«Teremos de decidir em relação a pessoas que vão ficar dias em isolamento à espera da morte», alerta médico

O médico intensivista e anestesista no Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos, Gustavo Carona, considera que muitos hospitais já estão a entrar em rutura devido ao elevado número de doentes que são hospitalizados por covid-19, especialmente nas unidades de cuidados intensivos (UCI), e que chegará o momento em que é preciso tomar decisões sobre quem tratar e salvar.

“Teremos de decidir em relação a pessoas que vão ficar dias em isolamento à espera da morte”, disse o clínico em entrevista à Rádio Renascença (RR). “A maior parte das pessoas não compreende o que é sair do seu local de trabalho com as lágrimas nos olhos, e sofrer com as suas decisões, a remoê-las e a revisitar esses processos dolorosos para todo o sempre”, acrescentou.

Gustavo Carona também já esteve em missões humanitárias em países como Iraque, Síria, Paquistão, Afeganistão, República Centro-Africana ou Congo. Ainda assim, apesar da sua experiência, admite que nunca “viveu algo tão intenso como esta experiência” da pandemia.

O médico tem publicado vídeos sensibilizantes sobre a pandemia nas redes sociais, como o Instagram. Uma das mensagens passadas frequentemente é que a covid-19 pode “rebentar” se não for levada a sério. Neste sentido, destaca a importância da responsabilidade individual de cada cidadão no combate à pandemia.

“Já não temos a capacidade de dar o melhor tratamento a todos os doentes”, alerta ainda o clínico, em declarações à RR. “A nossa dificuldade é não só a de gerir as nossas tarefas clínicas, mas também a ansiedade de nunca prever o dia de amanhã. E perceber que, cada vez mais, estamos limitados em termos de recursos humanos e de espaço físico para dar resposta às necessidades. Isso causa em nós um acrescento de stress enormíssimo”, sublinha.

Gustavo Carona diz ainda que a situação no hospital onde trabalha “está sempre a piorar”. “Se hoje já é tão difícil de gerir o que temos, como é que vai ser amanhã, depois de amanhã e para a semana?”, alerta.

Desde o início da pandemia, Portugal registou 187.237 casos confirmados de infeção e 3.021 mortes por covid-19, segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde. O Norte registou 55% dos novos casos e a maioria dos óbitos esta terça-feira.