Como podemos tomar decisões em grupo na era pós-COVID-19?
Por Alfonso Ramirez, director-geral da Kaspersky Ibéria
A pandemia COVID-19 mudou drasticamente a nossa rotina diária. Por todo o mundo, a maioria das pessoas passou a trabalhar e a ocupar o seu tempo livre em casa. Como consequência do trabalho remoto, muitas pessoas enfrentam actualmente desafios ligados à organização do seu espaço de trabalho, à produtividade e concentração. E, sem excepção, a súbita mudança de paradigma também alterou a nossa abordagem em relação ao trabalho em equipa e à tomada de decisões conjuntas.
Por razões de segurança compreensíveis, uma vez que o contacto entre pessoas deve ser restringido ao máximo, não há forma de nos reunirmos para trocar ideias como anteriormente. Neste sentido, coloca-se a seguinte questão: quando esta pandemia acabar, como poderemos preparar-nos melhor e manter os processos democráticos eficientes e funcionais, tais como eleições, decisões de gestão empresarial ou reuniões anuais de organizações não-governamentais?
Em primeiro lugar, no que diz respeito às eleições, sabemos que actualmente são organizadas no formato tradicional, onde milhares de pessoas vão às mesas de voto. Isto pode representar um perigo significativo para a saúde das pessoas e permitir que o vírus se propague ainda mais. Os Governos nacionais e as autoridades locais – onde as votações estão previstas para esta Primavera – encontram-se numa encruzilhada para decidir como lidar com estes eventos. As eleições tradicionais que se realizaram durante o início do surto de coronavírus não estiveram isentas de problemas. Por exemplo, a primeira volta das eleições municipais em França, que teve lugar a 15 de Março, registou uma taxa de 56% de abstenção.
Assim sendo, uma das opções que podemos considerar é a votação online. No entanto, aqui a questão não é apenas técnica. Pode ser demasiado difícil ou mesmo impossível votar a partir de dispositivos próprios para as pessoas que têm falta de conhecimento tecnológico – isto pode ser visto como discriminação eleitoral. Por conseguinte, a decisão ideal – e de certa forma difícil – seria adiar as eleições até ao fim da quarentena. Vários países, incluindo França com a segunda volta das eleições locais, o Reino Unido e a Sérvia, já o fizeram. No entanto, quando a pandemia acabar, vale a pena considerar e testar a votação à distância, introduzindo as eleições online como uma das opções, juntamente com a votação presencial nas mesas de voto. Para que isto funcione da melhor forma, os Governos deveriam promover iniciativas educativas que explicassem como e porquê utilizar este método.
Em segundo lugar, entendemos que uma pandemia é também um período difícil para muitas indústrias, uma vez que abranda e perturba processos empresariais. Esta situação afecta negativamente a procura dos clientes nos sectores da hotelaria, viagens e automóvel (estima-se que as vendas de automóveis na China caíram 92% em Fevereiro). Nesta situação, os conselhos de administração das empresas têm de reagir rapidamente e tomar medidas anticrise: seja através da venda de activos – introduzindo novos serviços com a tecnologia contactless – ou parando ou reorientando a sua produção para bens essenciais, como desinfectantes e máscaras faciais. Assim, mesmo que não seja recomendado – ou existam restrições – para reuniões pessoais dos conselhos de administração, a votação das decisões críticas deve ser feita online.
É certo que a implementação da votação electrónica no conselho de administração das empresas requer algumas medidas pré-operacionais. Em primeiro lugar, é importante assegurar que as reuniões virtuais do conselho de administração não violem a legislação local. Depois disso, é necessário alterar os procedimentos internos que regem a tomada de decisões e adoptar novas regras para as reuniões gerais. E, evidentemente, não devemos esquecer que as reuniões do conselho de administração e as votações realizadas online podem estar sujeitas a riscos de cibersegurança. Por isso mesmo, quando se trata de planos e assuntos confidenciais, é importante garantir que todos os membros saibam as regras básicas de cibersegurança e que os resultados das votações sejam protegidos, de modo a não serem roubados ou alterados por hackers.
Em último lugar, a propagação do vírus também afecta o modo de funcionamento das Organizações Não Governamentais. De acordo com um recente inquérito realizado a instituições não governamentais, apenas metade das mesmas tem um plano eficiente para apoiar a continuidade das actividades, enquanto 32% carec desta consideração. Além disso, 15% confirma que o seu plano era insuficiente. Neste momento, as ONG estão a adiar os seus eventos, incluindo as assembleias-gerais periódicas, nas quais os membros elegem o seu órgão directivo e aprovam os seus planos e actividades anuais. Na nossa opinião, tais eventos podem ser realizados online. A colaboração e os serviços de conferências online permitem ao anterior órgão directivo apresentar os resultados do ano anterior, bem como dar aos novos candidatos a oportunidade de se apresentarem a si próprios e aos seus programas.
Antes do início desta pandemia, a realização de eleições online já era uma boa opção, porque permitia, por exemplo, reduzir os custos a longo prazo, bem como poupar tempo aos eleitores, evitando filas de espera ou engarrafamentos. Contudo, o voto pela Internet exige investimentos e custos de mão-de-obra para ser implementado de forma eficaz. Por isso mesmo, tornava-se muitas vezes difícil justificar a necessidade de introduzir esta opção.
No entanto, a pandemia veio demonstrar que é necessário mudar a atitude das pessoas em relação ao voto à distância para manter processos vitais numa situação de crise. É por isso que esperamos que um maior número de organizações e Governos explorem esta opção no futuro. Já é possível assistir a um interesse crescente na votação electrónica entre os parlamentos regionais e os conselhos de administração, mas queremos acreditar que esta procura vai continuar a crescer.