MIT: Quatro princípios para garantir que o trabalho híbrido é produtivo

Os líderes e as equipas que gerem estão a experimentar novas formas de trabalho – tanto a curto prazo durante a COVID-19 como a longo prazo para um mundo pós-pandemia. Os eixos de trabalho estão a girar simultaneamente em termos de local e tempo, com os líderes a conceberem formas híbridas de colaboração com poucos precedentes. É difícil e, obviamente, causa confusão. Que tipo de flexibilidade é mais adequado em relação a onde e quando as pessoas fazem o seu trabalho? Que estratégias são mais eficazes? Alguns CEO prevêem que o trabalho irá acontecer “em qualquer lugar”, enquanto outros estão a pedir aos colaboradores que regressem aos escritórios centrais. Alguns estão a aceitar horários flexíveis, enquanto outros exigem que o seu pessoal esteja disponível das 9h às 17h.

Para encontrarem o caminho certo, os líderes devem compreender os eixos do trabalho híbrido – as vantagens e desvantagens de onde e quando as pessoas trabalham – e alinhá-los para que alimentem a energia, concentração, coordenação e cooperação necessárias para serem produtivos. Neste artigo, irei expor o que estou a ver na evolução dos locais de trabalho híbridos e descrever quatro princípios emergentes: utilizar o espaço do escritório para ampliar a cooperação, fazer do trabalho a partir de casa uma fonte de energia, aproveitar o tempo assíncrono para aumentar a concentração e utilizar horários sincronizados para tarefas que exigem coordenação.

OS EIXOS DO TRABALHO HÍBRIDO: LOCAL E TEMPO

O local de trabalho, para muitas pessoas, tem sido historicamente o escritório. Distinto do espaço pessoal e equipado com todo o mobiliário e tecnologia necessários para as pessoas fazerem o seu trabalho eficientemente, o escritório tem sido um local de congregação, onde as pessoas se reúnem para um objectivo principal – trabalhar.

Durante a COVID-19, isto mudou drasticamente. Para muitas pessoas, o trabalho encontra-se agora localizado nos seus espaços pessoais – as suas casas – enquanto outras trabalham em cafés, centros locais como escritórios satélite mais pequenos ou escritórios partilhados de forma flexível, ou várias combinações de locais remotos.

O GRANDE OBJECTIVO É: PRODUTIVIDADE

Para assegurar que um entendimento de trabalho híbrido funciona, os líderes têm de criar um contexto de local e tempo que acentue em vez de esgotar a produtividade. Ao fazê-lo, precisam de ter em conta os elementos de produtividade que são particularmente sensíveis a estas características.

A base do trabalho produtivo começa com a energia. Na maioria dos empregos, as pessoas são mais produtivas quando experimentam vitalidade positiva e bem-estar, e a sua produtividade esgota-se quando estão exaustas ou ansiosas e os seus hábitos de trabalho se tornam nocivos. A base seguinte em muitos empregos onde é necessária uma verdadeira concentração é o foco. Quando o contexto – isto é, o local e o tempo de trabalho – permite às pessoas concentrarem-se, elas conseguem ser altamente produtivas. O seu foco diminui quando o seu contexto as distrai e a sua atenção se dispersa.

Para além destes aspectos independentes do trabalho estão as tarefas que exigem trabalho de equipa. Algumas tarefas exigem uma coordenação significativa com outros indivíduos. Quando as pessoas se alinham flexivelmente umas com as outras, conseguem ser focadas e eficientes; quando este alinhamento se desfaz, as equipas ficam divididas e desarticuladas. E depois há trabalhos e tarefas que exigem que as equipas cooperem e partilhem activamente ideias de formas que lhes permitam idealizar e inovar. Quando os contextos do local e do tempo criam barreiras à cooperação, a produtividade pode sofrer. As pessoas podem demonstrar resistência e podem surgir lutas internas.

As escolhas sobre o local e o tempo representam compromissos. Por exemplo, no que diz respeito ao local, trabalhar num escritório é melhor para a cooperação porque os colegas são mais capazes de desenvolver relações de confiança frente-a-frente, mas também pode esgotar a energia se envolver uma longa deslocação e horas sentados a uma secretária. No que diz respeito ao tempo, o trabalho limitado e inflexível favorece a coordenação de horários, uma vez que o tempo dos colegas pode ser sincronizado. Mas esgota o foco porque não tem em conta os ritmos individuais de concentração.

