Advisor. O surgimento de uma nova carreira.

Opinião de Luis Rasquilha, CEO do Ecosistema Inova. Professor da FIA, da Fundação Dom Cabral (FDC), do Hospital Albert Einstein e da ESALQ/USP (Universidade de São Paulo). Conselheiro Consultivo da Mercur do Brasil.

Em janeiro de 2000, já no primeiro mês do novo milênio, o nosso querido e brilhante Stephen Hawking já nos alertou:
“O século XXI será o século da complexidade”

Ele estava certo! Ano após ano neste século o nível de complexidade ganha mais uma camada. E a década 2020 – 2030 talvez reúna os ingredientes mais marcantes deste “festival da complexidade”.

Estamos com aproximadamente 220 anos de era industrial. Este período, em termos de suporte à gestão, pode ser dividido em três fases.
Fase I: Entre 1800 e 1900. Nestes primeiros 100 anos praticamente não se viam ferramentas de gestão ou qualquer tipo de suporte à gestão. Empresas eram, em sua maioria, pequenas e administradas de forma espartana. O filme “Tempos modernos”, de 1936 e com a brilhante participação de Charles Chaplin, mostra um pouco disso.
Fase II: Entre 1900 e 1950. No início do século passado, mas principalmente entre a 1ª e a 2ª guerra nasce a chamada “Administração Científica”, modelo de gestão desenvolvido pelo engenheiro norte-americano Frederick Taylor, considerado o pai da administração científica e um dos primeiros sistematizadores da disciplina científica da administração de empresas. O modelo caracterizou-se pela ênfase nas tarefas, visando o aumento da eficiência. Algumas (poucas) ferramentas e modelos começam a surgir para darem suporte a empresas que começavam a crescer e se tornar um pouco mais complexas.
Fase III: Entre 1950 e 2020. Após a segunda guerra mundial, sabemos que, enquanto a Europa contava seus mortos, os EUA contavam seus dólares, ali começavam a nascer grandes empresas e com maior nível de complexidade. Em função disso, mais demanda por suporte à gestão e uma verdadeira profusão de ferramentas, frameworks e modelos para ajudar a gestão a fazer melhores diagnósticos e tomar melhores decisões. Como também sabemos, a fonte maior de inspiração para este período, que aqui chamamos de “Escola Clássica da Gestão” foram as forças armadas. Naquele contexto, só havia uma entidade que sabia como fazer com que muitos pessoas saíssem de suas casas, chegasse no horário correto e um determinado local, vestisse um uniforme, obedecesse a ordens e ponto final. E foi ali, nesta fonte, que fomos beber. O nome das ferramentas (Cinco forças competitivas, matriz SWOT, etc.), o vocabulário usado até hoje (recrutamento e seleção, companhia, comando, subordinados, etc.) e os orientadores (força, poder, maior, melhor, etc.) são todos, absolutamente todos de origem militar.

Notemos que, à medida em que o nível de complexidade aumentava, a necessidade de suporte trilhava o mesmo caminho. Empresas crescendo, globalização em ritmo forte e nível de complexidade aumentando fez nascer e ganhar força uma nova camada de suporte à gestão – a consultoria.

O que é um consultor? É alguém que vai até uma organização, com metodologias (próprias ou da empresa que representa), resolve um problema e vai embora. Uma definição genérica e superficial, mas que mostra a essência deste suporte à gestão chamado de “consultoria”. Camadas de complexidade crescendo e empresas pedindo ajuda a entes externos para solucionar problemas ou definir melhores estratégias de gestão. Até hoje essa carreira abriga muitas pessoas, não só as que trilham desde cedo este caminho, como também executivos e executivas que migram após certo tempo para essa jornada.

No início dos anos 80 um novo movimento começa a ganhar força – o da governança corporativa. A necessidade de maior transparência, responsabilidade e preocupação com a longevidade, cria um ambiente propício ao surgimento de uma nova camada de suporte à gestão – os conselhos consultivos ou de administração.

No Brasil, nasce o IBGC em 1995 como instituição pioneira no tema, seguida depois por várias outras instituições que se juntam ao time de fomento às boas práticas de governança. Assim, duas carreiras se consolidam: Consultor e Conselheiro. Parecia suficiente, mas o nível de complexidade não se conteve e continuou aumentando.

