Covid-19 pode ser responsável pelo aumento dos casos de cancro, indicam especialistas

A pandemia da Covid-19 pode ter sido uma das causas do aumento do número de pacientes com cancro: vários estudos apontaram o impacto da redução e suspensão dos rastreios, consultas e cirurgias oncológicas mas, de acordo com os especialistas, há cada vez mais evidências de que o SARS-CoV-2 pode ser um agente oncogénico e responsável pela subida dos diagnósticos de cancro.

Uma das primeiras investigações sobre o impacto do vírus no aparecimento do cancro foi feita em Portugal: em 2020, os investigadores Miguel Alpalhão, João Augusto Ferreira e Paulo Filipe, num estudo publicado na revista ‘Medical Hypotheses’, salientaram que “a homologia estrutural com o SARS-CoV-1 indica que o SARS-CoV-2 pode ser capaz de prejudicar diretamente os principais guardiões das funções supressoras de tumor. Além disso, a Covid-19 apresenta uma resposta inflamatória preeminente com stress oxidativo, que atua como iniciador e promotor da carcinogénese”.

De acordo com Filipe Froes, pneumologista e diretor da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Pulido Valente, em Lisboa, “isto pode ser esta justificação que procurávamos para o aumento de doenças oncológica que se está a verificar em idades mais jovens”, referiu, citado pela ‘CNN Portugal’.

Um estudo realizado na Polónia, apresentado no final de 2023, na revista ‘Frontiers in Molecular Biosciences’, veio reforçar esta hipótese. “Esta pandemia que vivemos de 2020 a 2023 pode estar associada ao aumento de doenças neoplásicas”, indicou Froes, salientando três fatores, “indireto e dois diretos”, para que pessoas com menos de 50 anos estarem mais suscetíveis a esta associação.

O fator indireto, referiu, diz respeito ao “desvio acentuado de custos e implementação de medidas restritivas que atrasou rastreios, diagnósticos e tratamento, e que se traduziu num aumento do número de casos em estádios mais avançados”.

Entre os fatores diretos estão duas situações que se têm verificado nos últimos três anos: pessoas com um cancro até então ‘silencioso’ e que se viria a manifestar mais tarde, mas que o vírus ‘potenciou’ mais cedo e pessoas que ficaram com cancro depois da infeção, podendo juntar-se assim o SARS-CoV-2 à restrita lista de causas virais da doença oncológica.

Filipe Froes sustentou que houve “a aceleração de casos iniciais de doença neoplásicas que se iriam manifestar mais tarde, mas que se manifestaram mais cedo, sendo que a Covid-19 foi a grande aceleradora” e que a comunidade médica e científica começa agora a perceber que “a própria infeção por SARS-CoV-2 pode ser um fator de indução de novos casos de doença oncológica”.

De acordo com o estudo polaco, “o vírus modula significativamente o sistema imunológico e induz inflamação crónica de baixo grau”, o que pode, por si só, fazer com que a “infeção por SARS-CoV-2 a longo prazo” possa “contribuir para o desenvolvimento de cancros”: o stress oxidativo causado pela infeção – que “afeta a instabilidade do genoma, aumentando o número de mutações, a desregulação do ciclo celular” – e potencial integração do genoma viral são outros fatores em jogo.

“O que estamos a encontrar agora são cada vez mais artigos que mostram as sequelas do SARS-CoV-2, que até na forma mais ligeira apresenta persistência” seja de sintomas como de mazelas, sendo o cancro uma delas, concluiu Filipe Froes.

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