O que mudou com a nova legislação

Com os bancos cada vez mais rigorosos na concessão de empréstimos bancários e o acesso ao mercado de capitais limitado, o papel comercial ganha peso, como forma alternativa de financiamento de tesouraria das empresas

A emissão de papel comercial como alternativa ao crédito bancário ganhou um novo impulso, no ano passado, com as alterações à legislação, que vieram democratizar o acesso das PME a esta forma de financiamento.

Existem vários tipos de programas de emissão. Aqueles em que a subscrição do papel comercial é assegurada por uma instituição de crédito, a uma determinada taxa de juro, até àqueles em que o papel comercial se destina exclusivamente a ser colocado no mercado junto de categorias específicas de investidores, passando ainda pelos programas de emissões ao longo de um período pré-fixado de tempo, que podem contemplar qualquer um destes tipos de subscrição. Nestes casos, os montantes das várias emissões do programa vão sendo ajustados às necessidades específicas de tesouraria de cada empresa.

Isenções fiscais

Face a outras formas de financiamento de curto prazo, o papel comercial tem algumas vantagens, com a isenção do imposto de selo, que deveria recair sobre o montante e os juros das emissões. Para os subscritores, a legislação prevê ainda que, uma vez preenchidos determinados requisitos, os rendimentos (juros e mais-valias) obtidos por não residentes em Portugal fiquem isentos de retenção na fonte em sede de IRS/IRC.

Tratando-se de um valor mobiliário de curto prazo, o papel comercial tem ainda a vantagem de ser facilmente transmissível, pode até ser cotado no mercado, o que facilita a captação de investidores. Além disso, as emissões de papel comercial têm uma base alargada de potenciais investidores, dos bancos e fundos de investimentos, às seguradoras e gestoras de activos.

Fim do limite máximo

Entre as alterações introduzidas no ano passado na legislação destaca-se a eliminação do limite legal máximo para o montante de emissão, que até ao ano passado estava fixado no triplo do valor dos capitais próprios do emitente.

Não obstante, e para os casos em que o valor nominal do papel comercial seja inferior a 50 mil euros, é obrigatória uma notação de risco da emissão ou da entidade emitente, atribuída por sociedade de notação de risco registada na CMVM, ou a concessão de uma garantia autónoma a favor dos detentores dos títulos/investidores, garantia esta que assegure o cumprimento das obrigações de pagamento.

Caso o valor nominal do papel comercial seja igual ou superior a 50 mil euros, ou caso o papel comercial seja integralmente subscrito por investidores qualificados, os requisitos referidos podem ser dispensados.

O capital próprio ou o património líquido evidenciado no último balanço do emitente deve ser superior ou igual a 5 milhões de euros (ou o seu contravalor em euros caso seja expresso noutra moeda). Montante mínimo por programa é de 500 mil euros, distribuídos pelas várias emissões.

O reembolso do financiamento pode ser global, pela totalidade no final do prazo, ou parcial, repartido por séries com pagamentos periódicos.

Patrocinador serve de garantia

Outra das inovações introduzidas pela nova lei é a figura do patrocinador, que pode ser uma instituição de crédito, ou uma empresa que já tenha valores mobiliários admitidos à negociação no mercado e que tenha uma participação dominante na entidade emitente. Este patrocinador assume especial relevância nas ofertas particulares de papel comercial por empresas sem certificação legal ou auditoria às suas contas, servindo como uma espécie de avalista da operação. Nestes casos é sempre obrigatória a intervenção de um intermediário financeiro ou de um patrocinador.

Sendo uma solução de financiamento com prazos de 7 a 364 dias, o papel comercial dá grande flexibilidade à gestão de tesouraria das empresas, ajustando-a às reais necessidades de fundo de maneio. Além disso, dá a possibilidade de resgate antecipado, se a emitente tiver essa disponibilidade, diminuindo os encargos com juros.

Os programas de emissões podem ter prazos a partir de um ano e até um máximo de cinco anos, automaticamente prorrogáveis por iguais períodos, salvo denúncia de qualquer das partes com a antecedência de 30 dias sobre o termo de cada período anual em curso.

Soluções de financiamento a curto prazo

Além da emissão de papel comercial, as empresas dispõem de outras formas de financiamento a curto prazo para gerirem as suas necessidades de tesouraria

Descoberto
Atribuição de um limite de descoberto na conta à ordem da empresa, que lhe permite manter um saldo devedor até um montante definido e por prazo determinado, por forma a fazer face a eventuais necessidades de tesouraria. Uma espécie de conta-ordenado de empresas.

Conta Corrente
A Conta Corrente é uma linha de crédito bancário por um prazo determinado, que pode ser livremente movimentada dentro dos montantes fixados, de acordo com as necessidades de tesouraria da empresa. Tratando-se de uma conta corrente, não um plano de amortização pré-determinado. As movimentações ocorrem a débito, aquando da utilização do limite disponível, e a crédito, quando o respectivo limite utilizado é amortizado.

Desconto Comercial
O Desconto Comercial consiste num adiantamento efectuado pelo banco ao portador de um título de crédito, antes da data do seu vencimento e igual ao valor nominal deduzido de juros e encargos.

Livrança
A Livrança é um título através do qual a empresa subscritora reconhece uma dívida para com o banco, comprometendo-se a pagar o montante indicado na Livrança, na data de vencimento.

Antecipação do IVA
Alguns bancos oferecem uma “Conta IVA ”, que permite às empresas antecipar os recebimentos do IVA, através de um crédito de curto prazo até 120 dias.

Hot Money
As Hot Money são operações de crédito de montante elevado e de muito curto prazo – normalmente menos de 30 dias – e constituem um instrumento à disposição das empresas para satisfazer necessidades pontuais de tesouraria a preços de mercado.

Artigo publicado na edição n.º 2 da RISCO de Agosto/Setembro/Outubro de 2016.