O que estes compromissos significam é que, embora os aspectos do trabalho híbrido tenham potencial para reforçar a produtividade, precisam de ser concebidos com um nível de intencionalidade sobre o local e o tempo que não é praticado nos sistemas de trabalho tradicionais, onde ambos os aspectos estão condicionados. Esta intencionalidade significa compreender os factores de produtividade essenciais necessários (como a capacidade de concentração) e o contexto de trabalho que melhor acentua estes factores, ao mesmo tempo que se tem consciência dos compromissos. Abordar estas escolhas de concepção para permitir o aumento da produtividade será essencial para enfrentar os desafios económicos decorrentes da COVID-19.

CONHECE OS NOVOS PRINCÍPIOS DE LOCAL E TEMPO?

Estudei uma série de empresas para ver como esta intencionalidade está a ser desenvolvida, empresas que eu seguia mesmo antes do início da pandemia. Num webinar recente para as empresas do meu consórcio de investigação, que organizei com Anna Gurun, uma colega da HSM, falámos sobre o modelo híbrido/produtividade. Fiz uma pergunta às empresas: Como vão gerir com sucesso o próximo ano da empresa?

As respostas deram-me esperança: por todo o mundo, algumas organizações estão a desenvolver rapidamente práticas e processos que lhes permitem usar o trabalho híbrido para acentuar os elementos de produtividade (energia, foco, coordenação e cooperação). Outras estão a aperfeiçoar os procedimentos que foram as suas práticas de gestão habituais durante anos. No seu conjunto, vemos o aparecimento de uma série de novos princípios para um local de trabalho produtivo. Estão a conceber soluções de curto prazo para os desafios que foram criados pela COVID-19, ao mesmo tempo que olham para o futuro para terem a certeza que estão a desenvolver práticas sustentáveis.

  • PRINCÍPIO DO LOCAL – Organizar o escritório para a cooperação

Estar no escritório é essencialmente uma actividade social. Na minha coluna de Abril, sobre como ajudar os colaboradores a trabalhar a partir de casa com crianças, citei o célebre estudo do professor Nicholas Bloom, de Stanford, sobre os trabalhadores de call centers a quem foi dada a opção de trabalhar a partir de casa. Após seis meses, mais de metade quis regressar ao escritório, mesmo com longas deslocações. Ansiavam pela sociabilidade e pela cooperação presencial de estar num espaço partilhado com os colegas. À medida que as empresas começam a persuadir ou a esperar que os colaboradores regressem aos escritórios, é importante aproveitar ao máximo a experiência. Isso significa criar um lugar onde a cooperação e a interacção podem prosperar neste momento, enquanto a pandemia de COVID-19 ainda é uma preocupação – e a longo prazo, à medida que o trabalho híbrido se torna a norma.

Transformar um escritório num local de cooperação depende muito da forma como é concebido. Esta ideia foi fundamental para o grupo de design global Arup e para o seu líder de design, Joseph Correnza, na construção do seu escritório em Melbourne. Embora as decisões de design tivessem sido tomadas antes da pandemia, eram suficientemente flexíveis e “alteráveis” para serem reconfiguradas perante as circunstâncias actuais, sem perder o objectivo a longo prazo de criar um espaço altamente colaborativo e dinâmico, permitindo o movimento informal.

«Precisamos destes encontros uns com os outros, e a qualidade do espaço é crucial tanto para a forma como ouvimos, como para a forma como aprendemos», afirma Jenni Emery, líder global de pessoas e cultura da Arup. «Tivemos de ser realmente intencionais e deliberados.» O número de gabinetes fechados era limitado e grande parte do espaço foi aberto. As linhas de visão em todo o edifício permitem às pessoas vislumbrarem-se facilmente umas às outras e verem que fazem parte de algo maior. Jenni Emery explica que isto criou momentos de importantes encontros fortuitos. O pavimento de cortiça ajuda a reduzir o ruído ambiente e permite que as vozes humanas sejam ouvidas.

Perguntei a Joseph Correnza como uma empresa sem os poderosos recursos da Arup poderia abordar este princípio de cooperação. Ele apresentou três ideias: reduzir os pequenos espaços pessoais e devolvê-los ao espaço cooperativo (quando forem novamente seguros); encorajar as equipas a reunir-se ao ar livre, fora das salas de reunião, para que outros possam sentir a agitação; e mover grupos de pessoas cada trimestre para novos lugares, para que conheçam pessoas diferentes.

