O fim de vida dos painéis fotovoltaicos

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Toda e qualquer instalação fotovoltaica, seja numa central dedicada à produção de energia para introdução na rede elétrica, seja numa instalação doméstica ou industrial para autoconsumo, atingirá, em algum momento, o seu tempo de vida útil (considerado geralmente como a perda de 20% da eficiência), sendo corrente estabelecer um tempo de serviço para estes equipamentos de 25-30 anos. Com base na potência instalada e assente neste pressuposto de vida útil, estima-se que a nível mundial venham a ser geradas 96 mil toneladas de “resíduos fotovoltaicos” em 2030 e 86 milhões de toneladas em 2050. Por isso a sua reciclagem será a melhor opção em termos de proteção ambiental e de economia circular.

Alguns estudos apontam para o facto de o limite de rentabilidade para a reciclagem deste tipo de equipamentos/materiais ser de 9-19 mil ton/ano. Acresce que cerca de 93% do total de painéis fotovoltaicos produzidos a nível mundial, em 2021, foi produzido na China. Atualmente o repowering é ainda reduzido e o crescimento assenta sobretudo em novas instalações.

Como é sabido, existem vários tipos de painéis fotovoltaicos, cada um deles constituído por diferentes materiais e tecnologias e por isso tendo que ter abordagens desafiantes e diferentes a nível da reciclagem, com diferentes processos de pré-tratamento e extração, por via mecânica e química. Muitas das incertezas a este nível assentam também no grau de degradação dos painéis, da acessibilidade das infraestruturas de reciclagem, da procura e preço dos materiais recuperados e mesmo do impacto da atividade no ambiente.

Assim, será importante promover a responsabilidade dos produtores, no seguimento da Diretiva Europeia dos Resíduos de Equipamento Elétrico e Eletrónico de 2014, responsabilizando-os por toda a cadeia após uso destes equipamentos. Os painéis fotovoltaicos usados que começam a surgir são frequentemente depositados em aterro, pelo que urge também encarecer este tipo de “tratamento”.

Um relatório de uma importante agência internacional no domínio das renováveis, demonstrou que a massa dos módulos diminui acentuadamente ao longo do tempo, desde 145 kg/kW nos anos 90 para 45 kg/kW estimado para 2050, usando-se nos cálculos atuais um valor médio de 60 kg/kW (ou 60 ton/MW). Note-se, no entanto, que os principais componentes de um sistema fotovoltaico integram o módulo fotovoltaico propriamente dito, a estrutura de suporte, o inversor, a cablagem, caixas de junção e dispositivos de proteção, contadores elétricos e eventualmente baterias (sistemas off-grid).

Deixo aqui também, a nível indicativo, alguma informação apenas para alguns dos materiais componentes dos módulosfotovoltaicos: alumínio (12,8 kg/kWp), silício (3,1 kg/kWp), prata (30 gramas kg/kWp), cobre (450 gramas kg/kWp), vidro (54,7 kg/kWp). Saliente-se que a prata recuperada pode representar 47% do valor embora apenas corresponda a muito menos de 1% da massa do módulo, enquanto que o vidro representa 8% do valor mas cerca de 70-75% da massa).

A nível ambiental é referida uma redução de 70% na energia consumida quando se recicla o silício em vez da sua produção primária. Para além dos materiais referidos existe ainda uma fração que pode ter recuperação energética. E existe ainda a fração metálica da estrutura, não incluída nas contas anteriores, assim como os componentes dos inversores, cablagem etc.

Dado do crescimento exponencial do mercado dos painéis fotovoltaicos, é crucial que venhamos a estar preparados para uma reciclagem extensiva dos mesmos, podendo esta ser uma importantíssima oportunidade de negócio, eventualmente a nível de mercado ibérico, mas é preciso começar a “preparar já o terreno”. Este será o papel dos privados. Existe ainda a oportunidade de reutilização em “segunda vida” funcional para certos tipos de aplicações em que a eficiência não seja determinante. Porém, para isso é preciso regular este potencial mercado de reutilização, assim como harmonizar e regulamentar a questão da recolha e recuperação dos equipamentos usados. Aqui o Estado tem um papel fundamental.

A aposta na investigação de forma a obter tecnologias cutting-edge para este tipo de reciclagem e desenvolver um design adequado tendente à facilitação da mesma é também fundamental, eventualmente com recurso a financiamento da União Europeia, financiamento esse que poderá ser estendido à instalação de centros regionais de recolha e reciclagem neste domínio.

Ficam aqui algumas pistas para os principais stakeholders do setor se debruçarem e para os ajudar a dar os passos necessários para resolver um problema num futuro muito próximo que se anuncia.

 

 

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