O que esperar de 2024?: Armindo Monteiro, CIP

Testemunho de Armindo Monteiro, Presidente da CIP

1. Que alterações perspectiva que possam vir a impactar o seu sector em 2024?

Há várias incertezas neste novo ano, mais do que as habituais. As duas guerras em curso, o que acontecerá? Bem sei que hoje as economias e as pessoas demonstram uma enorme capacidade de adaptação à adversidade, mas estas duas guerras estão longe de estar resolvidas e os riscos geopolíticos são imensos. Para já, não há sinais de qualquer tipo de acordo entre os beligerantes, e as mortes e a destruição continuam. As imagens das ruínas do Afeganistão estão de volta, mas agora nas fronteiras da Europa e mesmo dentro da Europa. Esta catástrofe tem de acabar.

A este drama, junto, num plano completamente diferente, mas com fortíssimo impacto no nosso país, a situação política. Teremos dois actos eleitorais, pelo menos: legislativas e europeias. Ninguém sabe qual o quadro parlamentar que sairá das eleições de 10 de Março. Vai existir uma maioria com força para governar? Essa maioria será suficientemente estável e, mais do que isso, estará ciente de que o país precisa de rumo, decisões pensadas e sólidas que favoreçam a economia? Veremos, claro, mas as expectativas não são altas.

Faço uma última referência à inflação, para já controlada e a caminhar no bom sentido, que abre espaço para alguma redução das taxas de juro talvez para o fim do segundo semestre deste ano. As famílias estão em esforço máximo, as empresas também, os riscos para a coesão social são, por isso, evidentes. Os decisores do BCE terão de ter muita atenção ao que está a acontecer na economia real.

2. E para a sua empresa em particular, quais os maiores desafios?

Do ponto de vista da CIP – Confederação Empresarial de Portugal o maior desafio é convencer os decisores políticos e uma parte dos portugueses que só com crescimento económico é possível resolver o problema crónico dos baixos salários que persistem no nosso país. Ora bem, crescimento económico, como o vemos na CIP, não é apenas uma abstracção. Pensamos que é fundamental um crescimento assente cada vez mais em actividades de maior valor acrescentado, logo actividades mais produtivas, que se revelem capazes de alimentar uma melhoria sustentável e constante do nosso nível de vida colectivo. Como é que isso se faz? O primeiro passo é reconhecermos que temos um problema estrutural. Há uma grave falta de investimento no nosso país. Os sucessivos governos fazem vista grossa a este problema, embora gostem de proclamar que os salários devem todos subir. O nosso desafio para 2024 é deixarmos claro de uma vez por todas que melhores salários implicam, tem de implicar, maior produtividade. Melhores salários sem mais produtividade acaba sempre muito mal para todos, porque não é sustentável. As empresas e a economia acabam por não resistir e colapsam. Finalmente, o nosso desafio é também deixar claro de uma vez por todas que os empresários não querem uma economia de baixos salários. Queremos todos um país melhor, mais competitivo, mais coeso e mais internacionalizado e com menos desigualdade.

3. Atendendo ao actual contexto, que expectativas a nível macroeconómico para Portugal?

Todos os indicadores apontam para um fraco crescimento, talvez a rondar 1,5% do PIB. O nosso país está a travar desde o segundo semestre de 2023. O desemprego, embora se mantenha baixo, começou a subir no Verão e é provável que mantenha essa trajectória. Como já avisou o Banco de Portugal, se o desemprego aumentar isso significa que o último dique que nos aguenta cedeu e teremos problemas, até do ponto de vista da coesão social. Não é certo que aconteça o pior desfecho, e ainda bem, mas inquieta-me que os decisores façam de conta que não se passa nada e que está tudo bem. Não está, infelizmente. Podemos até evitar as piores consequências, mas o que não evitaremos é que vamos ter mais um ano a marcar passo. Faço notar que as empresas vão fazer o que puderem para contrariar as más notícias. Os empresários nunca ficam à espera sentados: temos muitas responsabilidades, salários a pagar, impostos a pagar, pagamentos a fornecedores. Não podemos parar.

Testemunho publicado na revista Executive Digest nº 214 de Janeiro de 2024

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