O impacto ambiental da economia digital

Por Hernani Baptista, Project Manager de DXC Portugal

As tecnologias digitais são essenciais para o desenvolvimento económico e social, com os objetos e interfaces digitais a tomarem gradualmente conta de todos os aspetos da nossa vida social. A transição digital é considerada um instrumento fundamental para reduzir o consumo de energia em muitos sectores, a tal ponto que, atualmente, dificilmente se afigura possível enfrentar as alterações climáticas sem a incorporação em larga escala das tecnologias digitais. Mas será assim tão linear?

Os impactos ambientais diretos e indiretos (efeitos de ricochete) relacionados com a utilização crescente do digital são constantemente subestimados, devido à miniaturização dos dispositivos e à “invisibilidade” das infraestruturas conexas. Por exemplo, o streaming de vídeo é atualmente utilizado de forma intensiva. Armazenados em centros de dados, os vídeos são transferidos para os nossos terminais (computadores, smartphones, televisores ligados, etc.) através de redes (cabos, fibra ótica, routers, antenas de redes móveis, etc.). Todos estes processos requerem eletricidade, cuja produção consome recursos e implica emissões de CO2. Da mesma maneira, embora a passagem das infraestruturas físicas dos datacenters locais para as clouds públicas apresente ganhos incontestáveis em termos ambientais, a quantificação dos benefícios atingidos continua a ser muito opaca não permitindo caracterizar e quantificar os critérios de otimização (regiões/datacenter na própria cloud ou entre fornecedores de cloud).

Existe um risco muito real e relevante de investimentos cada vez mais maciços em tecnologias digitais contribuírem para um aumento líquido da pegada de carbono dos sectores digitalizados. As razões subjacentes para esse forte crescimento do consumo de energia digital são múltiplas, mas podemos, com base numa primeira análise, identificar quatro fontes principais: a massificação dos smartphones, a multiplicação dos periféricos da vida quotidiana, a ascensão da Internet Industrial das Coisas (IIoT) e, por fim, e também consequência das anteriores, a explosão do tráfego de dados.

Uma vez que dispomos de recursos naturais limitados, é obrigatório compreender que cada processo físico, incluindo transferência, processamento ou armazenamento de informação, bem como o dispositivo de produção de equipamentos de tecnologias de informação e de comunicação (TIC) consome energia. A fase de produção dos equipamentos ocupa uma parte muito significativa, cerca de 45% em 2020, na pegada energética total das tecnologias digitais, bem como nas emissões de GEE daí resultantes. Consequentemente, as tecnologias digitais são simultaneamente uma ferramenta e um desafio para a transição para uma economia de baixo carbono. Embora as tecnologias digitais ofereçam oportunidades tangíveis, estão sujeitas aos mesmos condicionalismos que qualquer sistema global.

Embora não exista um consenso entre os especialistas sobre os valores exatos e tendências de crescimento, podemos considerar que o sector das TICs utilizou cerca de 4 a 6% de toda a eletricidade gerada a nível mundial em 2020 e que esse valor deverá aumentar significativamente. Considerando que o consumo de energia necessário para as TICs está a aumentar a um ritmo de 9% ao ano, existem cenários em que, mesmo contabilizando o aumento da eficiência energética, a emissão dos gases de efeito de estufa possa chegar em 2025 ao valor de 8% a nível mundial.

Então, o que fazer? Desenvolver práticas e infraestruturas digitais que sejam resilientes e sustentáveis.

 

A avaliação da relevância ambiental das novas tecnologias deve ser sistemática

Algumas inovações tais como as IoT têm um potencial de ganho ambiental, enquanto outras são estruturalmente inadequadas para esse fim. As soluções conectadas (“Smart”) já não são soluções autónomas (“standalone”), são componentes de todo um “sistema digital” e devem ser implementadas de uma forma plenamente informada.

A conceção de um sistema resiliente implica identificar as condições em que é apropriado desenvolver uma determinada solução digital do ponto de vista ambiental. Os chamados projetos “Smart” não devem só ser considerados unicamente pelo seu valor nominal, mas devem ser avaliados com base em considerações ambientais equilibrando riscos e benefícios.

O consumo total de energia de uma camada digital pode ultrapassar as poupanças de energia resultante dos ganhos de eficiência energética. Avaliar a relevância energética de uma nova camada conectada significa ser capaz de medir a diminuição ou o aumento líquido do consumo de energia (tendo em conta tanto o custo energético da fase de produção como o consumo dos equipamentos em funcionamento).

 

As organizações devem aplicar políticas digitais sustentáveis

Para que os Sistemas de Informação (SI) das empresas se tornem resilientes, os projetos digitais devem ser conduzidos de forma racional do ponto de vista ambiental tendo em conta uma utilização holística das tecnologias digitais. Devem ser considerados, entre outras coisas, os serviços subcontratados, o impacto do fabrico da infraestrutura e hardware, a eficiência elétrica de fábricas e locais de exploração, a formação e a gestão de competências digitais sustentáveis e as opções de arquitetura e desenvolvimento de software.

Esta integração requer uma abordagem global da empresa, conduzida pela administração e decisores com o apoio dos executivos do departamento de TI para se fazer a mudança do paradigma.

As organizações, independentemente da sua dimensão, têm de adotar, assim, uma abordagem radicalmente nova das tecnologias digitais, evitando comprar novas ferramentas de otimização sem alterar as estratégias e políticas. A relevância de uma tecnologia não deve ser assumida de acordo com regras gerais, mas sim avaliada para cada caso de uso tendo em conta o seu custo ambiental.

Pelo exposto, é fundamental adotar uma abordagem integrada e sustentável para as tecnologias digitais. O setor tecnológico deve unir-se num compromisso em criar um futuro melhor, onde a inovação e o crescimento andem de mãos dadas com a responsabilidade ambiental.

 

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