Uma nova revolução, uma nova liberdade

Por Nuno España, Gestor

“Esta é a madrugada que eu esperava / O dia inicial inteiro e limpo / Onde emergimos da noite e do silêncio / E livres habitamos a substância do tempo”

47 anos depois deste poema de Sophia de Mello Breyner, também nós finalmente começamos a despertar para a “madrugada” que esperávamos desde 18 de março, dia em que, de repente, a nossa liberdade foi condicionada, ainda que de forma imposta. Em casa confinados, na rua afastados, sempre mascarados e reféns dos dispensadores de álcool gel, assim aguentámos, muitas vezes longe da família e dos amigos, com sacrifício de projetos e sonhos.

Ontem, após muitos meses, voltámos a não ter mortes por COVID-19. Com esta nova fase vem também um novo “normal”. Sair de casa, viajar, trabalhar, ir às compras, conhecer novas pessoas implica novos protocolos e novas regras, que devemos respeitar para que esta nova revolução do desconfinamento seja feita de forma gradual e responsável, pautada pelo ritmo da vacinação e da evolução de novos casos/óbitos. Está nas mãos de todos nós evitar anarquia e necessidade de voltara a casa – ninguém quer que seja preciso um novo “25 de Novembro”.

Se alguém nos dissesse que depois do 25 de Abril – revolução que tanta fama nos dá pelo Mundo – iriamos voltar a questionar a liberdade, poucos de nós acreditariam, mas a verdade é que já várias organizações mundiais alertam para o perigo do surgimento de governos ditatoriais durante a pandemia. De acordo com o índice publicado no Russia Today “Liberdade COVID”, Portugal surge com um índice de 1.03, em comparação com Austrália (1.46), Israel (1.10), China (0.87) ou Espanha/Alemanha (0.76) – no entanto há que ter em conta os diferentes regimes de base e contextos epidemiológicos, pelo que este índice se revelou falacioso. Também a Human Rights Watch veio recentemente dizer “Os governos devem combater a COVID-19 encorajando as pessoas a usarem máscaras, e não impondo mordaças” a respeito da violação do exercício da liberdade de expressão em pelo menos 83 países, entre eles China, Cuba, Egipto, Índia, Rússia.

Não serão as vidas que tínhamos, mas não podemos deixar que haja uma disrupção total dos direitos básicos conquistados ao longo do tempo. Como sempre ouvi dizer, direitos são também deveres. E temos o dever de estar à altura do desafio que esta nova revolução nos exige. Na organização onde trabalho, um dos lemas é “be here now” e a verdade é que (mesmo não estando a fazê-lo ainda de forma eximia), tem sido uma agradável surpresa a forma como tenho aproveitado e disfrutado os sítios e as pessoas, com esta nova sensação de liberdade que me (nos) foi hipotecada durante estes longos meses.

Confesso que encaro o futuro com algum receio e incerteza, mas também com uma enorme esperança e fé, porque o melhor ainda está para vir. Acredito que toda esta pandemia é uma oportunidade de dar um novo sentido às nossas vidas e redefinir prioridades.

Os pequenos pormenores do dia-a-dia, os básicos dados como garantidos, revelaram-se os verdadeiros “pormaiores” da vida.

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