Pum! Tiro de bazuca

Por Manuel Lopes da Costa, Empresário

 

Era previsível: havia que cuidar de três saúdes, a física, a mental e a económica e assim não aconteceu. Alarmados pela falta de camas e ventiladores nos hospitais, as decisões dos responsáveis têm sido, e continuam invariavelmente a ser, tratar unicamente da saúde física. Da mental, que certamente muitas sequelas deixará na nossa sociedade, quase ninguém fala, embora “Os resultados do estudo “Saúde Mental em Tempos de Pandemia (SM-COVID19)” indicam que cerca de 25% dos participantes apresenta sintomas moderados a graves de ansiedade, depressão e stress pós-traumático” (in http://www.insa.min-saude.pt/ de 15/01/2021). Mas isso, como sempre em Portugal, pode ser tratado mais tarde, dado não ser, nem premente, nem urgente. Errado. Nada de mais errado. Quando a sociedade tiver consciência das consequências reais, quer em jovens quer em adultos, provavelmente já nada, ou pouco, haverá a fazer. A fazer alguma coisa seria, talvez, agora e antes que seja demasiado tarde. Mas não: continuamos a tratar da saúde física tentando salvaguardar a questão da eventual falta de condições de resposta do SNS. É importante? É! Mas talvez fosse igualmente importante tomar medidas para evitar que os jovens entre os 20 e os 40 anos, e que ainda não estão vacinados, bem como outros mais velhos, se estejam permanentemente a borrifar para as consequências dos seus atos imaturos: “Covid-19. Número de novos casos entre os jovens quase duplicou desde o desconfinamento. Desde o início do desconfinamento, o número de novos casos de covid-19 entre os jovens quase duplicou: cresceram 90% nos que estão na faixa etária entre os dez e os 29 anos, ao longo dos últimos meses, desde 4 de Maio, data do início da primeira fase de desconfinamento. