Uruguai em seca extrema: Autoridades já adicionam água salgada ao abastecimento público, bem acima dos valores recomendados pela OMS

A situação de seca extrema no Uruguai está a atingir tamanhas proporções que já levaram as autoridades locais a ‘acrescentar’ água salgada à rede de abastecimento público à população da capital, Montevideo, assim como de outras localidades no país.

O Uruguai não está sozinho, pois no Sul da América, segundo a Organização Meteorológica Mundial, da ONU, a precipitação nos últimos quatro meses de 2022 caiu para metade da média normal, e para o valor mais baixo dos últimos 35 anos, naquela região. Os glaceares dos Andes perderam 30% da sua área desde 1980.

Chile e Argentina já sofrem também os efeitos, que devem agravar-se nos próximos meses, mas é mesmo no Uruguai que, para já, estão a ser tomadas as medidas mais drásticas, perante uma realidade assustadora e que deixa as populações receosas. Não com os próximos anos, ou meses: é mesmo uma questão de semanas ou dias, quando já se quase de contam as gotas que se bebem por dia.

Paso Severino, uma das maiores barragem do país, e que garante água potável a mais de metade da população, de 3,4 milhões de pessoas, está a 5% da sua capacidade. Assim, a Administração Sanitária conseguiu autorização para, a partir deste mês, exceder os limites legais permitidos de sódio e cloro na água da rede pública de abastecimento.

Assim, começou-se, a adicionar água do Río de la Plata, no estuário onde a água doce dos rios Paraná e do Uruguai se encontra com o Oceano Atlântico.

Quantidades de sódio e cloro bem acima do recomendado pela OMS
O resultado já está a ser sentido pela população. O ‘acrescento’ de água salgada, resulta numa quantidade de sódio na água da torneira que chega aos 421 miligramas por litro, mais de duas vezes o recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Já quanto ao cloro, atingiu, segundo o Governo, 686 miligramas por litro, um aumento de 50% face ao limite previamente autorizado.

Os uruguaios já se queixam da água salgada que lhes sai das torneiras e as dores de cabeça, (em alguns casos literalmente), para quem sofre de determinados problemas de saúde, vão-se contando cada vez mais.

“Para as pessoas com hipertensão, problemas renais, e pessoas com recomendações para seguirem uma dieta pobre em sal, é recomendado que se tomem medidas extremas de controlo da pressão arterial, e não negligenciar o acompanhamento médico, e, sempre que possível, beber água engarrafada”, declarou a ministra da Saúde Karina Rando, aquando do anúncio das medidas. O Govero assegura que “para a população em geral, não será um problema de saúde”.

Sosa, de 52 anos, conta ao Washington Post que, desde o início do mês, com a mudança, começou a ter dores de cabeça. Lembrou-se logo, ao fim dos primeiros dias de sintomas, da água ligeiramente turva, e salgada que tinha bebido. Tem hipertensão e, depois de perceber a causa dos problemas que estava a registar, só bebe um máximo de dois copos de água da torneira por dia. Perante os efeitos também de uma crise económica, vê-se a poupar o que pode das garrafas de água. “Às vezes aproveito os restos do chá do meu marido, e já só bebemos no máximo dois por dia. A nossa vida mudou completamente”, lamenta.

O próprio Presidente, Luis Lacalle Pou, já foi confrontado, num evento oficial, por uma criança que lhe perguntou “Porque é que a água da torneira está salgada?”. Perante o descontentamento e as críticas, Lacalle Pou recusa discutir o que não foi feito para evitar a situação, e prefere concentrar-se nos projetos que anunciou agora: uma estação de tratamento de águas, uma nova barragem e um centro de dessalinização importado dos EUA.

Racionamento em curso

Os protestos também já saíram às ruas, com a população a clamar “incompetência” e “corrupção” das autoridades e responsáveis. Segundo a presidente da Câmara de Montevideo, nos centros de saúde e policlínicas, 70% dos casos na última semana diziam respeito a pessoas com problemas de hipertensão.

Para alguns casos, já estão a ser passadas “receitas” de água. “Ainda não usei a minha, preferi ajudar uma vizinha de 80 anos, porque eu ainda podia comprar alguma”. Nos supermercados há limites ao que se pode levar para casa: 12 litros por dia.

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