Massachusetts Institute of Technology: Como os colaboradores da AT&T transformaram as queixas em 212 Milhões de Euros poupados

Este termo é exclusivo da AT&T, mas o desafio de liderança não é: um pingo de chuva é uma política irritante, um processo desactualizado ou uma ferramenta que já não é útil — qualquer coisa que o atrapalhe em vez de o ajudar a si e à sua organização a avançar. Uma ou duas destas coisas podem ser aborrecidas, mas suportáveis; no entanto, se juntarmos um número suficiente delas, um dia de trabalho pode fazer com que as pessoas se sintam como se estivessem a afogar-se em burocracia. Cada pingo de chuva desperdiça tempo, energia e/ou dinheiro.

Durante os últimos três anos e meio, a correcção ou eliminação desses pingos de chuva permitiu poupar 3,6 milhões de horas e ajudou a empresa a evitar mais de 212 milhões de euros em custos — não é um mau retorno, pode dizer-se, de uma análise de questões tão pequenas como uma despesa de 7,5 euros.

Uma vez que ninguém decide criar burocracias e ninguém quer trabalhar nelas, porque é que elas são tão comuns? Para a AT&T, a resposta remonta a 1885, quando a empresa foi fundada — uma altura em que a bandeira dos EUA tinha apenas 38 estrelas, a lâmpada era um produto novo e Mark Twain acabara de publicar “As Aventuras de Huckleberry Finn”. Junte essa história e a ideia de tradição que ela gera com uma cautela natural — a AT&T opera em sectores críticos e altamente regulamentados, como banda larga e wireless — e é fácil ver como os sistemas e as políticas podem acumular-se e permanecer sem contestação por décadas.

COMO NASCEU O PROJECTO PINGOS DE CHUVA

Três forças inspiraram-nos a agir. Primeiro, um inquérito anual aos colaboradores revelou uma profunda frustração com as ferramentas, processos e sistemas da empresa. Depois, a COVID-19 desafiou-nos a encontrar formas de trabalhar de forma diferente e mais eficiente. Paralelamente, foi lançada uma iniciativa a nível da empresa, que ajudei a liderar, para consolidar e actualizar os nossos sistemas e rede e melhorar as ferramentas e experiências dos funcionários e clientes, utilizando menos aplicações, fornecedores e servidores, mas mais robustos. Em conjunto, isto significava que muito mais pessoas na AT&T estavam finalmente a perguntar: “Porque fazemos isto?” Muitas vezes, a resposta era “Porque é assim que sempre foi feito” ou “Na verdade, não sei”.

Foi assim que o Projecto Pingos de Chuva começou no Verão de 2020. Um pequeno grupo de funcionários criou o nome e ofereceu-se para liderar a iniciativa. Eu falava com eles ocasionalmente para ver como podia ajudar.

O que começou com apenas um endereço de email e um pedido de apresentação de propostas rapidamente ganhou força. Começámos por convidar os funcionários a apresentarem as suas ideias. Os directores e os líderes divulgaram o convite em emails, mensagens e reuniões, ajudando a gerar um conjunto de ideias para a equipa trabalhar.

A primeira sugestão, por exemplo, levou-nos a repensar e simplificar como damos às pessoas acesso a determinados sistemas. Desde então, a equipa já deu seguimento a mais de 270 sugestões de crowdsourcing, o que não só nos tornou mais eficientes, como também criou um sentido de responsabilidade partilhado para alcançar melhores resultados. Uma das alterações mais populares foi a substituição de um sistema de rede privada virtual (VPN) que desligava os utilizadores durante o dia de trabalho. A solução: uma VPN igualmente segura, mas que exigia logins menos frequentes para os funcionários. Outro favorito do público foi deixar de exigir que os funcionários documentassem todas as presenças em determinados eventos e festas da empresa, como festas de despedida por reforma ou almoços de equipa, quando preenchiam os relatórios de despesas. Outras melhorias incluem a aprovação automática de qualquer despesa pequena, evitando a necessidade de aprovação do supervisor, e o envio de novos crachás directamente aos funcionários em vez de aos seus gestores.

A equipa que gere o Projecto Pingos de Chuva cresceu para seis funcionários a tempo inteiro na organização CTO, e o programa tem uma página na intranet da empresa. Mas a abordagem básica e a natureza colaborativa permanecem as mesmas: um colaborador envia um pedido. Este é revisto rapidamente e depois analisado. Já abordámos algo deste género? O que seria necessário para resolver o problema? Quais são as potenciais poupanças? Existem riscos de conformidade, auditoria, legais ou de segurança? Se avançarmos — o que fizemos na grande maioria dos casos — a equipa colabora com o funcionário que apresentou a ideia, em conjunto com os líderes de toda a empresa, para chegar a acordo sobre um orçamento e um calendário e definir um resultado bem-sucedido.

Os colaboradores que “reformam” um pingo de chuva tornam-se celebridades. Os seus nomes são adicionados a uma parede da fama — nomes que agora abrangem praticamente todos os departamentos e níveis da empresa. Enviamos um breve email pela cadeia hierárquica para que todos os seus chefes celebrem o seu contributo. O nosso CEO fala sobre estas melhorias com verdadeiro orgulho. Uma hashtag popular na empresa é #StopTheFlood.