Nos últimos 30 anos, aproximadamente, passamos a acompanhar três leis ligadas à tecnologia que já anunciavam o que estava por vir em termos de mais complexidade. Estas dizem respeito às velocidades de se processar, transmitir e armazenar dados e, juntas, formaram o que chamamos de “tempestade perfeita”.

São elas:
• LEI DE MOORE: “A velocidade de processamento de dados irá dobrar a cada 18 meses”;
• LEI DE BUTTER: “A velocidade de transmissão de dados irá dobrar a cada 9 meses”;
• LEI DE KRYDER: “A velocidade de armazenamento de dados irá dobrar a cada 13 meses”.

Este trio promoveu e segue promovendo o que, na nossa visão, será conhecida como terceira virada de página da história. Ele fez com que, em junho de 2007, um supercomputador viesse parar na palma da nossa mão – o smartphone – que foi uma das tecnologias que mais rapidamente se disseminou mundialmente.

Com a melhoria dos serviços de rede, 3G, 4G e WiFi, as pessoas se conectaram com o mundo e passaram a ter determinados poderes como nunca na história. Este poder produziu e segue produzindo uma mudança muito grande na forma como nós nos relacionamos com pessoas, marcas, empresas, políticos e, também, com a Educação. Há quem considere que a difusão do uso do smartphone está para este momento histórico como a agricultura e a pecuária estão para a Revolução agrícola (12.000 a.C.), como também a máquina a vapor, para a 1ª Revolução industrial (1.800 d.C.).

De 2007 para cá, vivemos nessa nova era. Um momento histórico único e que talvez nem todos nós tenhamos clareza sobre a sua dimensão. Acreditamos muito que daqui a 2.000 anos as pessoas conversarão sobre nós. “Como foi viver aquela época das três primeiras décadas do século XXI”? Não temos a menor dúvida disso.

O momento histórico atual é, em relevância, equivalente à revolução agrícola e à revolução industrial juntas. E ele tem uma variável diferente e nunca experimentada pela humanidade – o empoderamento das pessoas. Esta possibilidade de, com um smartphone na mão e um mínimo sinal de 3G, poder falar para o mundo, propagar suas ideias e dizer o que pensa sobre qualquer coisa foi a “gasolina azul” que muitas causas precisavam.

Temas, por exemplo, como respeito à diversidade, respeito aos animais, à natureza e às minorias ganharam e seguem ganhando uma força sem precedentes. Não obstante, com igual alcance, teorias da conspiração e Fake News jamais fizeram estrago semelhante como no atual momento. Como temos dito em nossas aulas, o smartphone foi a maior transferência coletiva de poder da história. O mundo nunca mais foi o mesmo depois dele.

Tais velocidades, de processamento, transmissão e armazenamento de dados, não param e não irão parar de crescer. A cada ano, mais um “filho” delas nos é apresentado. No ano de 2023, em particular, o que mais chama a atenção é a aplicação da Inteligência Artificial Generativa, uma nova fronteira da Inteligência Artificial que trabalha com objetivos amplos e que, como “mágica”, interage com os seres humanos com aquilo que mais nos define – a linguagem. Essa nova fronteira nos coloca diante de uma nova era de interação humano-digital, que ainda não sabemos bem como será, seus impactos, riscos e dilemas éticos. Em pesquisa recente publicada pela AMCHAM e Humanizadas, com quase 700 entrevistados, sendo 53% em cargos de alta liderança, os dois temas que impactarão as organizações em 2024 são: Inteligência Artificial e agenda E.S.G.

Novamente, todos enxergando novos ingredientes de complexidade na gestão. O tamanho da transformação é tão grande que é comum, e até normal, termos dificuldade às vezes de entender de cara um fenômeno. Como passamos a dizer em sala de aula na Inova Business School:
“Quem não estiver confuso é porque está mal-informado” (Marcelo Veras)

A nossa tese neste artigo é que tamanha complexidade está fazendo surgir uma nova carreira, além das de consultor e conselheiro. Perante um contexto de maior e mais intensa transformação, fica claro que estamos diante de uma nova camada de suporte à gestão – o Advisor.

O termo não é novo, mas parece que agora está ganhando forma mais definida e menos líquida.

