A Zara criou um império de 18 mil milhões de euros na moda rápida. Agora precisa de abrandar
A marca acaba de anunciar um plano ambicioso para passar para tecidos sustentáveis e reciclagem. Mas precisa de repensar o design do seu vestuário, e não apenas como é produzido.
No Outono passado, na New York Fashion Week, o “tie-dye” (tecidos que são amarrados e tingidos) estava em todo o lado: todos, da Prada a Stella McCartney e Proenza Schouler, enviaram modelos pela passarela com vestidos e T-shirts tingidos, à hippie. Mas para todos aqueles que não podem dar 1800 euros por um vestido, a Zara vem em seu auxílio.
Tal como um relógio suíço, começaram a aparecer vestidos de 35 euros e calções de 25 euros “tie-dye” nas prateleiras das lojas Zara. A Zara, uma marca que factura 18 mil milhões de euros em vendas anuais, inovou e aperfeiçoou a arte da moda rápida. Os 300 designers da Zara criam 12 mil designs novos por ano e, para as peças mais recentes, chega a demorar apenas seis semanas a ir do esboço a um produto na prateleira.
Mas à medida que a indústria da moda passa para práticas mais ecológicas e sustentáveis, temos de perguntar: conseguirá a moda rápida algum dia ser sustentável? A Inditex, a empresa-mãe da Zara (que vale 25 mil milhões de euros), acredita que sim. Anunciou recentemente um novo e ambicioso plano de sustentabilidade que terá impacto nas oito marcas, um grupo que inclui a Massimo Dutti e a Pull&Bear.
Faz parte de um esforço mais abrangente para tornar o sector menos poluente. Mas há uma questão: o vestuário da moda tem um curto tempo de vida. Eis um exemplo: as peças de “tie-dye” que referi anteriormente estão agora com saldos de 30% a 50%, num esforço para limpar o inventário e criar espaço para a colecção seguinte.
Uma das razões por que a moda é um problema para o planeta é porque simplesmente consumimos demasiado. A indústria do vestuário produz mais de 150 mil milhões de peças por ano para apenas sete mil milhões de humanos.
Nos últimos 15 anos, a produção de vestuário duplicou, contudo o número médio de vezes que uma peça é vestida antes de ser descartada diminuiu 36%. Muitas peças são usadas apenas sete a 10 vezes antes de serem atiradas fora. Portanto, se a Zara se quer tornar mais sustentável, poderá ter de repensar o design das suas peças, e não apenas a forma como são produzidas.
OBJECTIVOS AMBICIOSOS
Para a Inditex, uma parte importante do plano é reformular os tecidos usados para as peças. Em 2025, compromete-se a garantir que todo o algodão, linho e poliéster usado na empresa seja orgânico, sustentável ou reciclado. A Inditex também promete investir no desenvolvimento de novas tecnologias de reciclagem.
A empresa já colabora com o MIT num projecto de 3,5 milhões de euros que procura novas formas de recuperar fibras de tecidos antigos usando uma energia limpa. A Inditex também começou a criar sistemas para recolher peças antigas, de forma a impedir que cheguem aos aterros. Em 2016, deu início à recolha de vestuário usado em 1382 lojas de 24 mercados e, em 2018, já tinha recolhido 34 158 toneladas.
Em 2017, criou um programa para recolher vestuário usado dos lares das pessoas ao entregarem encomendas online em Pequim e Xangai, e ao fim de um ano já recolhera mais de 850 mil peças de roupa só com esse programa. Para além destes planos relacionados com os materiais, a Inditex afirma estar a trabalhar para diminuir a poluição que faz.
A empresa irá acabar com todos os plásticos de uso único de todas as vendas até 2023 (o que engloba os sacos de plástico nas lojas e os finos sacos de plástico nas encomendas online). E tenciona passar 80% da sua energia para fontes renováveis nas lojas, centros logísticos e escritórios.
MANTER O RÁPIDO
Estes objectivos são louváveis, principalmente com uma empresa com tanto alcance e escala como a Inditex. O grupo tem 7490 lojas em 96 mercados de todo o mundo, empregando 174 mil pessoas de 154 nacionalidades. Tornar mais sustentável todas as partes do negócio pode levar a enormes diminuições na poluição por carbono e plástico.
Mas em nenhum dos seus anúncios a Inditex abordou o volume de vestuário que produz, ou o modelo de vender peças na moda a uma fracção do preço das marcas de designers. Na verdade, está a trabalhar para um maior crescimento. Nos últimos cinco anos, as suas vendas cresceram entre 4% e 10% todos os anos. Embora seja boas notícias para os accionistas, é uma má notícia para o planeta.
Por muito ecológica que a cadeia de abastecimento se torne, produzir mais e mais vestuário tem um custo ambiental. Na realidade toda a cadeia de abastecimento está feita para imitar a última tendência, e a natureza da moda torna-a rapidamente obsoleta. Graças à sua logística ágil, os clientes podem entrar uma Zara em Tóquio e perguntar de têm casacos camuflados.
Se o gerente da loja ouve o mesmo pedido uma série de vezes, pode enviar uma mensagem para os designers da empresa. Ao fim de umas semanas, um novo carregamento de casacos camuflados chega ao mercado japonês, respondendo assim a uma microtendência japonesa. Este tipo de agilidade é um dos pontos fortes da Zara – e da Inditex.
Mas neste momento, está a ser usado para criar novos estilos que podem estar fora de moda daqui a umas semanas ou meses. E isto contribui para o excesso de consumo. A abordagem mais ecológica seria criar peças duráveis e clássicas que o cliente usaria durante anos até serem enviadas para reciclagem.
A Zara já cria algumas peças que encaixam nesta descrição na sua linha Básicos, e podia expandir esta parte da colecção. E podia aproveitar a sua cadeia de abastecimento ágil para começar a fazer peças a pedido, para que nunca tivesse de reduzir o preço. A Zara ajudou a criar a tendência da moda rápida. Tem também poder para acabar com ela e inventar um modelo de negócio novo para a indústria da moda.