  • PRINCÍPIO DO LOCAL – Transformar trabalho em casa em energia

Um dos resultados extraordinariamente positivos do trabalho a partir de casa durante a pandemia é que as pessoas atribuíram o seu antigo tempo das deslocações a actividades que aumentam a sua energia física (através de exercício e actividades de lazer) e a sua energia emocional (passando tempo com a família e amigos). Muitos colaboradores que trabalham em casa estão também a aumentar a sua energia caminhando em parques, comendo comida caseira saudável e estabelecendo laços mais estreitos com os vizinhos.

Dito isto, as pessoas que têm filhos pequenos têm tido dificuldade em gerir os limites entre ser colaborador e progenitor. Para que o trabalho a partir de casa continue a ser uma fonte de energia a longo prazo, é preciso um nível de intencionalidade nas expectativas, tanto dos colaboradores como dos empregadores.

Para a empresa de telecomunicações BT, a COVID-19 deu origem à oportunidade de aperfeiçoar e acelerar os seus princípios do trabalho a partir de casa, há muito estabelecidos.

Quando Nicola J. Millard, uma das principais parceiras de inovação da BT, estudou os trabalhadores à distância mais antigos, descobriu que os seus escritórios em casa desempenharam um papel fundamental no seu sucesso. Enquanto cada colaborador à distância formou o seu espaço único, o que fez a verdadeira diferença foi ter uma sala individual, um ecrã de computador grande e uma boa cadeira. Os rituais também se revelaram importantes, incluindo vestir roupas de trabalho e seguir uma rotina de “preparação”, como se estivessem a sair de casa.

Muitos destes veteranos também maximizaram a sua energia utilizando tecnologias para garantirem que mantinham limites entre o tempo “ligado”, quando estavam disponíveis para responder e colaborar com outros, e o tempo “desligado”, quando podiam envolver-se em actividades que aumentavam a sua energia. Faziam intervalos adequados para o almoço e asseguravam-se de que, no final do dia, abandonavam simbolicamente o local de trabalho. Também negociavam com a família e os colegas para manterem estes limites.

A cultura e o estilo de gestão são essenciais, explicou Nicola J. Millard. «Utilizámos as nossas plataformas de comunicação para desenvolver muitos check-ins de equipas virtuais, para que as pessoas não se sintam isoladas, e criámos encontros virtuais como o “café virtual”, para que as pessoas tenham a oportunidade de conversar com pessoas que não conhecem tão bem.» Mais importante, os trabalhadores à distância da BT têm conseguido ter sucesso com este modelo. «Aprendemos realmente que é fundamental concentrarmo-nos nos resultados, em vez de estarmos presentes no escritório», revela Nicola J. Millard. Isto significa o desenvolvimento de processos de gestão de desempenho virtual que incluem check-ins regulares da equipa, conversas individuais e relatórios mensais à direcção.

  • PRINCÍPIO DO TEMPO – Se o tempo assíncrono aumenta o foco

Há trabalhos para os quais o foco é um factor de produtividade primário. A elaboração de um horário que permite aos colaboradores desligarem-se durante cinco horas para se concentrarem, e numa altura ajustada aos seus ritmos energéticos naturais, pode ser extremamente benéfico, quer o façam num espaço empresarial ou pessoal. Para estas pessoas, os horários assíncronos são ideais.

A prática de consultoria Artemis Connection, com sede em Washington, foi desenvolvida com o propósito de dar ao seu pessoal ferramentas para trabalharem em tarefas complexas que exigem uma profunda concentração, criatividade e concentração. Christy Johnson, a CEO, explicou-me que, para serem concentrados e produtivos, todos conseguem definir e controlar o seu tempo em termos de quando – e quanto – trabalham.

O que está por detrás desta capacidade é um sistema de gestão de projectos bem fundamentado. Cada trabalho é dividido nas suas tarefas componentes e analisado com base na quantidade provável de tempo necessário para as realizar. São depois agrupados em blocos de 15 a 20 horas. Estes blocos são então avaliados dentro do grupo e atribuídos a colaboradores individuais. «Por exemplo, estamos a analisar o projecto de um cliente para escrever um relatório de investigação », explica Christy Johnson.

«Acreditamos que serão cerca de 60 horas de trabalho por semana, em três blocos de 20 horas. Olhamos para as permutações – por exemplo, uma pessoa a fazer dois blocos e outra a fazer um», acrescenta ainda.

Os colaboradores podem decidir que o seu tempo máximo de concentração é de 20 horas por semana, enquanto outros podem assumir mais. Um acordo prévio de tempo e de tarefas ajuda a «assegurar que o trabalho não se expandirá para preencher o tempo», revela Christy Johnson. Significa também que as pessoas podem trabalhar ao seu próprio ritmo. «Por exemplo, o meu melhor trabalho é quando me concentro intensamente durante 90 minutos e depois faço uma pausa», explica.

