JMJ: “Tenho umas multazinhas que gostava que fossem apanhadas pela amnistia”, afirma bispo D. Américo Aguiar
O tema da amnistia a jovens, no âmbito da vinda do Papa Francisco a Lisboa na Jornada Mundial da Juventude, tem gerado polémica, por ter limite de idade até aos 30 anos.
Esta terça-feira, no Parlamento, o Governo admitiu estar disponível para fazer mudanças à proposta inicial apresentada e também D. Américo Aguiar, bispo auxiliar de Lisboa, acabou por admitir que seria positivo que o perdão concedido não dependesse da idade.
“Vou fazer uma declaração de interesses. A mim era muito bom que não tivesse limitação de idade, porque tenho umas ‘multazinhas’ que gostava que fossem apanhadas pela amnistia. Estou a falar assim de coração aberto”, sustentou o bispo, que preside à JMJ.
D. Américo Aguiar apelou aos deputados para que se concentrem em que o essencial na questão da aplicação de amnistias a propósito da visita do Papa a Portugal “é o ato de misericórdia e perdão”.
“Não sou especialista nem constitucionalista, nem jurista, e não posso fazer comentários (…) Peço que não percam aquilo que é essencial, que é este gesto de misericórdia para com quem falhou na sua vida”, afirmou Américo Aguiar aos jornalistas, no final de uma visita a duas fábricas de mobiliário em Paredes, no distrito do Porto.
Segundo Américo Aguiar, aquando do anúncio de um perdão de um ano para todas as penas até oito anos de prisão e um regime de amnistia para algumas contraordenações, “o Papa ficou muitíssimo feliz com a possibilidade de associar à sua presença em Portugal na Jornada Mundial da Juventude (JMJ) um gesto de misericórdia e de perdão em relação aos jovens”.
Adiantando que pessoalmente não lhe “causa qualquer desconforto” que o perdão seja estendido a todas as idades, Américo Aguiar defendeu que o importante é “não matar a esperança” a quem falhou na vida.
“Se disser ao Santo Padre que é para todos, a [sua] alegria ainda será maior. Não percamos o que é essencial: a quem falhou não podemos matar a esperança”, afirmou.
Américo Aguiar reagia ao facto de existirem reservas sobre a constitucionalidade da restrição de idade (até aos 30 anos) para a aplicação do perdão de penas e amnistia de crimes e infrações a propósito da vinda do Papa a Portugal.
Na proposta de lei – debatida ontem no parlamento – está em causa um perdão de um ano para todas as penas até oito anos de prisão. Está ainda previsto um regime de amnistia para as contraordenações com coima máxima aplicável até 1.000 euros e as infrações penais cuja pena não seja superior a um ano de prisão ou 120 dias de pena de multa.
Para o bispo auxiliar de Lisboa, é preciso que todos os dirigentes partidários e responsáveis das bancadas parlamentares não matem a ideia do gesto de misericórdia, não se distraindo “no ruído que é preciso corrigir” e mantendo “o foco no que é essencial”.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) manifestou as “maiores reservas” sobre a constitucionalidade da restrição de idade para a aplicação do perdão de penas e amnistia de crimes e infrações a propósito da vinda do Papa a Portugal.
Segundo um parecer enviado à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, face à proposta do Governo no contexto da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o órgão de gestão e disciplina dos juízes assinalou que a aplicação da amnistia a jovens entre 16 e 30 anos que tenham praticado crimes e infrações previstos até 19 de junho “trata-se de uma discriminação (positiva) em função da idade, que não se mostra devidamente justificada”.
“A diferenciação de tratamento entre pessoas que praticaram idênticas infrações com base unicamente na idade que possuíam no momento da sua prática, ainda que amparada na faixa etária dos principais destinatários de um evento, suscita as maiores reservas quanto à sua conformidade constitucional”, pode ler-se no documento, que destaca que as jornadas “não são um valor constitucional que justifique a discriminação de pessoas”.
Apesar de reconhecer a liberdade das opções políticas para a elaboração do diploma, o CSM lembrou que essa discricionariedade “não é ilimitada” e que tem de respeitar os princípios constitucionalmente previstos.
A proposta de lei compreende exceções ao perdão e amnistia, não beneficiando, nomeadamente, quem tiver praticado crimes de homicídio, infanticídio, violência doméstica, maus-tratos, ofensa à integridade de física grave, mutilação genital feminina, ofensa à integridade física qualificada, casamento forçado, sequestro, contra a liberdade e autodeterminação sexual, extorsão, discriminação e incitamento ao ódio e à violência, tráfico de influência, branqueamento ou corrupção.