Repensar a ambição

Surgiu um novo ABC do talento e os empregadores devem adoptá-lo se querem atrair e reter os seus melhores talentos. É esta a principal conclusão do nosso relatório Workmonitor 2024, numa altura em que a série entra na sua terceira década.

A significa “ambição”. As pessoas querem progredir nas suas carreiras. No entanto, a ambição já não é vista no seu sentido tradicional de progressão na carreira. O talento repensou o significado de ambição, colocando o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, a flexibilidade, a equidade e as competências no centro das decisões de carreira.

B significa “equilíbrio” (“balance” no seu original). O talento valoriza tanto o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal como a remuneração. Existe um forte desejo contínuo de f lexibilidade, tanto em termos de “onde” como de “quando” as pessoas trabalham. Este impulso para um maior equilíbrio pode também ter impacto na vontade de progressão dos trabalhadores, com alguns a afirmarem que o seu nível de ambição é directamente afectado pelo que se passa na sua vida pessoal.

C significa “ligação” (“connection” no seu original). Com as clivagens geracionais e geográficas – bem como as circunstâncias pessoais – a afectarem as necessidades dos seus trabalhadores, os empregadores devem reavivar as ligações com os colegas para melhor compreenderem como os diferentes percursos de carreira e modelos de trabalho se adequam aos indivíduos. Ao fazê-lo, os empregadores poderão afastar- -se de estratégias de talento abrangentes e personalizar as suas abordagens.

PRINCIPAIS DESCOBERTAS

A ambição já não é vista no seu sentido tradicional de progressão na carreira. Os trabalhadores repensaram o que querem, colocando o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, a flexibilidade, a equidade e as competências no centro das decisões de carreira.

A pesquisa sugere que as organizações terão de reconsiderar as ambições dos talentos, desenvolver uma noção mais matizada do equilíbrio e criar ligações fortes com a sua força de trabalho, uma vez que os talentos procuram criar uma verdadeira parceria com os empregadores.

1. AMBIÇÃO & MOTIVAÇÃO A ambição é muito mais do que subir na carreira, e a motivação para o desenvolvimento profissional não é guiado apenas para obter uma promoção.

O work-life balance tem agora uma importância tão grande quanto o salário na lista das prioridades dos profissionais (93%).

Mais de um terço indica que a progressão de carreira não é uma prioridade porque se sente feliz na sua função (39%), mas isso não os impede de querer desenvolver as suas competências para o futuro (72%).

PRINCIPAIS LIÇÕES

1. O desejo de crescimento é forte. Mais de metade dos inquiridos (56%) são ambiciosos em relação à sua carreira, apesar da incerteza económica. Vários factores influenciam como esta ambição se expressa, mas um número considerável de trabalhadores dá prioridade à progressão na carreira. Quer isto signifique ameaçar deixar uma função que não oferece oportunidades ou não aceitar uma função que oferece perspectivas limitadas, os trabalhadores não querem ficar presos.

Apesar dos desafios económicos, os empregadores devem garantir que envolvem os seus talentos na concretização das suas ambições.

2. A ambição assume muitas formas. Os nossos dados mostram que, embora os níveis de ambição sejam elevados, isto significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Enquanto alguns consideram que o seu objectivo é ocupar uma posição de liderança, outros procuram adquirir conhecimentos especializados relacionados com a sua função. Muitos também desejam actualizar as suas competências para satisfazer as exigências do local de trabalho de amanhã.

Os empregadores têm de encarar a progressão para além da tradicional ascensão profissional, tendo em conta as ambições pessoais de cada indivíduo. Devem também compreender que a progressão na carreira e a manutenção de uma vida pessoal saudável estão interligadas e precisam de ser equilibradas.

3. A ligação é fundamental. Talvez a conclusão mais importante seja o facto de não existir uma solução única para todos no que respeita à ambição e à motivação. Os empregadores devem criar linhas claras de comunicação com os colegas para compreenderem o que é a progressão para eles e quais as motivações que necessitam.

