Cientistas descobrem mais de 1.700 espécies de vírus nos Himalaias: cerca de mil são totalmente desconhecidos pela ciência
Escondidos no gelo glacial dos Himalaias, mais de 1.700 espécies antigas de vírus foram descobertas por investigadores: estes vírus, cerca de três quartos dos quais eram totalmente desconhecidos pela ciência, foram encontrados graças a fragmentos de ADN viral congelados em núcleos de gelo retirados do glaciar Guliya, no Planalto Tibetano, segundo apontou um estudo publicado na revista científica ‘Nature Geoscience’. A intenção dos cientistas é agora analisar o ADN destes vírus antigos para melhor entender como estes se adaptam às mudanças climáticas.
“Antes deste trabalho, como os vírus se ligavam a mudanças em larga escala no clima da Terra permanecia amplamente inexplorado”, destacou o coautor do estudo ZhiPing Zhong, investigador associado do Byrd Polar and Climate Research Center na Ohio State University (Estados Unidos), citado pela revista ‘Newsweek’. “O gelo glacial é tão precioso, e frequentemente não temos as grandes quantidades de material necessárias para a pesquisa de vírus e micróbios.”
O artigo refere que os vírus vieram “de nove horizontes temporais, abrangendo três ciclos de frio nos últimos 41 mil anos”, indicaram os especialistas – o glaciar Guliya, onde foram recolhidas as amostras, situa-se nos Himalaias, no noroeste do Tibete, a quase 6,5 quilómetros acima do nível do mar.
Têm sido descobertos vírus antigos congelados no permafrost descobertos em outros locais do mundo, incluindo a Sibéria, o que tem levantado receios de que um desses vírus possa vir a infetar humanos, isto conforme o permafrost e os glaciares mundiais vêm derretendo devido às mudanças climáticas.
“Se os vírus da ameba podem sobreviver tanto tempo no permafrost, isso sugere fortemente que aqueles que infetam animais/humanos podem permanecer infecciosos na mesma condição”, referiu Jean-Michel Claverie, professor da Universidade de Aix-Marseille, em França, que liderou o estudo. “Além disso, sabemos que o ADN dos vírus que infetam animais/humanos é detetado no permafrost.” Felizmente, esses vírus antigos provavelmente infetaram bactérias em vez de animais ou humanos.
Segundo o artigo, a descoberta revela detalhes importantes de como esses vírus antigos se adaptaram e evoluíram com mudanças significativas no clima. Uma das comunidades virais que eles encontraram nos núcleos de gelo datava de há cerca de 11.500 anos, quando o clima mudou do frio do Último Estágio Glacial para a época mais quente do Holoceno – a que vivemos atualmente. “Isso pelo menos indica a conexão potencial entre vírus e mudanças climáticas”, disse Zhong.
Os investigadores destacaram igualmente que cerca de um quarto dos vírus no núcleo de gelo se sobrepunham a espécies encontradas em outros lugares. “O que significa que alguns deles foram potencialmente transportados de áreas como o Médio Oriente ou mesmo o Ártico”, indicou o especialista.
Ao compreender como os vírus antigos evoluíram em resposta às mudanças climáticas, os cientistas esperam prever melhor como os atuais vírus reagirão aos efeitos invasores das mudanças climáticas nos próximos anos. “Para mim, essa ciência é uma nova ferramenta que pode responder a questões climáticas básicas que não poderíamos ter respondido de outra forma”, indicou o coautor do estudo Lonnie Thompson, professor de ciências da Terra na Universidade Estadual de Ohio.
Pesquisar a vida congelada em núcleos de gelo glacial não será possível para sempre pelo mesmo motivo: a taxa de derretimento glacial aumentou significativamente ao longo do último século, com alguns glaciares em regiões como os Himalaias, os Alpes e os Andes a sofrerem perdas substanciais – nos Himalaias derreteram 65% mais rápido entre 2010 e 2019 do que entre 2001 e 2010. Portanto, é uma corrida contra o tempo para os cientistas. “Estou otimista sobre o que pode ser feito aqui, porque se trabalharmos juntos, essas técnicas têm muito potencial para nos ajudar a começar a abordar uma grande variedade de questões científicas”, concluiu Thompson.