Randstad Insight: Seres des(h)umanos
Por José Miguel Leonardo | CEO Randstad Portugal
O tema é inevitável e não nos deixa dormir descansados. A Europa enfrenta uma guerra e repete imagens de sofrimento, dor e morte, culpa de lideranças e do profundo despotismo, de políticos que se esqueceram do valor da vida humana. Depois de termos estado mais de dois anos a escrever sobre as vidas perdidas pela pandemia e a importância de sermos todos melhor, voltamos a reconhecer o pior de ser humano, ou talvez de não o ser, de ter esquecido o que é ser pessoa e de viver embriagado com o poder.
Não vou discutir política, mas nunca vou compactuar com acções que contrariem os direitos humanos e não posso dar espaço a outros temas sem expressar a solidariedade com cada pessoa que hoje sofre por culpa dos desumanos, lamentar pelos que morrem e ajudar os que procuram as suas vidas de volta. É preciso liderar e garantir que juntos somos mais fortes, que a Europa se une para que a tão temida terceira guerra mundial não aconteça. Temos de aprender com o passado para que o futuro não seja uma repetição de erros, temos sempre de procurar ser melhores e não viver de ataques e da imposição da força.
O perigo do extremismo é exactamente este, o perder a noção dos valores fundamentais e contrariar o que é ser humano, o instinto de sobrevivência e a capacidade social, de pessoas que conseguem conversar com outras pessoas e que conseguem concordar em discordar para chegar a uma solução comum.
E nós, o que podemos fazer? Muito, tudo, mesmo quando tudo parece pouco. São muitas as empresas que já reagiram a este atentado aos direitos humanos, a esta guerra. A primeira acção que tomámos na Randstad foi a de sinalizar os nossos trabalhadores de nacionalidade ucraniana em todo o mundo, uma vez que não temos operação nem neste país nem na Rússia, e neste contexto garantir o acompanhamento destas pessoas. Mas não fomos apenas nós, por exemplo uma empresa de telecomunicações oferece chamadas a clientes ucranianos, assim como acesso a dados e televisão para garantir a ligação com as famílias, numa altura de elevada ansiedade e receio. Por outro lado, uma empresa de combustíveis anunciou o corte de relações com os seus fornecedores russos, assumindo com coragem a condenação da atitude de um país, independentemente das consequências para o seu negócio. Quando falamos em empresas humanas, em organizações mais humanas, em colocar as pessoas no centro é exactamente disto que estamos a falar, de empresas que assumem os seus valores e que mais do que prestar a sua solidariedade num comunicado de imprensa, agem em conformidade com estes valores, assumindo os riscos associados, mas não defraudando todos os que estão ligados a si pelo mesmo propósito, sejam clientes, sejam colaboradores.
Num mundo virado ao contrário temos de garantir que contribuímos para que deixe de estar do avesso e para que seja todos os dias melhor. Nas nossas partilhas, nos momentos em que falamos e condenamos ataques à humanidade, nas decisões que tomamos nas nossas organizações e nos momentos em que votamos, em que fazemos a nossa cruz e damos poder de liderança.
Que este seja um artigo de duração curta no tempo, mas que seja intemporal na memória, para evitar que a guerra continue a ser notícia e a fazer parte da história do mundo. A minha solidariedade e apreço com todos os que hoje sofrem por causa deste ataque, independentemente da nacionalidade, porque somos todos pessoas, somos todos ou deveríamos ser, todos humanos.
Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 192 de Março de 2022