Small is beautiful
Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros
Como tem vindo a ser evidenciado através de muitas fontes, começa a antever-se, com as novas tecnologias energéticas, a falta de algumas matérias-primas essenciais. Uma das vertentes destas tecnologias tem a ver com a mobilidade elétrica. A esse respeito refira-se que, num artigo da National Geographic Portugal, atualizado em junho deste ano, é referido que os veículos elétricos são “verdadeiras minas com rodas”. Por isso, se queremos apostar na transição energética – e não há volta a dar a isto – nesta vertente da mobilidade, só temos duas possibilidades: diversificar o tipo de motorização e de vetor energético e… reduzir.
Para diversificar, existem várias alternativas, como a aposta no hidrogénio/células de combustível, que também usa alguns minerais críticos, mas em menor quantidade que nos veículos elétricos a bateria, ou na manutenção de motores de combustão mas alimentados a combustíveis de origem não fóssil e por vezes referida como de baixo carbono, como o biodiesel, o biometano, o metanol, o etanol, os e-fuels solares etc. Que podem utilizar a infraestrutura de abastecimento existente sem grandes alterações. Muito provavelmente o futuro passará por aí, por uma diversidade de soluções, adequadas a cada tipo de utilização dos veículos e das necessidades dos utilizadores e ainda a cada tipo de situações específicas próprias de cada zona geográfica/país. Porém, mesmo em cada um destes casos, reduzir materiais e consumos será fundamental.
Mas centremo-nos agora no caso dos veículos elétricos a bateria. O grupo Transport & Environment realizou um estudo, a partir do qual concluiu que a forma mais eficaz para reduzir essa procura de metais essenciais para a mobilidade é diminuir o tamanho das baterias e dos carros. Este estudo refere que incentivos para viaturas elétricas de entrada de gama, acessíveis, de pequena dimensão, associados ao desenvolvimento de baterias inovadoras e a redução das viagens poderiam reduzir a procura de metais essenciais como o lítio, o níquel, o cobalto e o manganês em 36-49%. Por sua vez, apenas a redução do tamanho das baterias e a produção de carros elétricos mais pequenos, seria a forma mais eficaz de reduzir a procura de metais (19-23%). Saliente-se que se se quisesse descarbonizar a frota automóvel europeia até 2050 por via deste tipo de eletrificação seria necessária mais de 200 vezes a quantidade de materiais usados nas baterias que foi consumida no ano passado.
Os que têm a sorte de ter uma vida mais longa lembrar-se-ão, com certeza, do primeiro choque/crise petrolífera no início dos anos setenta. Nessa altura também houve um movimento mundial a nível dos construtores automóveis que constituiu numa aposta em veículos muito mais pequenos e leves. As grandes “banheiras” chegaram a ser vistas com maus olhos. Muitos veículos pequenos, de menor cilindrada e com materiais leves, surgiram no mercado, alguns dos quais foram ícones. Lembro-me mesmo de um microveículo nacional dessa altura, o Sado! E não foi por as viaturas serem mais pequenas que o mundo não continuou a girar…
Atualmente os construtores de veículos elétricos, dado o preço ainda elevado dos mesmos, têm apostado na gama alta e de maiores dimensões e muitas pick-ups (nomeadamente nos EUA), alguns dos quais long range. Existem mesmo, já no mercado, propostas a nível dos camiões elétricos. Ora este tipo de veículos necessita de grandes baterias e de grande capacidade.
Haverá, no dia a dia, necessidade de veículos tão grandes? Será que se justifica no longo curso usar veículos elétricos? Deverão estes ser preferencialmente usados a nível urbano? Será justificável o investimento no reforço da capacidade da rede elétrica e postos de carregamento para o longo curso? Estas são questões a colocar. Nomeadamente no nosso país, que parece apostar forte no hidrogénio e tem excelentes condições para a produção de combustíveis não fósseis.
Num mundo com restrições de abastecimento, os carros elétricos – mas não só – mais pequenos não são apenas uma necessidade ambiental, mas poderão contribuir também para uma abordagem económica e industrial sólida. Por isso me vem à mente uma célebre frase: small is beautiful…