Massachusetts Institute of Technology: Bed bath & bancarrota: Lições para líderes seniores

A Bed Bath & Beyond (BB&B) declarou finalmente falência em 23 de Abril de 2023, após ter sobrevivido a uma experiência de quase morte no início do ano, graças a uma infusão de capital de última hora de um investidor oportunista. A rescisão desse acordo e a subsequente incapacidade de angariar capital suficiente através da emissão de novas acções e de outras técnicas de financiamento significaram que a empresa esgotara a capacidade de engenharia financeira criativa para se manter em actividade.
A estratégia focada nas finanças, iniciada por uma nova equipa de gestão instalada em 2019, acabou por não conseguir salvar a retalhista em dificuldades. Para diagnosticar por que razão a sua abordagem foi tão errada e que lições os líderes seniores deveriam aprender, inquirimos mais de 1600 clientes de retalho nos meses anteriores à declaração de falência da BB&B.
A história da BB&B é familiar: uma empresa inovadora tem um sucesso espectacular no mercado, mas não consegue responder adequadamente às mudanças no ambiente competitivo. Esta situação conduz a uma estagnação do crescimento, seguida de uma diminuição das receitas e de perdas operacionais. Os dirigentes recém-nomeados recorrem à engenharia financeira para impulsionarem o preço das acções, cortando muitos dos custos que criam o atractivo distintivo da empresa. Em última análise, a empresa é adquirida ou vai à falência.

A HISTÓRIA DE UMA MARCA DE RETALHO QUE FOI CONSAGRADA
A BB&B surgiu quando os seus fundadores detectaram a oportunidade de uma retalhista especializada conquistar quota de mercado aos grandes armazéns, oferecendo uma vasta selecção e experiência de compra que estes últimos não conseguiam igualar. As retalhistas que adoptaram o modelo, coloquialmente conhecidas como “campeãs das categorias”, tiveram um sucesso inicial espectacular em vários grupos de produtos, incluindo brinquedos na Toys “R” Us, electrodomésticos na Circuit City e equipamento desportivo na Sports Authority. Ao contrário das especializadas, a Bed ‘n Bath — o nome original quando a empresa foi lançada em 1971 — reconheceu que o seu apelo se baseava num tipo de experiência de compra e não na variedade de produtos das primeiras lojas. A empresa compreendeu que o apelo das marcas de design se estendia a várias categorias para além da roupa de cama, o que lhe permitiu criar uma experiência diferenciada, expandindo a sua selecção de produtos e aumentando a dimensão das lojas. Esta evolução levou à adopção em 1987 do novo nome da empresa, Bed Bath & Beyond.
A proposta de valor da Bed Bath & Beyond como um destino para itens que as pessoas nem sabiam que queriam foi reforçada por uma estratégia inovadora de cupões. Em vez de oferecerem um desconto num único artigo de grande procura (como era a norma entre as retalhistas na altura), os cupões da BB&B podiam ser aplicados a qualquer artigo, assegurando que os compradores sentiam que havia sempre a oportunidade de obter uma pechincha. Além disso, os gerentes das lojas tinham uma autonomia considerável sobre os produtos em stock, o que lhes permitia adaptar a sua variedade de produtos para agradar a mercados locais e garantir que cada loja representava uma experiência de compra única. “Nunca se sabe exactamente o que se vai encontrar na BB&B” foi uma das observações mais comuns entre os inquiridos.
As sementes dos problemas da BB&B foram plantadas na sua incapacidade de responder à ameaça emergente do comércio electrónico da Amazon e de outras retalhistas. Esta omissão coincidiu com a resposta competitiva de outras retalhistas tradicionais, nomeadamente a HomeGoods, a Target e a Costco: proporcionar uma experiência de compras que combinasse preços atractivos em bens de primeira necessidade (“gatilhos”, na terminologia da Costco) com a possibilidade de encontrar “tesouros” inesperados (também um termo da Costco).
As receitas da BB&B a 12 meses atingiram os 10,1 mil milhões de euros em Fevereiro de 2013, mas foram apenas ligeiramente superiores, atingindo os 11,1 mil milhões de euros, em Fevereiro de 2019, apesar de um aumento de 35% na abertura de novas lojas (de 1130 para 1530 espaços) e de um aumento proporcional do número de colaboradores (de 48 mil para 65 mil). Os resultados operacionais passaram de uns robustos 1,5 mil milhões de euros em Fevereiro de 2013 para um pequeno prejuízo em Fevereiro de 2019, desencadeando a substituição do CEO e a adopção de uma estratégia drástica pelo seu sucessor, um antigo executivo sénior da Target.

