Randstad Insight: Ultrapassar obstáculos nas STEM

Apesar de se continuar a alimentar o debate sobre a falta de competências nas stem (ciências, tecnologia, engenharia e matemática), ainda se mantém por debater a falta de um número mais alargado de mulheres nestas carreiras.

Segundo o Gabinete de Estatísticas Laborais dos EUA, as mulheres perfazem 47% de toda a força de trabalho norte-americana e 60% das licenciaturas, mas ocupam apenas 25% de todos os cargos na Informática e na Matemática. O número desce para 15% na Arquitectura e na Engenharia.

Ao mesmo tempo, o Departamento do Comércio e o Gabinete de Estatísticas Laborais esperam um crescimento nos empregos STEM. O Departamento do Comércio prevê que a abertura de cargos STEM crescerá 17% em 2018, muito mais depressa do que a maioria das restantes carreiras, enquanto o Gabinete de Estatísticas Laborais reporta que será criado um milhão de empregos STEM em 2022.

A IMPORTÂNCIA DE UMA INTERVENÇÃO PRECOCE

Ainda que a solução para a falta de mulheres nas STEM seja multifacetada, tudo começa na experiência do jardim- -de-infância até ao 12.º ano.

Conforme revela o estudo da Randstad, os alunos destas fases iniciais têm muito interesse e curiosidade pelas profissionais relacionadas com as áreas STEM.

Na verdade, para muitos alunos do pós-secundário que procuram profissões STEM, a decisão de estudar nestas áreas começa muito antes de se chegar à universidade. Quase quatro em cada cinco estudantes universitários STEM (78%) afirmam ter decidido estudar STEM no secundário ou antes disso, e um em cada cinco (21%) decidiram no segundo ciclo ou antes.

Os resultados não surpreendem Susan Brennan, chief operations officer da Bloom Energy, que trabalhou durante muitos anos para encorajar jovens raparigas a entrarem nas áreas STEM. «Creio que o segundo ciclo é o ponto decisivo para a maioria das raparigas», afirma Susan Brennan. «Se não tiverem decidido nessa altura, já as perdemos. Como país, não nos concentramos o suficiente na educação e nesses importantes anos.»

O mais interessante talvez seja a prova de que o interesse nas profissões começa a diminuir quando os jovens ficam mais velhos. O estudo da Randstad descobriu que os jovens entre os 11 e os 14 anos têm 18% mais probabilidade do que os alunos entre os 15 e os 17 anos de idade de considerarem a Matemática a sua disciplina preferida.

REFORMULAR, OU NÃO, AS STEM ?

Um tema comum entre a pesquisa da Randstad e as informações dos especialistas é a necessidade de alterar a forma como olhamos para as STEM. Actualmente, as profissões STEM são vistas de forma limitada – cientistas, colaboradores de TI, engenheiros e matemáticos. Contudo, quando alargamos as possibilidades e olhamos para competências específicas, e não para cargos, a verdadeira escala desta lacuna nas competências torna-se ainda mais evidente.

Uma vasta gama de competências STEM – da estatística ao desenvolvimento de software – tornou-se essencial para empregos que nunca seriam considerados STEM no passado. A programação, por exemplo, pode ser considerada a porta de entrada para o mundo da Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Inclui a utilização de JavaScript e de HTML para criar websites, programas estatísticos como R e SAS, programas AutoCAD e programação geral. À luz desse critério, existiram sete milhões de vagas em 2015 em cargos que valorizam competências de programação, segundo uma pesquisa da Oracle Academy. Esse número anual está sete vezes acima da estimativa do Gabinete de Estatísticas Laborais para empregos STEM num período de 10 anos.

Outro factor crucial em que se baseia o alargamento da nossa noção de STEM é a falta de percepção entre os jovens no que toca a profissões STEM e à sua relevância no mundo. O que foi claramente demonstrado no estudo de pesquisa da Randstad.

Nos EUA, 80% dos empregos de maior crescimento dependem de mestria matemática e de conhecimentos e competências científicas.

Ellen Morris, presidente e fundadora da Sustainable Energy Solutions, defendeu o alargamento da exposição e compreensão das áreas STEM. «Sempre defendi a exposição dos jovens aos pontos mais fracos destes empregos», explica Ellen Morris. «Não são necessariamente das áreas STEM, mas precisam das competências? Talvez seja mais intimidador pensar numa carreira STEM, e em vez disso nos devêssemos concentrar em criar uma base STEM.»

Ellen Morris acredita e defende que, quanto mais ligamos as competências STEM a carreiras na arte, negócios e até moda, mais teremos sucesso a aumentar o apelo destas competências nos jovens.

