos, políticas e procedimentos, alguns princípios de sustentabilidade financeira saudável, e de forma duradoura. Somos muito mais do que uma empresa de 2000 colaboradores: somos também 2000 famílias, centenas de clientes… Isto mexe com muitos aspectos, desde recrutar bem as pessoas, formá-las adequadamente, vender bons projectos e arranjar clientes, mantendo os bons e descartando os maus.

No nosso sector, o valor humano faz parte da estratégia e é dele que depende este ciclo virtuoso. Apesar das crises que vamos tendo, temos conseguido fazê-lo. Este é um sector cíclico e as crises económicas influenciam-no directamente, mas temos sabido navegar nestes mares. Este sentimento de sustentabilidade não é apenas do CFO, mas sim de toda a estrutura. Tentamos sair das crises ainda mais fortes.

Considera a sua profissão arriscada?

Não mais do que as outras. Acho que é uma profissão com alguma exposição porque mexe com meios financeiros. Quando algo corre mal, facilmente é notícia de jornal… O que sinto é que esta profissão tem uma componente técnica mais exigente, quando comparada a outras áreas com funções mais políticas. Nota-se facilmente se a pessoa está ou não preparada para desempenhar este tipo de funções.

Quais são as prioridades para o ano de 2020?

Fazer cumprir o plano estratégico que está comunicado e que será levado a cabo até 2023. Tirando os temas de gestão, de equipas, etc., quero assegurar que é feito e alterado tudo aquilo que é suposto.

Quais são as maiores preocupações para o próximo ano?

Fala-se muito em crise, que ela está perto… Já se falava dela o ano passado e há dois anos também…

Sou um grande fã de História e nas pequenas situações tendo a ser mais pessimista, um pouco conservador. Sei que vai haver uma crise nos próximos dez anos, mas não garanto que seja em 2020. Não trabalho com medo da crise, porque há um conjunto de situações que têm que ser bem feitas para acautelar o inevitável. Tendo a não me apavorar, apesar de ser pessimista. Creio que podemos sobreviver a tudo, desde que se esteja consciente e preparado.

 

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