O “malabarismo” orçamental

Opinião de Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

Ou a economia cresce por força das exportações, ou cresce por força do aumento do consumo interno, ou cresce por causa da inflação e aumento de preços. Estas são as variáveis Portuguesas orçamentais para definir o crescimento do PIB e logo a receita fiscal e a consequente despesa e dívida pública. Apenas há uma variável que não se relaciona com a economia: as taxas, os impostos sobre os consumos “renegados” (como o tabaco) e as coimas. Estes dependem apenas de um estado “vampiro” de dinheiro que se tem de alimentar, custe o que custar. Por isso pagamos taxas por um serviço público que não temos, fora de prazo e mal feito. Ouvimos justificações nos impostos sobre o tabaco com o custo que o tratamento dos fumadores custa, que é mentira! A cobrança de impostos é muito superior ao custo do seu tratamento. E se assim é, porque não cobrar impostos superiores aos obesos (aqueles que chamo de  “obesos conscientes”) que consomem recursos do SNS como ninguém? E finalmente as coimas (as multas) que crescem como nunca à custa de uma palavra pomposa como por exemplo a “prevenção” no excesso de velocidade, quando o que se pretende mesmo é multar o condutor e fazê-lo sentir mal para pagar sem reclamar. 

Se assim não fosse, porque podem os políticos desrespeitar as regras de trânsito e velocidade quando circulam? Têm pressa por questões de interesse público (como irem jantar a casa a horas)? Só que também estão a aumentar o risco de acidentes e diminuir a prevenção, como já aconteceu. E agora? Ou o aumento do IUC, que é uma duplicação fiscal que vai penalizar quem não deve, por causa dum estado que não faz o que devia: melhorar os transportes públicos em todo o país. 

Mas falemos da verdadeira economia: as exportações! No terceiro trimestre deste ano, caíram -8,8% em termos nominais face ao mesmo período de 2022. As importações diminuíram -12,3%. Seria bom só analisar estes 2 valores pois a balança comercial seria positiva. Só que pelo segundo trimestre, o “motor” da economia Portuguesa está a desaparecer. Uma Europa em crise com menor procura externa pressionada pela subida dos juros está a afectar seriamente a economia portuguesa. Só o BP e o BCE não deram conta que estavam a aplicar uma medida de contração da procura quando o problema está do lado da oferta. A crise era inevitável pois a “receita” estava parcialmente errada, foi aplicada de forma tardia e em excesso. E a economia portuguesa continua a não ter valor agregado inovador elevado para garantir crescimento em tempo de crise. Por isso vemos que em 9 meses de 2023, o lucro somado de oito grandes empresas no país aumentou +€1,4 mil milhões face a 2022, mas numa economia que está a abrandar e em empresas como a banca, grande distribuição e energia. Empresas sólidas mas muito dependentes dos ciclos económicos, das decisões do BCE, da inflação (e não totalmente da inovação, assentes totalmente no desenvolvimento de novos modelos de negócio disruptivos ou da internacionalização…. Mas bem geridas e a gerar riqueza com todo o mérito que têm).

Só que agora Portugal tem um problema nas exportações (quando o governo se vangloriava ainda há pouco tempo do seu crescimento excepcional – mesmo sem entender porquê), e quer portanto apoiar o crescimento do PIB no aumento do consumo interno. Algo que vai aumentar a procura e logo aumentar a inflação. O mesmo “malabarismo” orçamental de 2015. Para isso não estimula o crescimento económico, apenas disponibiliza mais rendimento “imediato” às famílias. E repito “imediato”. Como? Através das receitas normais dum modelo vazio de ideias. Cria “dois malabarismos”: o primeiro,  a criação de regimes de apoio nas moratórias nos juros durante dois anos e nas bonificações pagas pelo Estado. Ou seja “empurrar com a barriga” como diz o povo. Pois um dia, o cidadão tem de pagar tudo de volta ou por outro lado volta a ter que pagar o valor de mercado. O segundo malabarismo é o fiscal: o valor do IRS baixa ligeiramente (e efetivamente) até ao quinto escalão. Só que a cobrança de impostos indiretos aumenta 9%. Estes são os impostos que todos (mesmo os que estão incluídos nestes 5 escalões) pagam. Ou seja, os mais necessitados têm mais tesouraria mensal e menos economia anual. Os outros têm menos de tudo. Portanto são alguns “malabarismos” de uma política económico-financeira que não sabe incentivar o investimento (directo estrangeiro nomeadamente e ainda por cima acaba com os “vistos gold”, quando devia reformular e apenas permitir para quem invista num negócio que traga valor para Portugal), como dinamizar o crescimento económico real (e não o inflacionário), como facilitar a capitalização das empresas, promover a inovação… e que depende de um setor (turismo) influenciado por inúmeras variáveis que podem-se alterar de um dia para o outro (segurança, preço, cortesia, disponibilidade aérea das low cost, etc etc etc). 

Agora vejamos o exemplo da Dinamarca: uma única empresa (a farmacêutica Novo Nordisk) passou a valer mais que o PIB do seu país (US$ 446 biliões, ou seja acima do PIB da Dinamarca, que é estimado em US$ 395 biliões) e se tornou a mais valiosa da Europa (ultrapassando a LVMH). Cria emprego e riqueza com o PIB do seu país a ter um crescimento no primeiro semestre de +1,7% quando, sem a indústria farmacêutica (IF), recuaria -0.3%. Ou pior, poderia cair -15% nos últimos 12 meses sem a IF. E neste exemplo o dinamizador não é o fiscal como muitos criticam no exemplo irlandês (por ignorância diga-se). O dinamizador é o investimento estratégico num setor através do estímulo à inovação, desenvolvimento e retenção de talento, rapidez e transparência nos procedimentos oficiais, apoio público (não financeiro) à realização de ensaios clínicos, ao registo regulamentar, etc etc etc. Por isso escrevi há algum tempo que a indústria farmacêutica poderia ser o PRR Português. 

Portanto chega de malabarismos orçamentais. O segredo afinal é público: basta definir uma estratégia económica que aumente a “riqueza” e não que aumente a “pobreza e dependência do estado”. Chega de “odiar” a riqueza, de querer acabar com quem paga impostos (os ditos ricos em Portugal mas que não passam de classe média baixa noutros países) e depois querer apoiar os mais necessitados. Como? Com que impostos? Só apenas 50% dos  portugueses paga IRS. 

Portanto a ideia de obrigar todos a declarar IRS ( não a pagar IRS), faz sentido. Nos escalões isentos, pode aumentar-se “artificialmente” o valor salarial com o valor da taxa do IRS mais baixo (não pagando segurança social, para não inflacionar os custos das empresas). Assim os cidadãos saberiam quanto pagariam de impostos (ou pelo menos quanto poderiam ganhar a mais). Existiria consciência que pagar impostos não é fácil e que a fuga aos impostos (economia paralela é mais de 30% do PIB) a todos prejudica. Começávamos a pedir fatura no cabeleireiro ou na oficina do automóvel.

A informação também poderia ser utilizada como ferramenta estratégica, por exemplo, nos recibos de vencimento, nas faturas e noutros documentos fiscais. Ao virem escrutinados os valores dos impostos, taxas e “sei lá mais o quê”, no preço final pago pelo contribuinte. Seria algo como “sem impostos e taxinhas o serviço ou produto custaria apenas  X” mas “com impostos e taxinhas custa X+Y”. 

Acabem com os malabarismos orçamentais, com a política da “mão estendida” e pf queiram acabar com os pobres e não com os ricos!

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