A ABORDAGEM: TRÊS CHAVES PARA O SUCESSO

Três atributos simples em particular posicionaram o Projecto Pingo de Chuva para o sucesso e continuarão a moldar o nosso foco. Acredito serem replicáveis em muitas outras empresas e noutros sectores.

1 – Informal desde a sua concepção. Muitas grandes ideias são sufocadas por camadas de aprovação e trabalho. Tudo o que é realmente necessário para avançar é a vontade de pedir ideias às pessoas, ouvir o que elas dizem e, em seguida, dar-lhes poder para resolverem os problemas. Deve haver uma sensação clara, desde o início, de que se trata de um esforço genuíno e de que as sugestões conduzem à mudança.

Mantemos o processo tão simplificado quanto possível. Há um formulário inicial simples para preencher, seguido de uma conversa em directo com o remetente. A equipa de admissão do Projecto Pingos de Chuva tem de avaliar se a ideia é duplicada, legal, possível, etc., antes de poder avançar como um pingo de chuva oficial. Uma vez considerada oficial, a ideia é atribuída à pessoa da Equipa de Soluções Pingo de Chuva que é especialista no assunto para essa área de negócio. Demos poder a essa equipa para conceber a melhor solução — quer envolva a criação de uma nova capacidade ou a eliminação de um obstáculo actual — e para a implementar o mais rapidamente possível. A liderança executiva só é necessária nos raros casos em que a ideia implica um financiamento especial.

O objectivo final: manter o projecto simples — tornando a mudança livre de atritos e garantindo que não criamos inadvertidamente novos pingos de chuva no processo.

2 – Impulsionado pelos funcionários, para os funcionários. O projecto tornou-se viral na AT&T porque respondia a problemas reais e proporcionava benefícios imediatos. Foi isso que inspirou as pessoas a participar. Não foram os líderes que colocaram uma exigência aos colaboradores (“Apresentem formas de sermos mais eficientes”); não foram os consultores que apresentaram estratégias de racionalização. Foi um convite aos colaboradores para melhorarem a sua vida profissional e resolverem problemas que os atrasavam ou a incomodavam.

Continuamos a promover o programa internamente, para que mais pessoas, principalmente os novos funcionários, o conheçam e se sintam capacitados para contribuir. Até agora, descobrimos que as pessoas que apresentam mais ideias tendem a ser aquelas que já estão na AT&T há algum tempo. No entanto, os novos funcionários chegam com uma nova perspectiva e podem ver as oportunidades de melhoria de forma ainda mais evidente, pelo que também queremos ouvir a sua opinião.

3 – Apoio do topo. A eliminação de alguns pingos de chuva exigiu investimentos, enquanto outras correcções envolveram mudanças de políticas. Os funcionários que sugerem estas alterações e a equipa que ajuda a implementá- las precisam do apoio da liderança para essas decisões. Se, por exemplo, sugerirmos ajustar como a empresa analisa as pequenas despesas, precisaremos de recursos para criar uma solução melhor, como a utilização de IA para detectar fraudes em vez de efectuar verificações manuais. Os líderes têm de tomar essas decisões.

O PEQUENO RAPIDAMENTE SE TORNA GRANDE

Duas lições em particular destacam-se do projecto até agora. A primeira é que a tecnologia actual altera fundamentalmente a escala e a velocidade de um projecto como este. Os avanços recentes, nomeadamente os saltos na aprendizagem automática e na inteligência artificial, permitem-nos imaginar o que era inimaginável há um ou dois anos.

A segunda lição é que o pequeno rapidamente se torna grande. O poder cumulativo de pequenas mudanças é notável. Os resultados do Projecto Pingos de Chuva reflectem isso mesmo: muitos pingos pequenos tornam-se numa inundação, e pequenas mudanças nos processos podem tornar-se numa transformação empresarial. Em última análise, queremos concentrar-nos em passar da “reforma dos pingos de chuva” para a “resolução de tsunamis” — por outras palavras, olhar para as áreas onde estes pingos de chuva se juntaram e ver que temas e oportunidades de maior dimensão emergem — e os investimentos que podemos fazer para desenvolver os progressos que fizemos.

Há outro aspecto desta ideia, que James Clear aborda em “Hábitos Atómicos”, um livro que se manteve na lista de bestsellers do New York Times durante mais de quatro anos. «Quanto mais se repete um comportamento, mais se reforça a identidade associada a esse comportamento», escreve. «De facto, a palavra identidade deriva originalmente das palavras latinas “essentitas”, que significa “ser”, e “identidem”, que significa “repetidamente”. A sua identidade é literalmente o seu “ser repetido”.»

Eu diria que o retorno mais valioso do Projecto Pingos de Chuva é o mais difícil de quantificar: o seu efeito na forma como os nossos funcionários se vêem a si próprios e à nossa empresa. Podemos dizer aos membros da nossa equipa durante todo o dia que os valorizamos e que queremos que se destaquem, mas se desperdiçarmos o seu tempo e ignorarmos as suas ideias, eles receberão uma mensagem muito diferente. Actualmente, todas as empresas querem ser inovadoras e criativas e empregar pessoas motivadas. Que melhor forma de o fazer do que capacitá-las para se moverem mais rapidamente, assumirem o domínio das suas áreas de especialização e minimizarem os obstáculos para que se possam concentrar na obtenção de grandes resultados.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 217 de Abril de 2024

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