COMPREENDER A QUESTÃO CENTRAL: CRIAR VALOR PARA O CONSUMIDOR
O motor do sucesso empresarial sustentável é a criação de valor para o cliente. Um dos princípios fundamentais da liderança é que o valor deve ser criado antes de poder ser captado. Isto significa que é fundamental que os líderes compreendam o que impulsiona a sua relevância para os clientes e as causas daquilo que os distingue. No nosso artigo “Changing How We Think About Change”, descrevemos a adequação ao objectivo como uma forma de avaliar a dimensão do mercado que uma empresa pode servir, enquanto a vantagem relativa avalia a oportunidade de poder de fixação de preços e de margem. Para um sucesso sustentado, uma empresa precisa tanto de escala como de margem — e nenhuma delas deve ser procurada sem uma consideração explícita do seu impacto na outra.

A NOVA EQUIPA DE LIDERANÇA PODE DESCREVER A HISTÓRIA EM QUATRO ERAS:
• 1971 – 1985: A BB&B é pioneira no conceito de “campeã da categoria” em roupa de cama, estabelecendo uma adequação ao objectivo e uma vantagem relativa distintiva baseada numa vasta selecção e preços atractivos através da sua estratégia inovadora de cupões.
• 1985-2013: A BB&B continua a promover a adequação ao objectivo, expandindo-se para outras categorias de produtos e abrindo mais de 1100 novas lojas. Goza de uma vantagem relativa elevada, mas em declínio, à medida que outras retalhistas físicas (nomeadamente a HomeGoods, fundada em 1992) criam ofertas de lojas semelhantes em termos de concorrência. Entretanto, surgem alternativas online sob a forma da Amazon e de novas concorrentes (designadamente a Wayfair, fundada em 2002).
• 2013-2019: A BB&B quer maximizar a adequação ao objectivo através da abertura contínua de lojas, atingindo um total de mais de 1500 espaços em 2018, mas não consegue desenvolver uma presença online adequada. Parece ignorar a erosão da sua vantagem relativa devido ao aumento da concorrência física e online, que prejudica as suas margens de exploração.
• 2019: A pressão dos investidores participantes resulta na nomeação de uma nova equipa de gestão que goza de uma latitude considerável no que diz respeito às escolhas que poderia fazer em termos de adequação ao objectivo e de vantagem relativa.

Infelizmente, a nova equipa de gestão considerou as suas prioridades em termos estritamente financeiros e não em termos de optimização da adequação ao objectivo e da vantagem relativa da empresa. Assim, optaram por uma estratégia centrada sobretudo na redução de custos. Embora o encerramento de lojas com fraco desempenho fosse essencial, a equipa optou também por substituir os produtos de marca própria por marcas reconhecidas nacionalmente e reduziu drasticamente a distribuição dos populares cupões de desconto de 20% da retalhista. Estas últimas medidas (que sem dúvida pareciam sensatas de um ponto de vista puramente financeiro) resultaram na eliminação dos elementos que conferiam à BB&B o seu apelo distintivo no ambiente de retalho altamente competitivo. Ao mesmo tempo, não conseguiram resolver o problema da fraca presença da empresa na internet.
A equipa agravou estes erros estratégicos ao utilizar as receitas da venda de 185 mil metros quadrados do seu espaço de venda a retalho — envolvendo encerramentos adicionais para além das lojas com pior desempenho — para financiar um programa de recompra de acções. A redução do número de lojas fez com que a BB&B se tornasse menos acessível aos seus clientes e não dispusesse dos recursos necessários para responder à pandemia da COVID-19 tão eficazmente como as retalhistas que, de forma mais ágil, optaram pelas compras online e pelas estratégias de “compre online e levante na loja”. Consequentemente, a BB&B perdeu em grande parte a procura crescente de produtos para o lar durante a pandemia. Os comentários dos inquiridos no nosso inquérito incluíram “A Amazon tomou o seu lugar nas minhas necessidades de compras” e “Se não houvesse Wayfair, compraria [na BB&B] com mais frequência”.
Os líderes da empresa não compreenderam que o verdadeiro desafio estratégico consistia em restaurar a relevância da BB&B para os tipos de clientes que melhor podia servir (adequação ao objectivo) e encontrar formas de restabelecer a oportunidade de margem através da distinção (vantagem relativa). Desperdiçaram a oportunidade de reinvenção e, ao manterem o preço das acções através de recompras de acções, privaram a empresa dos recursos necessários para desenvolver a considerável base de clientela que criara.
O apoio temporário ao preço das acções foi proporcionado pelo estatuto da BB&B como uma das acções meme (acções que ganharam popularidade nas redes sociais) da pandemia. (A GameStop e a AMC beneficiaram igualmente de um apoio enorme de investidores amadores que, de forma célebre, causaram perdas aos vendedores a descoberto destas acções.) No entanto, a queda contínua do desempenho operacional e a pressão dos investidores resultaram na nomeação de novos dirigentes em Junho de 2022.
Mas era demasiado tarde para recuperar o negócio. Apesar de um programa de encerramento descomunal e contínuo de lojas e de grandes reduções de pessoal, em Fevereiro de 2023 a empresa estava a poucos dias de declarar falência — um destino que só evitou ao aceitar uma infusão de capital em condições onerosas.