Conforme Jane Bove, principal program manager do Microsoft Office 365, faz questão de afirmar, «as competências STEM são apenas ferramentas numa caixa de ferramentas profissional. Não é preciso ser-se um verdadeiro programador, mas é provável que tenha de se usar estas mesmas competências a determinada altura. » Uma visão, de resto, com que Leigh Ann Fisher, vice-presidente executiva e Chief Administrative Officer da Alcoa Corporation, concorda veementemente.

Segundo Leigh Ann Fisher, «existem cargos que exigem certamente um conjunto específico de competências, como é o caso, entre outros, de contabilistas, de engenheiros electrotécnicos e de engenheiros mecânicos, por exemplo, mas a vasta maioria dos empregos nas empresas (independentemente do que produzem ou dos serviços que prestam e vendem) exige um conjunto de competências bem mais abrangente que é desenvolvido pela formação STEM – como a resolução de problemas, como relacionar ponto A com ponto B e outras capacidades de raciocínio consideradas fundamentais».

CRIAR MAIS LIGAÇÕES AO MUNDO REAL

Uma solução semelhante surgiu também entre os nossos especialistas, apoiada pela pesquisa Randstad STEM, envolvendo a necessidade que os jovens têm de estarem mais expostos a e de compreenderem melhor como funciona uma empresa – as suas funções, departamentos, processos de desenvolvimento de produto e entrega de serviço. A ideia é que isto permitiria aos jovens identificarem onde são utilizadas as competências STEM em todas as organizações e em todas as áreas – da NASA ao design de moda.

Ensinar aos jovens a ligação entre os negócios e aquilo que é aprendido na sala de aula pode ajudar os alunos a verem a sua aplicação no mundo real. Contudo, a pesquisa da Randstad descobriu que um número elevado de alunos tem a percepção errada sobre a aplicação dessas competências. Oitenta e sete por cento dos alunos entre os 11 e os 17 anos acreditam que as pessoas que estudam STEM trabalham em empresas como a NASA, mas apenas 40% acreditam que trabalham em empresas como Instagram, 26% na Coca-Cola e 9% na Forever 21.

Como o estudo indica, uma das principais razões para essa percepção errada é a falta de exposição generalizada a, e debates com, peritos STEM.

«O desafio que enfrentamos é que, em termos gerais, os profissionais dentro de carreiras STEM não são grandes comunicadores», explica Trina Salvisberg, senior region engineer na Enbridge Energy Partners. «Nunca conheci um engenheiro que não gostasse do que faz. O problema é que não transmitem naturalmente essa paixão.» Do ponto de vista de um formador, as parcerias com negócios são essenciais para a criação de programas e esforços que ajudem os jovens a compreenderem e adquirirem competências STEM. Por exemplo, 86% dos professores STEM concordam que os negócios deviam ter o seu papel a ajudar os professores a compreenderem as competências que os alunos precisam numa carreira STEM.

«Ligar os pontos entre os negócios e a aprendizagem na sala de aula pode ajudar os alunos a verem as aplicações», revela Laura Smith, VP de technical sales da IBM. «Quando os estudantes o conseguem, dá-se um enorme incentivo pelas STEM. Os negócios podem, porém, fazer a diferença ao fornecerem recursos a professores e alunos, o que ajuda ambas as partes a criar contextos e carreiras STEM mais adequados.»

EQUAÇÃO ERRADA PARA FORMAR EM MATEMÁTICA

O nosso estudo indica que a Matemática é a disciplina menos preferida entre alunos. No que diz respeito à Matemática e à forma como os estudantes vêem esta competência, o inquérito Randstad STEM descobriu que metade dos estudantes (49%) entre os 11 e os 17 anos afirma não saber que empregos existem na área da Matemática. Surpreendentemente, apenas 18% dos jovens pensaram ser suficientemente inteligentes para serem contabilistas – a percentagem mais baixa de todas as profissões STEM.

Quando os especialistas STEM deste estudo debateram estas mesmas descobertas, surgiu um tema claro sobre a forma como a Matemática é ensinada em sala de aula – especificamente, uma tendência entre formadores para se dar ênfase às respostas em vez de se dar ênfase ao processo de resolução de problemas. Principalmente para as jovens estudantes, a natureza preta e branca do certo versus errado pode muitas vezes diminuir a confiança nas competências e capacidades matemáticas.