As pessoas querem clareza – sobre as oportunidades de formação e desenvolvimento disponíveis, as opções de carreira que têm com um empregador, e o equilíbrio entre a vida profissional e privada que podem alcançar nas suas funções. Para que isto seja claro, as organizações devem dar feedback frequente, permitir que o pessoal concretize as suas ambições e reconhecer os seus contributos. Deste modo, assegurar-se-á uma força de trabalho saudável, ligada e produtiva.

2. FLEXIBILIDADE

Os trabalhadores continuam a procurar e a exigir flexibilidade para conciliar prioridades.

A importância do work-life balance também se reflecte no foco contínuo no trabalho f lexível, ainda que muitos empregadores defendam já o regresso ao escritório. Poder trabalhar a partir de casa não é negociável para quase quatro em 10 trabalhadores.

Mas quando se trata de dar o próximo passo na carreira, a flexibilidade está um pouco acima do desejo de trabalhar a partir de casa (41% vs. 37%).

PRINCIPAIS LIÇÕES

1. A flexibilidade continua a ser uma prioridade. Muitas pessoas adaptaram as suas vidas ao trabalho remoto e flexível e esperam que o trabalho a partir de casa e as disposições híbridas se mantenham. Agora que os empregadores estão a pedir aos colaboradores que passem mais tempo no escritório, por uma série de razões, os líderes empresariais devem encontrar um equilíbrio viável para manter a retenção da força de trabalho e satisfazer as suas necessidades estratégicas.

Os empregadores com visão de futuro devem proporcionar fóruns onde as políticas sejam discutidas entre os trabalhadores, bem como oferecer transparência sobre quaisquer alterações à flexibilidade que oferecem.

2. Horário e localização. O tempo de trabalho flexível é frequentemente associado ao trabalho a partir de casa. No utientanto, o inquérito Workmonitor mostra que, em muitos casos, o tempo de trabalho flexível é mais valorizado do que um local de trabalho flexível. Esta conclusão pode ser fundamental para os empregadores que pretendem ter mais pessoal no escritório sem comprometerem a flexibilidade a que os trabalhadores estão actualmente habituados.

As organizações devem considerar a possibilidade de dar aos colaboradores um maior controlo sobre o seu tempo de trabalho para reduzirem potenciais tensões sobre a localização. Isto pode ser feito com a definição de objectivos de projecto em vez da tradicional gestão baseada na presença. Permitir que as pessoas saiam quando tiverem cumprido os objectivos do dia, em vez de as obrigar a ficar durante um determinado tempo, pode trazer grandes dividendos neste caso.

3. Ligue-se à sua equipa. Embora a procura de flexibilidade seja uma tendência global, existem diferenças geográficas e geracionais distintas. À medida que as equipas continuam a tornar-se mais globalizadas, os gestores precisam de estabelecer ligações com os membros da equipa em diferentes mercados, descobrir o que valorizam e utilizar este conhecimento para criar locais de trabalho globais equitativos.

Oferecer abordagens mais criativas e flexíveis relativamente ao horário e ao local de trabalho pode abrir a porta a mais talentos e aumentar a retenção dos mesmos, ao passo que as abordagens restritivas têm mais probabilidades de a fechar.

3. EQUIDADE & DIVERSIDADE

Os talentos procuram parcerias com empresas que tenham ideias semelhantes às suas e nas quais possam contribuir para melhorar a equidade no local de trabalho.

Os trabalhadores favorecem os empregadores cujas opiniões, valores e visões do mundo reflectem as suas próprias, e com quem possam trabalhar para melhorar a equidade no local de trabalho.

Mais de um terço afirma que não aceitaria um emprego numa empresa em que não concordasse com a visão da liderança da organização.

PRINCIPAIS LIÇÕES

1. O talento de todas as gerações quer pertencer. Os trabalhadores querem identificar-se com a organização para a qual trabalham. Embora se tenha registado um ligeiro declínio nos números, a necessidade de um local de trabalho equitativo e de empregadores que se preocupem com eles e com o que valorizam continua a ser forte. Compreender as motivações e necessidades das diferentes gerações e grupos será fundamental para a atracção e retenção de talentos.

Ao criarem espaços de conversação, os empregadores podem alinhar-se melhor com as equipas multigeracionais e multinacionais. A criação de grupos de recursos empresariais é também uma forma eficaz de fomentar um sentimento de pertença.

