Randstad: Transformação do modelo de negócio

As empresas apostaram numa transformação do modelo de negócio, que passaram essencialmente pela aposta em vectores que impactam diretamente o produto como qualidade, design e criatividade, mas também a gestão do negócio como a aposta em inovação, flexibilidade e tecnologia. Em entrevista à Executive Digest, David Ferreira, Diretor de Staffing & Inhouse da Randstad Portugal, explica como está a evoluir o sector do têxtil e do calçado em Portugal, mas também traça o retrato da área dos recursos humanos para 2023.

Na vossa opinião, qual é a importância do sector têxtil e do calçado para a economia portuguesa?
O sector têxtil e do calçado português tem um peso extremamente importante na economia do país e registou profundas transformações nas últimas décadas. Depois de décadas de crescimento ininterrupto, sofre um abrandamento forçado pela pandemia, que desafia a forma como o sector se tem vindo a desenvolver até aqui. As boas notícias é que volta a mostrar sinais de crescimento neste último ano. Para além disto, é importante salientar que o sector lida com uma elevada concorrência nos mercados internacionais, o que demonstra a relevância e impacto que o sector tem.

Actualmente, consideram que a indústria têxtil e do calçado é atractiva para os trabalhadores portugueses em busca de oportunidades de emprego?
Este sector é caracterizado por uma elevada instabilidade, e isto levou à reinvenção da forma como conduzem o negócio. As empresas apostaram numa transformação do modelo de negócio, que passaram essencialmente pela aposta em vectores que impactam diretamente o produto como qualidade, design e criatividade, mas também a gestão do negócio como a aposta em inovação, flexibilidade e tecnologia. Estes são ingredientes que compõem a forte estratégia de atracção e retenção de talento do sector e que respondem às expectativas do talento dentro de uma faixa etária mais nova no mercado de trabalho.

O recrutamento de recursos humanos qualificados nestas áreas tem sido um desafio?
O desafio de recrutamento é generalizado em todo o mercado de trabalho e não necessariamente deste ou daquele sector. É preciso então olhar mais profundamente para o tema da atracção e sobretudo garantir a retenção dos profissionais qualificados.
É imprescindível estabelecer e implementar políticas de employer branding, não só porque são importantes para as equipas que já fazem parte da estrutura das organizações, mas também para os candidatos que queremos atrair e recrutar. A importância do candidate experience e do employer branding devem estar alinhados, por forma a darem ao candidato uma visão autêntica da organização, da sua cultura, valores e práticas. Aliado a isto estão também as diferentes expectativas e necessidades das várias gerações no mercado de trabalho (Geração X, Geração Y e Geração Z), que necessitam de ser devidamente enquadradas para garantir retenção, toldando constante atracção.

Ao nível do recrutamento, quais as vossas perspectivas para estas áreas ao longo de 2023?
2023 tem se mostrado desafiante em temas como escassez de talento e com um cenário socioeconómico impactante. Acreditamos que haverá uma estabilização nesta área nos próximos meses ao nível da contratação, pois os sinais económicos de abrandamento, inflação e confiança impactam gravemente esta área. No entanto é uma tendência que deverá ser acompanhada como em qualquer outro sector.

Como se podem tornar as empresas destes sectores mais atractivas para recrutarem colaboradores?
Se olharmos para o passado, estávamos muito focados em pilares mais tradicionais como o salário, a chefia, o ambiente de trabalho e a distância.
São vários desafios, mas sentimos um realinhamento das áreas de recursos humanos, com um novo mindset, muito voltado para cultura, proposta de valor e modelo de trabalho. É necessário garantir e reforçar a cultura da organização. Esta essência tem que ser passada aos colaboradores, através de ferramentas e momentos que permitam aos colaboradores nutrir sentimentos de pertença, propósito, união e sentido de compromisso para com a missão da empresa. Isto só é possível, quando dedicamos tempo a conhecer os nossos colaboradores, a identificar quais as suas necessidades e a implementar medidas que vão ao encontro daquilo que são as necessidades da empresa com as necessidades das suas pessoas. Os elementos de liderança de uma organização têm um papel vital na condução das mudanças, garantindo o compromisso, motivação e coesão das suas equipas. Outro grande desafio prende-se com o bem-estar físico e psicológico dos colaboradores. Um dos grandes desafios que temos pela frente é continuar a promover programas que possam apoiar os colaboradores, trabalhar no sentido de desenvolver uma rede de benefícios, parcerias e programas que promovam o bem-estar físico e mental. O bem-estar não é um tema novo para a área dos RH, mas até à data ainda não tínhamos lidado com cenários pós-pandémicos onde a fragilidade das pessoas se transparece cada vez, e as necessidades precisam de abordagem cada vez mais única e holística. Isto é obviamente um desafio grande não só para os recursos humanos, mas também para os líderes de equipa que devem actuar como coach e apoiar as suas equipas na sua melhora e desenvolvimento profissional (e por vezes pessoal).

Para formar alguém na área da tricotagem, tinturaria, da confecção, é necessário um investimento grande. Como é que as empresas portuguesas devem reter o talento nestas áreas?
Falamos do setor têxtil e de calçado, mas a verdade é que poderíamos estar a falar de qualquer sector quando o desafio é retenção. A aposta nos profissionais e naquilo que mais esperam dos empregadores é essencial, com uma estratégia de employer branding forte e reforçada com os critérios mais atractivos para os trabalhadores.
A aposta na formação, progressão de carreira e práticas de conciliação entre a vida pessoal e profissional são os valores com maior prioridade para os profissionais, como vemos em estudos como o Workmonitor de 2023 e o Randstad Employer Brand Research dos últimos dois anos.

O que se pode fazer para chamar os jovens portugueses para a área têxtil?
Como em qualquer organização, o desafio em atrair a geração Z para as empresas está presente e por isso as lideranças devem cada vez mais entender o que as diferentes gerações procuram num empregador e incorporar nas suas estratégias de atracção de talento. Vemos por exemplo um alinhamento com valores de diversidade, inclusão e sustentabilidade que são fundamentais para o talento mais jovem, assim como a valorização da formação e progressão de carreira. Se procuramos talento jovem devemos ouvir o que a geração espera do mundo do trabalho e perceber como é que no final do dia empresas e profissionais jovens podem ter o melhor dos dois mundos e contribuir para o sucesso do sector.

Este artigo faz parte do Caderno Especial “Indústria – Têxteis e Calçado”, publicado na edição de Maio (n.º 206) da Executive Digest.

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