O que esperar de 2024?: Marcelo Nico, Diretor-Geral da Tabaqueira

Testemunho de Marcelo Nico, Director-Geral da Tabaqueira

As empresas e as famílias portuguesas voltaram a mostrar, no último ano, a fibra de que são feitas: diante de um cenário macroeconómico marcado pelo encarecimento do financiamento e pela perda do poder de compra, resistiram. As empresas continuaram a investir e a crescer, defenderam o emprego e a criação de riqueza; as famílias, apesar do golpe nos rendimentos infligidos pela elevada inflação e por taxas de juro altamente penalizadoras, mantiveram-se firmes. Fortemente exportadora, a economia portuguesa conseguiu até fazer frente à desaceleração económica de países dos quais é bastante dependente, mais uma vez dando nota da resiliência que a caracteriza – amplamente testada e exercitada no período pandémico. A inflação, entretanto, desacelerou mais rapidamente do que o expectável, levando a crer numa inversão nas taxas de juro mais próxima do que a inicialmente prevista até pelo próprio Banco Central Europeu, e os agentes económicos nacionais pareciam entrar na recta final de 2023 mais certos do que os esperaria em 2024 – ainda que o mundo e a intensificação de conflitos, nos últimos anos, teimem em impor à força uma volatilidade geopolítica e uma desesperança na humanidade que deixa pouco espaço para grandes optimismos.

No entanto, chegamos a 2024 menos optimistas do que aquilo que o cenário macroeconómico faria adivinhar. Num novo ano que arranca com um primeiro trimestre marcado por eleições legislativas antecipadas, é preciso, antes de mais, garantir compromissos firmes e a construção de caminhos orientadores que tenham, verdadeiramente na sua base, uma visão estratégica de longo prazo. Entre empresas, é recorrente sublinhar-se a importância da garantia de um quadro regulamentar e fiscal estável, mas esse desígnio é mais relevante do que nunca, quando se antecipam cenários de maior volatilidade política e governativa. Assegurar a estabilidade tão necessária à atracção de investimento será fundamental para garantir a vitalidade do tecido económico, a manutenção do emprego e a dinâmica das exportações nacionais, numa lógica de criação de valor.

Como economia, pelas suas próprias limitações de mercado, Portugal tem o desígnio de subir na cadeia de valor, acrescentado mais ao que produz. Isso faz-se pela inovação, pela atracção de conhecimento e de talento. O que só será possível alcançar em condições que garantam aos investidores a estabilidade necessária para o florescimento dos seus investimentos.

Por isso, mais do que nunca, em 2024, perante um quadro geopolítico instável, Portugal tem de mostrar que é um porto seguro para as empresas, para os investidores e para as famílias. Que sabe escolher caminhos e manter um rumo, mesmo quando a turbulência à volta é grande.

Para a Tabaqueira, que integra um grande grupo multinacional, a Philip Morris Internacional (PMI), que já investiu mais de 400 milhões de euros no mercado nacional, a garantia de um horizonte concreto e fiável é de extrema importância para a manutenção da sua relevância no seio do grupo. Desde 2018, duplicámos o número de trabalhadores (somos, hoje, mais de 1500) e atraímos para Portugal a localização de alguns centros de excelência da PMI que prestam serviços para todo o mundo – e que somam exportações no valor de mais de 40 milhões de euros de serviços de elevado valor acrescentado aos 740 milhões de euros que já exportamos em bens para cerca de 30 mercados externos.

Nesse sentido, em 2024, a Tabaqueira continuará a trabalhar de forma empenhada para garantir que consegue manter o ritmo de atracção de investimento – cerca de 16 milhões de euros anuais, em média – e, dessa forma, concretizar a tão esperada transformação de um sector industrial que é dos mais importantes para a actividade da indústria portuguesa. De acordo com um estudo recente, elaborado pelo ISCTE Executive Education, a pedido da Tabaqueira, a indústria de tabaco em Portugal – composta apenas por três grupos empresariais e com quatro fábricas distribuídas pelo continente e pelas regiões autónomas dos Açores e da Madeira – impacta um universo de cerca de 44 mil pessoas e representa 15% das vendas destes produtos em toda a União Europeia. Prosseguir no caminho de transformação, que passe pela progressiva eliminação dos cigarros e pela sua substituição por melhores alternativas, substanciadas em evidência científica, sem combustão, implica um compromisso de longo prazo, que proteja o investimento de flutuações e mudanças de estratégia abruptas.

Construir futuro, crescer, criar valor são prioridades que implicam foco e união – de visões e de estratégias. Na espuma dos dias é fácil perder a orientação e desprimorar os compromissos. Que em 2024 os decisores políticos e empresariais tenham a capacidade de ver para além de si próprios e de garantir as condições para um melhor amanhã.

Testemunho publicado na revista Executive Digest nº 214 de Janeiro de 2024

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