O negócio secreto de Zuckerberg: Meta fatura milhares de milhões de euros na China com anúncios fraudulentos

Anúncios associados a burlas representam cerca de 2% da receita total do grupo, o equivalente a aproximadamente 2,8 mil milhões de euros, um valor considerado demasiado elevado para ser ignorado

Francisco Laranjeira
Dezembro 15, 2025
19:00

Sites falsos que imitam meios de comunicação social credíveis e atribuem recomendações de investimento em criptomoedas a figuras públicas tornaram-se uma imagem recorrente nos últimos anos. Celebridades e apresentadores conhecidos surgem associados a supostas “notícias” que, na realidade, servem para promover plataformas fraudulentas. De acordo com o ‘El Economista’, documentos internos da Meta revelam que a empresa terá encerrado este ano um comité criado para travar este tipo de esquemas, abrindo espaço à continuação de anúncios fraudulentos por razões financeiras.

A Meta, detentora do Facebook, WhatsApp e Instagram, criou em 2014 um grupo interno para combater estas práticas, sobretudo ligadas a redes com origem na China. No entanto, segundo a ‘Reuters’, esse comité foi dissolvido apesar de os anúncios associados a burlas representarem cerca de 2% da receita total do grupo, o equivalente a aproximadamente 2,8 mil milhões de euros, um valor considerado demasiado elevado para ser ignorado. A Meta terá obtido, no total, cerca de 83 mil milhões de euros de receita anual, segundo os mesmos documentos.

Golpes chineses com impacto global

Os esquemas fraudulentos com origem na China tornaram-se uma das ameaças menos visíveis, mas mais significativas, para a economia global. Inicialmente direcionados para cidadãos chineses, estes grupos passaram a visar vítimas em todo o mundo após uma repressão intensa por parte das autoridades de Pequim. De acordo com dados internos da Meta citados pelo ‘El Economista’, a influência chinesa é tão determinante que o número de tentativas de burla no WhatsApp e no Facebook diminui durante os feriados na China.

Apesar de os cidadãos chineses estarem impedidos de utilizar as plataformas da Meta dentro do país, a legislação permite o uso dos seus serviços para publicidade dirigida ao exterior. Em 2024, a China terá representado cerca de 16,5 mil milhões de euros em receitas publicitárias para a empresa, perto de 10% do total. Desse montante, cerca de 20%, mais de 3 mil milhões de euros, terá tido origem em atividades ilícitas, como golpes, jogo ilegal e pornografia, segundo documentos citados pela ‘Reuters’.

Em 2024, a Meta reativou um comité interno dedicado ao combate a anúncios fraudulentos, conseguindo reduzir estas práticas em cerca de 50% no segundo semestre do ano. Contudo, essa eficácia teve um custo elevado: a empresa recusou mais de 920 milhões de euros em publicidade. Mark Zuckerberg terá ordenado este ano o encerramento do comité. A Meta confirmou o fim do grupo, classificando-o como uma medida “temporária”, e afirma ter eliminado cerca de 46 milhões de anúncios falsos, sem esclarecer quantos continuam ativos e a gerar receitas.

O esquema do “abate do porco”

Um dos golpes mais comuns é conhecido como “abate do porco”, um esquema de fraude romântica associado a investimentos em criptomoedas. O contacto inicial é feito através de aplicações de mensagens como WhatsApp, Facebook Messenger ou Telegram, com uma abordagem aparentemente inocente. Após semanas ou meses de construção de uma relação de confiança, muitas vezes com contornos românticos, o burlão apresenta uma oportunidade de investimento em plataformas falsas de criptomoedas.

As vítimas são levadas a transferir quantias crescentes de dinheiro, convencidas por imagens de lucros fictícios. Quando tentam recuperar o investimento, surgem pedidos de pagamento de taxas ou impostos inexistentes. Estes esquemas recorrem a notícias falsas que imitam órgãos de comunicação social e atribuem recomendações de investimento a figuras mediáticas conhecidas.

A proliferação destes golpes intensificou-se desde a pandemia da Covid-19. O FBI estima que os cidadãos americanos tenham perdido cerca de 11,5 mil milhões de euros em 2023 devido a este tipo de fraude, embora algumas estimativas independentes apontem para valores próximos dos 46 mil milhões de euros por ano. Um caso emblemático foi a falência de um banco no Kansas, em 2023, após o seu presidente desviar cerca de 43 milhões de euros para um falso investimento em criptomoedas promovido por uma relação virtual.

Nos países onde estas redes operam, o impacto é igualmente grave. Nas Filipinas, uma ex-presidente de câmara foi condenada à prisão perpétua por liderar uma organização de fraudes. Em países fragilizados, como Myanmar, grupos criminosos controlam vastas áreas junto à fronteira com a Tailândia, utilizando centros que funcionam como verdadeiras prisões para pessoas raptadas e forçadas a aplicar golpes online. Com o apoio da inteligência artificial, estas redes conseguem operar em múltiplos idiomas, ampliando o alcance dos esquemas.

Especialistas alertam que este tipo de fraude, alimentado por plataformas digitais e redes globais de crime organizado, está a tornar-se uma das maiores ameaças económicas e sociais do século.

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