Para muitos colaboradores da Artemis que saíram de grandes empresas de consultoria, controlar o seu próprio tempo é uma verdadeira fonte de libertação.

  • PRINCÍPIO DO TEMPO – Tempo sincronizado é base da coordenação

Enquanto algumas tarefas são melhor cumpridas quando as pessoas se concentram e trabalham sozinhas, é certo que outras exigem uma coordenação em tempo real em projectos com diálogo e feedback imediato.

Normalmente, o tempo sincronizado ocorre naturalmente porque as pessoas estão no mesmo local ao mesmo tempo. Mas os avanços tecnológicos têm permitido a concepção de um tempo sincronizado que não depende do local e onde é possível criar oportunidades para interacções virtuais produtivas em tempo real. Foi esta a visão de Selina Millstam, que dirige a gestão de talentos e a mudança cultural na empresa sueca de tecnologia das comunicações Ericsson. O seu objectivo era ter um diálogo em toda a empresa que encorajasse as pessoas a partilharem e coordenarem as suas crenças sobre os valores e comportamentos que seriam fundamentais para o sucesso do negócio a longo prazo. A conversa, com moderador, durou 72 horas, com mais de 95 mil colaboradores de 180 distritos convidados a participar.

Os colaboradores foram convidados a reservar tempo para se juntarem ao diálogo online. Facilitadores de todo o mundo evitaram que este projecto fosse um caos para todos. Por exemplo, quando as pessoas se juntaram nas primeiras horas, foram encorajadas a entrar nos tópicos de conversação sobre cada uma das áreas de enfoque estimuladas pela iniciativa de mudança cultural.

O tempo partilhado permitiu que pessoas em diferentes fusos horários se fossem ligando umas às outras e assim se mantivessem por algum tempo. Por exemplo, um programador de software na Índia conseguiu falar durante bastante tempo com uma pessoa das relações com clientes na Alemanha, criando um tópico importante para o qual outros contribuíram. «Houve algo de natural e autêntico ao ouvir as pessoas falar e reflectir no momento», afirmou Selina Millstam.

Cada participante foi encorajado a retomar o diálogo de forma assíncrona ao longo dos três dias seguintes – criando, no final, mais de 20 mil tópicos conversação.

OLHAR PARA O FUTURO

Todas as organizações terão de pensar na forma de aumentar a energia, concentração, coordenação e cooperação para tornarem o trabalho híbrido produtivo.

Sugiro que os líderes tenham em mente quatro recomendações nas próximas semanas e meses:

  • Não se movam demasiado depressa. As preferências individuais levarão tempo a tornar-se claras. Foram necessários seis meses de trabalho em casa para os participantes do estudo Bloom decidirem que queriam regressar ao escritório. E nas fases iniciais das experiências da BT, a produtividade dos trabalhadores à distância caiu drasticamente antes de aumentar. Evitem decisões iniciais que terão efeitos a longo prazo – deixem as opções em aberto.
  • Tenham em mente as contrapartidas. Ao conceberem novas formas de trabalho, estejam preparados para os aspectos negativos dos modelos. Trabalhar em casa aumenta a energia, mas também esgota a cooperação. Gerir estes compromissos exige criatividade – tal como a forma como a equipa da BT estabeleceu escritórios satélite para as pessoas que vivem em comunidades semelhantes se reunirem ocasionalmente.
  • Façam experiências. Há muita coisa que ainda não sabemos. É essencial estarem preparados para assumirem riscos. A equipa da Ericsson superou os desafios da coordenação virtual, utilizando uma plataforma participativa online de última geração. Foi preciso coragem para o fazer – mas ao longo do trajecto, os membros da equipa aprenderam a incentivar reuniões ocasionais em toda a organização.
  • Apoiem as capacidades de liderança exigidas para a gestão das preferências. A variedade de combinações de tempo e local que são possíveis exigirá líderes altamente competentes e motivados, empenhados em fazer este trabalho. Exigirá um grau de intencionalidade que não tem sido necessário nas práticas de trabalho tradicionais. Para os líderes, isso significa ser empático e ouvir as necessidades individuais, ao mesmo tempo que se é criativo no desenvolvimento de soluções.
Copyright © Massachusetts Institute of Technology, 2020. Todos os direitos reservados. Distribuído por Tribune Content Agency LLC. Traduzido e publicado com autorização.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 177 de Dezembro de 2020

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