Caso Novo Banco: As opções do Governo analisadas por especialistas

A forma como o Governo irá resolver a anulação da transferência de 476 milhões de euros para o Novo Banco, decidida no Parlamento na votação da proposta de Orçamento do Estado, continua a gerar discussão.

Questionado por e-mail se será aos artigos 105.º e 106.º do texto constitucional que o Governo poderá recorrer caso pretenda suscitar a fiscalização da norma junto do Tribunal Constitucional, o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia refere: “O Governo, para suscitar a fiscalização sucessiva abstrata da constitucionalidade – porque a preventiva só o Presidente da República o pode fazer, e quanto a uma lei do Orçamento de Estado tal nunca sucedeu – deve fazê-lo através do seu primeiro-ministro, que tem legitimidade nos termos do artigo 281º da Constituição. O artigo 105º, nº 2, da Constituição diz que o orçamento do Estado tem de respeitar, quanto às despesas, as ‘obrigações decorrentes de lei ou de contrato'”, explica.

Já Maria d’Oliveira Martins, professora auxiliar e membro do Conselho de Direção da Faculdade de Direito na Universidade Católica em Lisboa, que estudou e abordou este tema na sua tese de doutoramento (A Despesa Pública Justa), além de o mesmo constar nas suas Lições de Finanças Públicas e Direito Financeiro, indica: “É no artigo 105.º, n.º 2 que o Governo pode apoiar um pedido de fiscalização de constitucionalidade. Mais concretamente, na parte em que este artigo prescreve que ‘o Orçamento é elaborado (…) tendo em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato’. Embora, em minha opinião, esse artigo não possa ser lido de forma literal.”

No que diz respeito a prazos de resposta do Tribunal Constitucional, Bacelar Gouveia aponta: “Se for a preventiva, máximo de 25 dias seguidos, podendo o prazo ser encurtado; se for a sucessiva, não há prazo obrigatório, a não ser um prazo geral meramente indicativo de 30 dias que consta do Código de Processo Civil, mas que é inexequível numa decisão com esta complexidade.”

A resposta de Maria d’Oliveira Martins divide-se também de duas formas: “O tempo de resposta por parte do TC poderá variar, consoante o tipo de fiscalização que for suscitada: se o Presidente pedir a fiscalização preventiva da constitucionalidade, o TC terá 25 dias para responder à questão; se o primeiro-ministro pedir a fiscalização sucessiva da constitucionalidade, na melhor das hipóteses, podemos ter uma decisão no espaço máximo de três meses a contar do pedido.”

Outra possibilidade à disposição do Governo é, de acordo com o constitucionalista, o recurso “ao Supremo Tribunal Administrativo se considerar que se trata de um ato administrativo da Assembleia da República, sendo essa construção mais duvidosa”.

Maria d’Oliveira Martins resume: “Para executar o contrato, o Governo precisa de ter cabimento orçamental, por isso, deve aguardar pela decisão do Tribunal Constitucional que declare a inconstitucionalidade da norma ou aguardar que o Parlamento reveja a sua decisão, promovendo uma alteração orçamental. Sendo alheia a esta decisão orçamental, a Lone Star, que contratou com o Estado Português, pode propor uma ação de responsabilidade civil contratual contra o Estado por incumprimento do contrato.”

E, quanto a antecedentes deste género, a professora auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade Católica pormenoriza: “Não conheço caso semelhante apreciado pelo TC, mas tenho conhecimento de decisões do TC que tanto reconhecem legitimidade à Assembleia da República para negar ao Governo alguns instrumentos de governação – como é o caso da não aprovação do Orçamento -, por exemplo, Ac. TC 2014/2011, quanto são sensíveis aos argumentos baseados no princípio da segurança jurídica e no princípio da proteção da confiança legítima dos particulares que contratam com o Estado, numa situação em que a autonomia contratual do Governo se confronta com o poder legislativo da Assembleia da República (por ex. Ac. TC 202/2014), embora o caso não seja igual a este.”

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