A filosofia de Laura Smith em relação à Matemática sublinha a importância de mostrar o trabalho feito para resolver um problema. «Por vezes é o caminho até à resposta que demonstra as capacidades matemáticas», afirma. «Um aluno pode estar 95% certo na forma como o problema é resolvido, e uma pequena falha no fim cria uma resposta errada.»

Cynthia Johnson, VP e CIO da California Resources Corporation, concorda. «Sempre me disseram que a razão por aluque aprendemos Matemática é para aprendermos a pensar, a organizar», explica. «Ao alargarmos a abordagem à Matemática na sala de aula, podemos transmitir melhor aos alunos que é uma competência importante e que será necessária na vida – e não necessariamente apenas numa carreira.»

Conforme Susan Brennan tem revelado, «se trabalharem na SpaceX, os cálculos não podem estar errados. Contudo, para a maioria das outras profissões, a capacidade de resolver problemas e o processo de lógica e pensamento crítico são muito mais importantes do que a resposta certa ou errada num problema matemático.»

Para Wendy Walasek, directora executiva de tecnologia da Credit Suisse, tudo se resume a mostrar aos jovens que a Matemática é fantástica. «De muitas maneiras, a Matemática é muito interessante e divertida – principalmente quando conseguimos resolver as equações e os problemas analíticos. Temos de demonstrá-lo aos jovens, mas também transmitir que até um sociólogo, um historiador ou um designer de moda precisa da Matemática.»

DESIGUALDADE DE GÉNERO NAS STEM

Os estereótipos negativos sobre as capacidades das mulheres na Matemática e nas Ciências ainda continuam a persistir, apesar dos progressos significativos feitos nas últimas décadas na participação e desempenho destas disciplinas.

A realidade é clara: muitos acreditam que as raparigas não são tão boas como os rapazes a Matemática e que os homens são mais adequados para o trabalho científico.

Um relatório recente da AAUW intitulado “Why So Few?” (“Porquê tão poucas?”) examinou pormenorizadamente esta questão.

Ainda segundo o mesmo relatório, «uma boa parte de pesquisas experimentais descobriu que os estereótipos negativos afectam o desempenho e as aspirações de raparigas e mulheres na Matemática e nas Ciências, através de um fenómeno denominado “ameaça de estereótipo”. Até mesmo as alunas que se identificam fortemente com a Matemática – que se consideram boas a Matemática e para quem ser bom a Matemática é importante – são susceptíveis aos seus efeitos.» A pesquisa levada a cabo para escrever o relatório indica que «os estereótipos negativos sobre a capacidade das raparigas para um trabalho matemático e científico são claramente prejudiciais. Até uma referência subtil aos estereótipos de género tem efeitos adversos no desempenho das raparigas em testes de Matemática. Os estereótipos também alteram a auto-avaliação das raparigas na Matemática, o que influencia a sua vontade de seguir uma carreira nas Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática.

➜ 34% das alunas têm mais probabilidade de dizerem que é difícil compreender os empregos STEM do que os alunos da mesma idade.

Felizmente, este mesmo trabalho de investigação mostra também que combater activamente os estereótipos pode levar a melhorias no desempenho e no interesse das raparigas na Matemática e nas Ciências.»

PERSPECTIVAS DOS LÍDERES STEM

«Um maior reconhecimento da forma única que as mulheres usam para lidar com problemas, acrescentar valor ao trabalho e aumentar o desempenho das equipas irá diminuir os preconceitos e estereótipos de género.»

Ellen Morris, presidente e fundadora da Sustainable Energy Solutions

«As empresas devem fazer a sua parte na comunidade em que se inserem, trabalhando com os jovens para lhes ensinar o tipo de empregos e o que podem seguir.»

Leigh Ann Fisher, vice-presidente executiva e chief administrative officer da Alcoa Corporation

«Um dos principais factores para aumentar a confiança das jovens é ensinar-lhes que o cérebro é como um músculo. Cada vez que trabalham e aprendem, formam novas ligações.»

Cynthia Johnson, VP e CIO da California Resources Corporation

«Precisamos de ensinar às raparigas que a paixão, a dedicação e a persistência – e não só o intelecto – são o caminho para resultados. Devemos elogiar as raparigas pelos seus esforços, não apenas pela sua inteligência.»

Rachel Hudson, CFO de global corn processing da Archer Daniels Midland Company

«Para resolver a falta de profissionais femininas nas áreas STEM é necessário explicar aos professores a “ameaça de estereótipo” e fornecer-lhes técnicas e ferramentas para criarem um ambiente onde as jovens se sintam livres do ridículo ou da pressão de se afastarem de programas STEM.»

Susan Brennan, chief operations officer da Bloom Energy

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 156 de Março de 2019.

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