Caos no INEM vai hoje ‘incendiar’ o Parlamento: há sete questões essenciais sem resposta e que podem apurar responsabilidades nas falhas de assistência
Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, exigiu, “doa a quem doer”, responsabilidades sobre o caos vivido no INEM; já os partidos políticos exigem a demissão de Ana Paula Martins, ministra da Saúde, como resultado das alegadas 11 mortes registadas devido à falta de socorro por parte do INEM durante a greve às horas extraordinárias dos técnicos de emergência pré-hospitalar.
No Parlamento, vão decorrer esta quinta-feira cinco audições – Comissão de Trabalhadores do INEM; Luís Canária, presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar – ANTEPH; Paulo Colaço, presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Emergência Médica – ANTEM; Rui Lázaro, presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar – STEPH; e Sérgio Dias Janeiro, presidente do Conselho Diretivo do INEM – para os deputados encontrarem resposta a sete questões essenciais, avançou esta quinta-feira a ‘CNN Portugal’.
A greve foi ignorada pelo Ministério da Saúde e INEM?
O Chega, no requerimento para as cinco audições, realçou este ponto. O partido de André Ventura não compreende “como, perante um aviso de greve, da qual não seria difícil de antever os seus elevados riscos, a direção do INEM e a própria tutela parecem ter negligenciado a necessidade de implementar um plano de contingência adequado, garantindo assim a continuidade dos serviços essenciais e a segurança dos cidadãos em situação de emergência”.
A secretária de Estado da Gestão de Saúde, Cristina Vaz Tomé, reconheceu ao canal televisivo que o Governo “não tinha conhecimento do impacto” da greve: no entanto, o jornal ‘Expresso’ avançou que o STEPH deu 10 dias à ministra da Saúde para iniciar negociações e travar a greve – ficou sem qualquer resposta.
Foram decretados serviços mínimos?
Sérgio Janeiro, presidente do INEM, admitiu ter sido impossível cumprir os serviços mínimos durante a greve porque não conseguiu obter uma escala acima dos 70% dos trabalhadores, mesmo com a “convocação” de técnicos. Outra visão tem o sindicato: “a lei diz que têm de ser designados, têm de os identificar. Uma vez que [o mail do INEM] foi enviado às 15:57, três minutos antes do turno das 16:00, já não surtia efeito para o turno da manhã. Em bom rigor, nem para o da tarde, pois alguém que more na Margem Sul e receba um ‘email’ três minutos antes de começar o turno como é que cumpre?, questionou Rui Lázaro – “se o INEM não concordasse deveria ter comunicado à Direção-Geral da Administração e do Emprego Público”, o que não veio a acontecer.
O que foi feito para colmatar a falta de técnicos?
“Temos hoje menos 483 técnicos de emergência pré-hospitalar do que deveríamos. Deviam ser 1.341”, sublinhou Ana Paula Martins, ministra da Saúde. Em causa está a grande taxa de abandono da profissão (40%), mas também a incapacidade formativa do INEM. Só há atualmente cerca de 700 técnicos de emergência pré-hospitalar e só se consegue formar 400 técnicos por ano.
Em que condições trabalham os profissionais do INEM?
Os baixos salários – “pouco mais de 900 euros”, denunciou o sindicato -, a falta de perspetiva na progressão na carreira e a dependência de horas extraordinárias para assegurar os turnos são as queixas repetidas ano após ano: cerca de 23% dos profissionais apresentavam sintomas de stress pós-traumático.
Os problemas do INEM são legado do Governo de António Costa ou resultam da má gestão do atual Executivo?
Carlos Cortes, bastonário da Ordem dos Médicos, garantiu que os problemas no INEM “não são de agora”. Já Rui Lázaro salientou que há “três” anos” que são “denunciados casos em tudo iguais aos que vivenciámos nos últimos dias”. Isso “deveria ter sido suficiente para alertar o poder político” e iniciar negociações com o Governo.
Ana Paula Martins, ministra da Saúde, criticou o legado socialista na situação, defendendo que o INEM “esteve praticamente abandonado”. O PS acusou o primeiro-ministro Luís Montenegro de ser o principal responsável pela falta de resposta do INEM na greve.
Como deve ser feita a refundação do INEM?
Ana Paula Martins quer rever o estatuto do INEM para poder avançar com a sua refundação, sem dizer como poderá acontecer essa refundação: neste ponto, o PS lembrou que “sobre esta promessa nada consta no Orçamento do Estado para 2025”. A questão está ‘presa’ pela demora da abertura do concurso pela CReSaP. Luís Montenegro, líder do Governo, já prometeu apresentar “muito brevemente” um plano para a resolução desta crise, embora sem detalhes.
De quem é a culpa?
A ministra da Saúde veio assumir “total responsabilidade” pelo que aconteceu: para já, retirou o INEM da alçada de Cristina Vaz Tome, secretária de Estado da Gestão de Saúde, sem no entanto fazer qualquer ‘mea culpa’.
Do lado do presidente do INEM, nem uma palavra sobre responsabilidades – Sérgio Janeiro, garantiu Ana Paula Martins, é candidato à presidência do INEM.
O procurador-geral da República, Amadeu Guerra, veio sublinhar que os inquéritos abertos podem apurar responsabilidades políticas, isto é, do próprio Governo neste caso.
O Bloco de Esquerda e o Chega já vieram exigir a demissão de Ana Paula Martins, acusando-a de ser “incapaz de assumir a sua responsabilidade”, e podem mesmo avançar com uma resolução de censura contra a ministra da Saúde – já a Iniciativa Liberal questionou por que é que a secretária de Estado da Gestão da Saúde, bem como o presidente do INEM, continuam em funções.