MIT: Os prós e contras do “crescimento”

A parceria entre a Executive Digest e o MIT tem o apoio


A obsessão pelo crescimento económico é um cancro na sociedade que está a corroer o nosso planeta, os seus recursos naturais e a tornar o planeta inviável para a humanidade.

Qual das visões é a verdadeira? É uma questão complicada, mas que precisamos de abordar num mundo que enfrenta desafios existenciais como alterações climáticas, desigualdade e pressão sobre os recursos. Primeiro, o lado positivo do crescimento. É inegável que a expansão económica aumentou o bem-estar da humanidade. O magnífico livro “Factfulness”, do falecido Hans Rosling mostra o progresso que fizemos na redução da miséria humana. Hans Rosling aponta que, em 1997, 42% das pessoas na Índia e na China viviam numa pobreza extrema e esmagadora (ou seja, com cerca de menos de 1,8 euros por dia de rendimento). Em apenas 20 anos, a Índia reduziu essa percentagem para 12% e a China para uns incríveis 0,7%.

Cerca de 750 milhões de pessoas saíram da pobreza – a maior melhoria no bem-estar humano na história, tudo possível graças a um rápido crescimento económico. E agora, com cerca de mil milhões de pessoas ainda no fundo e dois a três mil milhões a sobreviverem com pouco mais que isso (com menos de sete euros por dia), precisamos de ainda mais crescimento. Mais utilização de energia, mais materiais de todos os tipos, mais químicos, mais alimentos, mais, mais, mais.

Mas o que se torna evidente é que a nossa economia não pode continuar a consumir recursos e carbono à velocidade que o está a fazer se queremos continuar a ter um planeta habitável. A forma como aqui chegámos está a matar-nos. Portanto existe uma tensão entre o crescimento que quase todas as economias e empresas procuram e os limites do planeta de que dependemos.

A FORTUNE COMEÇA A REDEFINIR O QUE É O SUCESSO

Vi esta tensão numa edição da revista Fortune, que foi o que me fez pensar nisto tudo de novo. A Fortune há muito que usa as suas famosas listas para celebrar empresas por serem as maiores, as que cresceram mais depressa, as mais inovadoras, as mais admiradas e as melhores para trabalhar.

Contudo, a sua última lista é ligeiramente diferente. Trabalhando com a BCG, a revista desenvolveu a Future 50 na sua terceira iteração anual, ao avaliar mil empresas gigantes segundo “factores que assinalam potencial para crescimento a longo prazo”.

A mensagem pode indicar que o sucesso significa crescimento. Porém, a metodologia usada para escolher as 50 incluía alguma forma de empenho na sustentabilidade. E a Fortune terminou a edição especial com um longo artigo sobre a Swiss Re, uma gigante dos seguros, que tenta sobreviver aos custos ascendentes de vender seguros num mundo que enfrenta uma crise climática.

Ou seja, até o maior nome das listas empresariais que celebram o tamanho parece estar a lidar com uma tensão fundamental de que é mais difícil definir o “sucesso” de um negócio mediante apenas o tamanho ou a expansão, quando o crescimento obtido do modo tradicional significa que continuamos a caminhar para a dor partilhada e a devastação. Estamos mais perto de perguntar se o “crescimento” é efectivamente o objectivo certo para um negócio. Ou talvez a pergunta certa seja: “Que tipo de crescimento devemos procurar e celebrar em economias e empresas?”

CELEBRAR PRÁTICAS RENOVÁVEIS, CIRCULARES E REGENERATIVAS

Mais uma vez, não existe um mundo próspero para 10 mil milhões de pessoas sem se aumentar a utilização de matérias e alimentos por um lado, ou sem um clima relativamente estável por outro lado. Por isso, temos de “crescer” de outra forma. De maneira geral, sabemos como é uma economia restringida pelo carbono. Energia renovável nas redes, edifícios e transportes; sistemas circulares para o fluxo de quase todos os materiais, por isso é feito a partir de material renovável ou reciclado e pode ser reutilizado tantas vezes como possível; práticas regenerativas, principalmente na agricultura, que ajudam a restaurar os danos e captar carbono em grandes quantidades; e sistemas económicos e humanos inteiros feitos para a justiça e para a igualdade de oportunidades – ou o pilar e suporte humano acabará por ruir.

Ou seja, em teoria, estamos perante a quadratura do círculo. As práticas novas e fundamentadas permitem o crescimento do tipo certo de negócio – o que produz bens e serviços de formas renováveis, circulares e regenerativas e, claro, o que cria uma economia limpa. Alguns líderes estão a referir estas questões e a questionar o consumo sem limites. Eileen Fisher, CEO da empresa norte-americana de vestuário com o seu nome, afirmou recentemente: «Talvez não tenhamos de vender tanta roupa.» Ou o exemplo da Patagonia, a marca de produtos para actividades ao ar livre, que há muito questiona o consumo. A empresa lidera há anos os esforços pela sustentabilidade, e com boas razões, tendo em conta a sua gama de iniciativas e acções para reduzir o seu carbono e o uso de materiais.

Em 2011, passou a sua famosa publicidade “Não comprem este casaco” na Black Friday, que encorajava os clientes a comprarem apenas o necessário. E apoiou esta visão através da abordagem invulgar de ensinar aos clientes como remendar as suas peças de roupa. Segundo a minha experiência a falar com o fundador Yvon Chouinard, e com outros líderes da Patagonia, a perspectiva anticonsumo é real. E, contudo, quadruplicou as suas vendas desde que pediu às pessoas para pararem de comprar alguns dos seus produtos.

Parece uma contradição, mas não é. Queremos que as melhores empresas ganhem, e ganhem depressa. Queremos que definam o ritmo e mostrem como se pensa de forma diferente. No caso da Patagonia, está a funcionar. A empresa já não é descartada como uma organização privada que só pensa na sua missão e tem um modelo que não se aplica às grandes empresas cotadas em bolsa. Há uma década, segundo o The Wall Street Journal, que «mega-empresas como Walmart, Levi Strauss e Nike seguem as pegadas [da Patagonia]». É um bom ponto de partida, mas e se os enormes desafios que enfrentamos exigem perguntas mais heréticas? E se as empresas deixarem de ver o lucro como principal objectivo? Está na altura certa, já que as grandes estão a começar a questionar a sabedoria de se dar primazia aos accionistas. Está na hora de desafiar o status quo.

E se não estivéssemos tão interessados no lucro e mais na qualidade, na experiência, no empenho e reconhecimento dos colaboradores e no bem-estar geral? Se as empresas puderem dar a si próprias espaço para respirarem da obsessão pelo desempenho financeiro e permitirem inovação real em tudo o que fazem, veremos maiores mudanças. E à medida que os líderes abraçam materiais e energias renováveis, modelos circulares e e práticas regenerativas, os lucros surgirão.

Os enormes desafios que enfrentamos forçam-nos a seguir por trajectos diferentes enquanto chegamos aos limites do planeta. E as melhores empresas que adoptarem novas estratégias continuarão a ver grandes lucros.

 

Copyright © Massachusetts Institute of Technology, 2020. Todos os direitos reservados. Distribuído por Tribune Content Agency LLC. Traduzido e publicado com autorização.

 

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 168 de Março de 2020

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