Um Advisor de gestão é um profissional que fornece orientação estratégica e especializada para ajudar as organizações a melhorar seu desempenho e alcançar seus objetivos. Esses profissionais são contratados para oferecer conhecimentos e experiências valiosas em áreas específicas, como estratégia, operações, finanças, recursos humanos, marketing, tecnologia, M&A e outros temas relacionados à gestão de negócios. Mapeamos mais de 20 áreas de expertise nas quais uma empresa pode contar com um Advisor, obviamente dependendo do seu momento, desafios e objetivos empresariais enumeradas na página 6 deste artigo.

O papel do Advisor de gestão é analisar os desafios e oportunidades enfrentados por uma organização e fornecer recomendações personalizadas para melhorar a eficiência, a eficácia e a rentabilidade. Eles trabalham em estreita colaboração com os líderes da empresa, como diretores executivos, gerentes e proprietários e até mesmo com o conselho. Com base nessa compreensão, o Advisor de gestão pode ajudar a desenvolver estratégias e planos de ação para resolver problemas específicos, impulsionar o crescimento e otimizar os processos internos.

Além disso, os Advisors de gestão podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento e implementação de mudanças organizacionais. Eles ajudam a identificar áreas de melhoria, implementam práticas recomendadas e fornecem suporte durante o processo de mudança.

Os Advisors de gestão geralmente têm um vasto conhecimento em sua área de atuação e uma compreensão abrangente dos desafios enfrentados pelas empresas. Além disso, muitos possuem experiência prática significativa em cargos de liderança em empresas ou organizações similares, o que lhes permite ter uma visão prática dos problemas empresariais e das melhores soluções.

O Advisor coloca a sua experiência ao serviço das empresas para quem trabalha fortalecendo a personalização e tratando cada caso como único. As diferenças entre Consultor, Conselheiro e Advisor estão relacionadas ao escopo de atuação e ao tipo de envolvimento com a organização.

Consultor:
• Um consultor é um profissional externo contratado para aplicar metodologias e expertise em soluções para desafios específicos de negócios;
• Os consultores geralmente têm uma área de especialização, como estratégia, finanças, marketing, recursos humanos, tecnologia, entre outros, e são contratados para resolver problemas específicos ou fornecer insights e recomendações;
• Sua atuação pode variar em duração e escopo, desde projetos de curto prazo até engajamentos mais longos, dependendo das necessidades da organização;
• Os consultores podem realizar análises, fornecer recomendações, implementar mudanças e auxiliar no desenvolvimento de soluções, mas geralmente não têm poder de tomada de decisão formal na organização;
• Normalmente os consultores recorrem a metodologias pré-definidas e já testadas em outros casos.

Conselheiro:
• Um conselheiro faz parte de um conselho consultivo ou de administração de uma organização – que é o elo de ligação entre a propriedade e a gestão;
• Eles têm um papel mais permanente e estratégico na direção da organização, atuando na governança corporativa e no direcionamento estratégico da gestão em 4 pilares: Estratégia de Negócios, Pessoas e Cultura, Econômico-Financeiro e Tecnologia;
• Os conselheiros são eleitos ou nomeados como independentes ou para representar os interesses dos acionistas ou partes interessadas, e estão envolvidos em decisões estratégicas de alto nível, como definição de visão, suporte à gestão, garantia de conformidade com leis e regulamentos, aprovação de grandes investimentos, fusões e aquisições, gestão de risco e outros temas relacionados com a longevidade da organização.

Advisor:
• Um advisor também é um profissional externo que fornece orientação especializada e estratégica para a organização;
• Oferece insights, análises e recomendações personalizadas para melhorar o desempenho e alcançar os objetivos da organização;
• A atuação do Advisor é mais consultiva, envolvendo um relacionamento próximo com os líderes da organização, com foco em questões específicas de negócios, como estratégia, operações, finanças, crescimento, entre outros;
• Assim como os Consultores, os Advisors não têm poder de tomada de decisão formal na organização, mas sua expertise e conhecimento especializado ajudam a orientar as decisões estratégicas;
• O Advisor aplica a melhor abordagem de acordo com a realidade que enfrenta, personalizando a atuação e fugindo de receitas prontas;
• A organização que contrata um Advisor está interessada na pessoa, com sua experiência, reputação e credibilidade.

Acreditamos que estamos diante de uma nova e promissora carreira, que coloca, como já dito, uma nova e relevante camada de suporte à gestão em um mundo cada vez mais complexo.

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