2. Trazer o seu “eu” completo para o trabalho é um desejo fundamental. Um terço dos trabalhadores não se sente capaz de se sentir plenamente no trabalho e um quinto afirma ter personalidades diferentes no trabalho e na vida privada. Parte desta situação pode dever-se ao facto de não poderem partilhar os seus pontos de vista por receio de recriminação. Para os empregadores, estas tendências sublinham um desequilíbrio na cultura empresarial que têm de resolver de forma proactiva.

E embora os talentos sejam mais cautelosos sobre mudar de emprego durante este período de incerteza, os nossos relatórios anteriores do Workmonitor mostraram que estão mais aptos a fazê- -lo quando a economia melhora. Os empregadores devem ter uma visão a longo prazo se querem conseguir aumentar a retenção.

3. Os talentos querem ligar-se aos empregadores. Os trabalhadores não esperam ficar de braços cruzados e deixar que os seus empregadores lutem sozinhos para satisfazer as suas exigências de equidade, compreensão e alinhamento com os valores sociais e ambientais. Os nossos dados mostram que as pessoas estão dispostas a fazer a sua parte para ajudar nas melhorias necessárias. Esta vontade permite que os empregadores aproveitem esta energia e envolvam os talentos em tudo, da defesa de causas à elaboração de políticas.

Ao criarem mais oportunidades de participação para os trabalhadores, as empresas podem fazer progressos significativos em termos de equidade e inclusão, ao mesmo tempo que aumentam o envolvimento geral da força de trabalho.

4. IA & SKILLING

Os talentos continuam a dar prioridade à preparação das suas competências para o futuro, especialmente à luz da adopção generalizada da IA.

Apesar de existir uma atitude mais complexa no que diz respeito à progressão de carreira, cerca de um terço dos trabalhadores (29%) deixaria um emprego que não oferecesse formação e oportunidades de desenvolvimento.

Estas são vistas como uma responsabilidade partilhada entre trabalhadores e empregadores IA está no topo das competências que as pessoas querem desenvolver.

PRINCIPAIS LIÇÕES

1. A qualificação melhora a retenção. As oportunidades de formação e desenvolvimento não são negociáveis para os talentos, muitos dos quais considerariam mesmo abandonar o emprego actual ou não fazer uma mudança futura na carreira se estas não existissem. Para os empregadores, isto sugere que poderão ter de reavaliar se estão disponíveis oportunidades adequadas de upskill ou reskill para todos. Num mundo de trabalho dinâmico, os empregadores devem garantir que a qualificação está disponível para a força de trabalho.

Os currículos de aprendizagem personalizados ajudarão os trabalhadores a avaliar as lacunas nos seus conjuntos de competências e a colmatá- -las de forma sistemática.

2. A IA está em foco. A formação é particularmente importante porque a digitalização e a automação – em particular a IA – perturbam os empregos tradicionais, especialmente, embora não exclusivamente, entre os trabalhadores operacionais. Os empregadores devem tomar medidas para responder a esta necessidade de permanecerem competitivos, o que, por sua vez, manterá os seus trabalhadores relevantes num mundo do trabalho em rápida evolução.

As empresas devem identificar as áreas das suas operações onde a IA provavelmente terá o maior impacto. Podem então identificar lacunas de conhecimentos e dar aos trabalhadores as competências necessárias para gerirem as mudanças.

3. Parceiros no desenvolvimento. Os colaboradores não atribuem a responsabilidade da formação apenas ao empregador. Estão dispostos a assumir alguma responsabilidade pela evolução dos seus conjuntos de competências em parceria com os empregadores.

A criação de mecanismos eficazes e práticos para o feedback dos trabalhadores – onde possam falar tanto sobre a formação que desejam como sobre a qualidade das soluções de qualificação oferecidas – pode ajudar a melhorar e a aumentar o envolvimento nestes programas.

Ao criarem uma verdadeira parceria com os seus talentos, os empregadores garantem que ambas as partes têm acesso às competências e aos conhecimentos de que necessitarão nos próximos anos.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 215 de Fevereiro de 2024

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