Investimento estrangeiro: bênção ou dependência perigosa?

Opinião de Alfredo Valente, CEO da iad Portugal

Executive Digest
Setembro 10, 2025
10:56

Por Alfredo Valente, CEO da iad Portugal

Portugal continua a ser um destino atrativo para investidores internacionais, beneficiando de uma localização estratégica, qualidade de vida reconhecida e setores económicos em crescimento. Em 2025, a aposta estrangeira mantém-se forte nos segmentos do retalho, hotelaria e logística, contribuindo para a modernização de infraestruturas, criação de emprego e dinamização económica. No entanto, o equilíbrio desta equação é delicado: é necessário garantir que o capital que chega de fora não agrava o já difícil acesso da classe média à habitação, e que, paralelamente, se criam condições para fortalecer a competitividade dos investidores nacionais.

O mercado residencial, este ano, mostra sinais de mudança. Os dados do INE revelam que, no primeiro trimestre, apenas 5,1% das casas foram adquiridas por cidadãos estrangeiros, o valor mais baixo desde 2021. Na iad, essa tendência confirma-se: se no primeiro semestre de 2024 os compradores internacionais representavam 23% das transações, em igual período de 2025 esse número desceu para 15%. Estes dados indicam que, ao contrário da perceção comum, a pressão sobre os preços das casas não se deve apenas ao investimento estrangeiro, mas também a fatores internos, incluindo a escassez de oferta e as dificuldades de financiamento.

Contudo, é essencial não negligenciar os riscos de uma dependência excessiva de fluxos financeiros externos. Em zonas mais pressionadas pela procura, nomeadamente por parte de compradores estrangeiros, programas como Golden Visa ou a entrada de grandes fundos internacionais têm demonstrado como a injeção de capital pode inflacionar os preços, tornando a habitação inacessível para muitas famílias portuguesas. O desafio está em garantir que o investimento estrangeiro não se traduz apenas em ganhos para quem entra e sai do mercado, mas também em benefícios duradouros para quem vive e trabalha em Portugal.

Há também uma questão territorial importante. Embora grande parte do investimento estrangeiro se concentre em Lisboa, Porto e Algarve, há regiões menos desenvolvidas onde este capital poderia ter um impacto transformador, gerando oportunidades de crescimento e fixação populacional. Canalizar parte destes recursos para o interior e para regiões menos desenvolvidas poderia revitalizar economias locais, atrair talento, fixar população e reduzir as assimetrias regionais. Esta descentralização de investimento seria uma oportunidade para alinhar interesses privados com objetivos estratégicos de coesão territorial.

O futuro exige políticas públicas inteligentes e equilibradas. É crucial continuar a captar capital externo, um motor indispensável de crescimento, mas canalizá-lo para projetos que criem valor no país e para o país. Isso passa por incentivar a reabilitação urbana com função habitacional, desenvolver projetos mistos que incluam habitação acessível e criar condições para que investidores nacionais possam competir em igualdade de circunstâncias. Uma economia sustentável não pode viver apenas de capital estrangeiro, precisa de reforçar a sua própria base de investimento.

O desafio não é fechar a porta ao investimento estrangeiro, mas sim garantir que ele produz um impacto positivo e duradouro. É preciso garantir que este capital, para além de gerar lucros para quem o aplica, cria também negócios locais, emprego qualificado e oportunidades de habitação acessível para os cidadãos que vivem em Portugal. Só assim o investimento estrangeiro deixará de ser visto como uma possível dependência perigosa e passará a ser uma verdadeira bênção para Portugal.

 

 

 

 

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