A verdadeira ordem mundial

Opinião de Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

Voltaire no leito da morte, instado pelo Padre a “renunciar ao diabo” responde que “não está na hora de fazer inimigos”!

Julgo que é o que a China está a tentar fazer com a sua “anémica” economia. Habituada a crescimentos anuais de 2 dígitos, enfrenta desde há alguns anos, uma contração sustentada da economia face às expectativas. Já não vai ser a primeira economia do mundo em 2030 e ultrapassar os EUA. Por isso mudou de estratégia. Primeiro tudo está a fazer para “destruir” a velha ordem mundial do ocidente, apoiando discretamente a Rússia e o sul global. Aproveitando para comprar petróleo ou tecnologia militar barata e com desconto. Apoia o Brasil (que tem a China como seu principal parceiro comercial), a África do Sul, a Coreia do Norte, o Irão, entre outros. Nunca apoiou declaradamente nenhum dos blocos, nem na guerra, nem na paz. Apela cinicamente com um plano de paz sem envolver a Ucrânia, plano impossível de implementar. Enquanto inicia uma parceria “sem limites” com a Rússia, na visita de Xi em 2022 a Moscovo. Tem interesses económicos em todos os blocos por isso tem de manter o status quo. Só que ajudou sorrateiramente a “blocalizar” o mundo, numa lógica de “dividir para reinar”. Dividiu o mundo entre o ocidente colonialista e o bloco Chinês, Russo e o sul global anti colonialista. Esquecendo-se que está a “colonizar economicamente” o continente africano para “sugar” os recursos naturais que tanto precisa, “as commodities” e outros ativos estratégicos. Esmagou Hong Kong e quer fazer o mesmo em Taiwan.  Só que agora tem de renascer, reconstruindo uma nova ordem mundial, liderada por si em que o seu papel será integrar os blocos. Apenas porque precisa de se aproveitar deles! Estima crescer 5% em 2024 mas ninguém credível acredita nesse valor, se não existirem muitos estímulos macroeconómicos por parte do estado. Mesmo com o risco anémico recente de crescimento, não esqueceu o seu objetivo colonialista, vai aumentar o orçamento da Defesa em +7,2%, para mais de 213 mil milhões de euros.

5% de crescimento era para a China, num passado recente, um insucesso económico. Embora o PIB do país asiático tenha enfraquecido em 10 anos, ainda ficou bem acima da média mundial em 2023. Longe vão os anos de 1994 a 2022, em que a China teve um crescimento médio anual de 8,7% no PIB, sendo o pico em 2007 (+14,2%). Mas o miserável crescimento de 2020 (apenas 2,2%), no 1º ano da pandemia de covid-19, obrigou o país a repensar a “rota da seda”. Não no conteúdo mas na forma como tem de agir. Por isso tem de destruir o modelo existente, de se reinventar e reintegrar os blocos à sua maneira, para fazer parte de todos. Sem hostilizar nenhum.

Começou agora a segunda fase do seu plano para estabelecer a nova ordem mundial. Num discurso na sessão de abertura do Fórum de Desenvolvimento da China, que reuniu em Pequim 400 líderes de grandes empresas e organizações internacionais como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, o primeiro-ministro destacou o potencial para atrair investimento estrangeiro. Trata-se da segunda maior economia do mundo que desempenha um papel crucial no crescimento global. Em 2010 ultrapassou o Japão. Mas este modelo falhou com a quebra no sector imobiliário (representava cerca de um terço do output económico da China, mas o investimento em construção caiu 7,8%), riscos de deflação, quebras no consumo interno e no investimento, uma contração demográfica relevante, obrigam a um novo paradigma. A de atração de investimento direto estrangeiro, a abertura da economia e a integração plena na economia mundial. Estando presente em todos os blocos, repensou a “rota da seda”, agora não apenas assente na Ásia meridional e central, mas  também no sul (como há 500 anos atrás). É parte da estratégia para impulsionar o desenvolvimento económico global e aumentar a influência geopolítica por parte da China. A nova rota da seda diversificou-se geograficamente e assenta agora num novo modelo económico de atração de investimento estrangeiro, continuação do investimento em infraestruturas, criação de uma aparente transparência, intenção de respeito pela propriedade intelectual e industrial, eliminação de barreiras administrativas… Mas na essência, tudo continuará como dantes!