Este país europeu está a preparar-se para criar um novo microestado muçulmano (à semelhança do Vaticano)

O Governo da Albânia anunciou um ambicioso plano para estabelecer um microestado liderado pela Ordem Bektashi, uma confraria muçulmana sufi, que se tornará o menor país do mundo, superando até o tamanho da Cidade do Vaticano. O anúncio foi feito pelo Primeiro-Ministro albanês, Edi Rama, que destacou que o novo estado será um símbolo de moderação, tolerância e coexistência pacífica.

O plano, denominado “Estado Soberano da Ordem Bektashi”, prevê a criação de um território de apenas 10 hectares dentro da capital, Tirana, tornando-se quatro vezes menor que o Vaticano, o atual menor estado do mundo. Este novo microestado terá a sua própria administração, passaportes e fronteiras, marcando um passo histórico para a Ordem Bektashi e para a Albânia.

“O objetivo é promover uma versão do Islão que seja tolerante e inclusiva, algo de que a Albânia se orgulha há muito tempo”, afirmou Rama, sublinhando a tradição do país em valorizar a harmonia e a coexistência entre diferentes religiões. Com esta iniciativa, o governo albanês pretende projetar ao mundo uma imagem de um Islão aberto e moderado.

O futuro microestado Bektashi será uma entidade onde a liberdade individual será um pilar fundamental. Serão permitidos o consumo de álcool, a escolha de vestuário e a liberdade de seguir qualquer estilo de vida, refletindo os princípios de tolerância e flexibilidade que caracterizam a Ordem Bektashi. “Queremos criar um lugar que exemplifique os valores de liberdade, respeito e tolerância que a nossa ordem sempre defendeu”, explicou Rama.

A Albânia, com uma população de cerca de 2,8 milhões de habitantes, é conhecida pela sua tradição de tolerância religiosa, num contexto de uma região dos Balcãs muitas vezes marcada por divisões e conflitos religiosos. Na mais recente declaração na Assembleia Geral das Nações Unidas, o Primeiro-Ministro Edi Rama destacou que o seu país tem uma história de hospitalidade e proteção de minorias, como o acolhimento de refugiados judeus durante a Segunda Guerra Mundial e de afegãos após a tomada de poder pelo Talibã em 2021.

Rama também relembrou o contributo da Albânia para o mundo, ao destacar a figura de Madre Teresa, a famosa missionária católica nascida em território albanês, que foi um exemplo de amor e humanidade em todo o mundo.

De acordo com os últimos censos, a comunidade Bektashi representa cerca de 10% dos muçulmanos na Albânia, um país que tem uma maioria muçulmana. Apesar de não serem a maioria, a influência Bektashi é significativa, e a sua mensagem de moderação tem sido amplamente reconhecida.

A Ordem Bektashi é uma derivação do sufismo, a vertente mística do Islão, que se distingue pela sua abordagem mais liberal e inclusiva dos ensinamentos islâmicos. Fundada na região de Anatólia, na Turquia, a ordem ganhou proeminência como uma das principais confrarias muçulmanas, chegando a ser a ordem oficial das forças de elite otomanas, os Janízaros.

No entanto, ao longo dos séculos, a Ordem Bektashi enfrentou perseguições e restrições devido ao seu papel político e religioso. Foi banida pela primeira vez no século XVII pelo sultão otomano Mahmud II e, mais tarde, em 1925, pelo fundador da República da Turquia, Mustafa Kemal Atatürk, quando o governo turco fechou todos os lodges Bektashi e outras ordens religiosas que não eram reconhecidas pelo Departamento de Assuntos Religiosos.

Desde então, a comunidade Bektashi manteve-se principalmente na Albânia, no Kosovo e na Macedónia do Norte. A sua presença nestes países assegurou a continuidade da prática dos seus rituais e a promoção dos seus princípios de tolerância e respeito.

O líder espiritual da Ordem Bektashi, Dervixe Baba Mondi, será o guia do novo estado soberano. Em declarações recentes, Mondi reforçou que as decisões no novo microestado serão tomadas com base em “amor e bondade”. Numa entrevista concedida em 2018, Mondi explicou que ser Bektashi é, acima de tudo, ser humano. “Construímos a nossa comunidade com base nos princípios da paz, amor e respeito mútuo”, afirmou, evidenciando a filosofia inclusiva da Ordem.

O plano de criação do novo estado está a ser trabalhado por uma equipa de especialistas jurídicos, que se encontra a desenvolver a legislação necessária para definir o estatuto de soberania dentro da Albânia. A proposta deverá também ser submetida à aprovação do Partido Socialista, liderado por Edi Rama, que detém a maioria no Parlamento.

Baba Mondi manifestou a esperança de que o novo estado Bektashi venha a ser reconhecido pelos Estados Unidos e outras potências ocidentais. “Merecemos um estado”, declarou recentemente numa entrevista ao “The New York Times”. “Somos os únicos no mundo que contam a verdade sobre o Islão e que não misturam a religião com a política”, acrescentou Mondi.

Estima-se que existam entre 7 a 20 milhões de seguidores da Ordem Bektashi em todo o mundo, sendo a maioria concentrada na Turquia, com cerca de 12,5 milhões de adeptos.

A criação do “Estado Soberano da Ordem Bektashi” representa um passo significativo na promoção de uma mensagem de tolerância e coexistência inter-religiosa. Para a Albânia, trata-se de uma afirmação do seu papel como nação pioneira na defesa da liberdade religiosa e do diálogo intercultural.

Ao transformar a ordem Bektashi num estado soberano, a Albânia pretende enviar um sinal claro ao mundo de que é possível promover um Islão moderado, inclusivo e aberto, que não só respeita a diversidade, mas também a celebra.