SE PUDESSEM VOLTAR ATRÁS NO TEMPO QUE ESTRATÉGIA ADOPTAVAM?
A análise da adequação ao objectivo e da vantagem relativa poderia ter informado a liderança da BB&B sobre os tipos de compradores que a retalhista podia servir melhor. No nosso artigo “As Stores Reopen, Which Customers Are Most Likely to Return?”, identificámos cinco tipos principais de compradores. Em resumo, são eles:
• Funcional: “Penso nas compras como uma tarefa necessária.” • Táctil: “Gosto de ver e tocar nos produtos antes de os comprar.”
• Experiencial: “Gosto de tornar as compras sociais e agradáveis.”
• Relutante: “Prefiro evitar as lojas físicas e gosto da comodidade das compras online.”
• Recreativo: “Vejo as compras como uma desculpa para sair de casa.”

Usando esta estrutura para os mais de 1600 compradores que inquirimos, estabelecemos o tamanho dos cinco segmentos de compradores, a frequência com que cada segmento comprava na BB&B e as suas razões específicas para o fazer, conforme mostrado na tabela “Quem comprou na Bed Bath & Beyond e porquê”.
A nossa análise também nos permitiu identificar os factores que determinam a preferência geral dos compradores por diferentes retalhistas, conforme descrito na tabela “Os factores de compra em que as diferentes retalhistas se destacam”. Este nível de conhecimento teria ajudado a equipa de liderança da BB&B a compreender a base da vantagem relativa da empresa em comparação com outras retalhistas e os factores que tornaram a sua adequação à finalidade apelativa para segmentos específicos de compradores. Isto, por sua vez, teria permitido à direcção da empresa adoptar uma abordagem mais matizada da estratégia, envolvendo a redução de custos quando necessário, mas combinada com uma experimentação orientada para melhorar a experiência de compra dos clientes. Tal como a Bed ‘n Bath transitara para a Bed Bath & Beyond, uma inovação bem-sucedida poderia ter permitido à empresa restabelecer uma vantagem relativa sobre as suas concorrentes agressivas e preparar o terreno para outra era de crescimento.

REACÇÃO DOS CONSUMIDORES À NOVA BB&B
Pedimos aos inquiridos que avaliassem se a sua experiência de compras na BB&B mudara desde 2019 em sete dimensões. As nossas descobertas revelaram uma alta consciencialização — e forte resposta negativa do cliente — às medidas generalizadas de corte de custos da empresa. Cada um dos cinco tipos de compradores afirmou que a experiência de compra piorara em duas dimensões: preços dos produtos e selecção de marcas. Quatro dos cinco tipos de compradores consideraram que a experiência piorara em duas outras dimensões: a oportunidade de utilizar cupões e a capacidade de encontrar produtos para o lar.
Nas outras três dimensões — disposição da loja, experiência de navegação e compra de presentes — o panorama é mais matizado. Os compradores experienciais responderam favoravelmente às mudanças na disposição das lojas e à experiência de navegação daí resultante. O segmento táctil, no entanto, reagiu negativamente às mesmas mudanças, com comentários como “Voltem às disposições e preços pré-COVID”. Os compradores recreativos consideraram que a BB&B melhorou enquanto local para comprar presentes — uma opinião partilhada pelos compradores experienciais, mas contestada pelos compradores tácteis.
O mais revelador é que não houve nenhum aspecto da experiência de compra que os dois maiores segmentos de compradores — funcional e táctil, que representam em conjunto 57% do mercado — considerassem ter melhorado com as mudanças.
As nossas conclusões são um triste reflexo de como a estratégia seguida pela BB&B a partir de 2019 alienou os seus clientes fiéis. O resultado foi um negócio com menor adequação ao propósito devido ao encerramento de lojas e redução da selecção de produtos, e com vantagem relativa diminuída devido à insatisfação do comprador com preços mais altos, marcas menos desejáveis e menos oportunidade de uso de cupões.
Há duas lições de liderança importantes a retirar do percurso da BB&B até à falência. A primeira é que o motor do sucesso empresarial é a criação de valor para os clientes. A adequação ao objectivo e a vantagem relativa funcionam como indicadores principais, respectivamente, da capacidade de uma empresa para expandir o seu mercado-alvo e da sua capacidade para desenvolver o poder de fixação de preços com base na percepção do carácter distintivo.
A segunda lição é que os custos da empresa devem ser avaliados relativamente aos benefícios para o cliente que suportam. Os custos só são “maus” quando geram um benefício pelo qual o cliente não está disposto a pagar o preço estabelecido pela empresa. Em contrapartida, os custos são “bons” quando apoiam um benefício para o cliente pelo qual o potencial de volume e margem é economicamente atractivo. A gestão da Bed Bath & Beyond serve como advertência: a engenharia financeira não pode salvar uma empresa que não se concentra na criação de valor para os clientes.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 207 de Junho de 2023

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