As finanças públicas devem ser mais sustentáveis ou as famílias vão pagar mais impostos, alerta Gulbenkian
As famílias podem ser obrigadas, futuramente, a pagar mais impostos e a usufruir menos de serviços públicos, caso as finanças não sejam sustentáveis, ou, em alternativa, o défice pode tornar-se permanente, segundo um estudo promovido pela Gulbenkian.
“verificámos que o excedente primário observado atualmente depende da presente estrutura etária da população. Tudo o resto constante, as tendências demográficas projetadas transformá-lo-iam num grande – e permanente – défice em poucas décadas, pondo a sustentabilidade orçamental em xeque”, revela o estudo “Finanças Públicas: uma perspetiva intergeracional”.
Segundo esta análise, seria necessário um aumento de 22% das receitas para restaurar a sustentabilidade, caso não se verificasse uma alteração aos “perfis etários orçamentais”.
Assim, a recuperação da sustentabilidade está dependente de mudanças “na dinâmica da população” ou de um “redimensionamento das receitas e despesas”.
O impacto do envelhecimento nas finanças públicas poderá levar a que as famílias tenham de pagar mais impostos, receber menos benefícios, usufruir menos de serviços públicos ou o défice pode tornar-se permanente dentro e alguns anos.
Os dados hoje divulgados apontam que na infância (0-10 anos), as gerações mais recentes foram recebendo benefícios sucessivamente inferiores de, nomeadamente, 69.000 euros considerando um indivíduo médio nascido em 1997, 67.000 euros em 2002 e 62.000 em 2007.
Por sua vez, no meio da vida (40-50 anos), as gerações pagaram mais impostos e receberam menos benefícios.
Por ano de nascimento, em 1957 verificaram-se 57.000 euros em benefícios e 139.000 em impostos, enquanto em 1962 os benefícios ficaram inalterados, mas os impostos avançaram para 141.000 euros.
Já em 1967, os benefícios recuaram para 52.000 euros e os impostos agravaram-se para 142.000 euros.
No caso da reforma (70-80 anos), os benefícios foram superiores aos impostos.
Para os nascidos em 1927 contabilizaram-se 125.000 euros de benefícios e 55.000 euros de impostos, enquanto para os nascidos em 1932, os benefícios foram de 151.000 euros e os impostos de 51.000 euros.
Os nascidos em 1937 contabilizaram 167 milhares de euros em benefícios e 67 milhares de euros em impostos.
A dinâmica da população projetada em Portugal entre 2018 e 2100 antecipa, por seu turno, uma “clara mudança” na estrutura, passando a maior concentração de indivíduos com idades entre os 35 e 60 anos para, no final do século, os 60 e os 85 anos.
Já no que concerne às consequências das alterações demográficas nas finanças públicas, o estudo apontou que em 2017, as receitas totais “eram suficientes para liquidar a despesa total e gerar um pequeno excedente primário” (1.300 milhões de euros).
Contudo, a alteração demográfica projetada “sugere que o excedente primário relacionado com a estrutura etária passará a apresentar um défice em cerca de 2030”.
A recuperação do saldo primário só será possível com um decréscimo na população a uma alteração na proporção de adultos.
“O presente perfil etário de despesas e receitas indica que as tendências demográficas projetadas reduziriam o atual excedente primário, atingindo um elevado défice em poucas décadas. Esse défice seria permanente tendo em conta a tendência de baixa fecundidade e aumento da esperança de vida”, vincou.
O estudo incluiu ainda uma análise de cenários alternativos, que concluiu que nem o crescimento económico, aumento da imigração ou a redução das pensões podem assegurar a sustentabilidade, sem gerar desigualdades entre gerações.
No caso das políticas de imigração, a médio prazo, a população em idade ativa que contribui com mais impostos pode crescer, mas, mais tarde, acabará por envelhecer e aumentar o montante dos benefícios.
“Vemos a emigração como uma margem difícil de controlar: se as pessoas têm acesso a melhores oportunidades no estrangeiro, têm a liberdade de partir. A imigração, pelo contrário, pode constituir uma margem relevante”, notou.
A redução das pensões ou o aumento da idade de reforma implica uma descida nas transferências para os reformados, mas pode levar a desigualdades entre as gerações, caso não se verifique uma redução nas contribuições.
O crescimento económico, por sua vez, é referido como incompatível com o perfil etários dos benefícios e impostos.
O estudo, promovido pela Gulbenkian com uma revisão de Ricardo Reis da London School of Economics, inclui análises de Francesco Franco (Nova SBE), Tiago Bernardino (Nova SBE e IPP) e Luís Teles Morais (Nova SBE e IPP).
Para a realização desta análise foram considerados cenários, por exemplo, de crescimento económico, imigração, diminuição de pensões, esperança média de vida, bem como as taxas de natalidade e de fecundidade.
Este estudo, que se baseia na metodologia “contabilidade geracional”, inclui ainda dados do Eurostat, Comissão Europeia, AMECO e outras instituições.