Randstad Insight: Salário emocional e liderança de excelência: duas faces da mesma moeda?

Por Mariana Canto e Castro | Directora de Recursos Humanos da Randstad Portugal

Todo o salário é emocional! Até o que recebemos sob a forma de retribuição pecuniária porque é com ele que a grande maioria da população faz face às suas despesas de vida e nada afecta mais a produtividade, o foco, a concentração e a serenidade do que o constante sobressalto mental de quem tem de se preocupar em garantir que consegue fazer face às suas despesas… ou não.

E cada um sabe da sua vida e dos seus encargos, pelo que julgarmos que um determinado salário é adequado ou não, considerando apenas o seu montante, é desajustado e pode causar enviesamentos, uma vez que por muito elevado que seja pode não ser suficiente se as responsabilidades forem igualmente muitas.

Porém, num país em que o salário mínimo nacional irá ser de 870 euros no próximo ano e em que mais de 20% dos trabalhadores recebem esse montante; num país em que o custo de vida se equipara ao de outros países europeus, em que o valor desse mesmo salário mínimo duplica; num país em que mais de 27% das famílias são monoparentais, o impacto emocional de tão baixos rendimentos é desastroso e tem de ser devidamente enquadrado na realidade laboral dos trabalhadores e na forma necessariamente negativa como os afecta.

Ainda assim, se quisermos ser puristas no conceito de salário emocional, sabemos que estamos a considerar a promoção de práticas e políticas que proporcionam aos trabalhadores benefícios intangíveis, que vão além da compensação económica e que, também eles, contribuem de forma directa para o seu bem estar, felicidade, lealdade, motivação e, subsequentemente, produtividade.

Com o evoluir da sociedade e do mundo, principalmente numa fase pós pandémica, alguns aspectos são particularmente valorizados: flexibilidade horária e de regimes de trabalho, oportunidades de desenvolvimento pessoal, medidas promotoras do equilíbrio da vida pessoal/profissional, medidas de bem estar físico e mental e um bom ambiente de trabalho.

E sendo que as empresas são formadas por pessoas, que os trabalhadores se integram em equipas e que alguém as lidera, um dos factores que mais influencia este ambiente de trabalho são as relações interpessoais, a forma como as equipas funcionam e a liderança que as orienta.

As tristemente famosas lideranças tóxicas, a comunicação desajustada, a inexistência de ferramentas e sistemas de trabalho adequados obrigando a manualidades sem sentido, a incapacidade de aceitação da realidade, entre outros factores, tudo afecta de forma directa e destrutiva a motivação e, consequentemente, a produtividade.

Por vezes, as empresas são tentadas a procurar álibis que justifiquem a não entrega de resultados. E são tão fáceis de encontrar, desde os pseudo trabalhadores-estrela que vão para a concorrência, até à formação que nunca é adequada porque é alegadamente a mais, a menos, desajustada e demasiado exigente, tudo ao mesmo tempo, passando pela comunicação interna que é a mais, a menos, incompreensível ou excessiva, também tudo ao mesmo tempo.

A verdade e o seu oposto tendem a coexistir em casos destes porque por vezes o que não é fácil é o enfrentar da realidade e aceitar que as organizações precisam de se flexibilizar e ajustar de forma a proporcionar ambientes de trabalho sãos, numa perspetiva holística. Por vezes o que não é fácil é os líderes aceitarem a sua quota parte de responsabilidade neste processo. Por vezes o que não é fácil é compreendermos tudo aquilo que podemos exigir a uma empresa e tudo aquilo que temos de lhe entregar, seja como trabalhadores ou como líderes, ou em ambos os casos.

Será a liderança competente e de excelência o ingrediente secreto que mágicamente vai duplicar a rentabilidade corporativa? Seguramente que não. Mas vai impactar enormemente na forma como os trabalhadores dessa empresa se sentem do ponto de vista emocional e na forma como se vão dedicar a alcançar os seus objectivos. O resto consegue-se com uma boa estratégia, uma melhor operacionalização da mesma, uma comunicação transparente e uma gestão firme, próxima e autêntica.

O rendimento pecuniário, é básico e essencial e deve ser objectivo da sociedade e das empresas que possa ser sempre tão elevado quanto possível, mas a parte emocional, que por vezes tem “apenas” o custo de um relacionamento profissional saudável, responsabilizador e aberto é o pequeno-grande detalhe diferenciador. Afinal recebemos salário uma vez por mês, mas estamos todos os dias inseridos no nosso ambiente de trabalho…

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 224 de Novembro de 2024

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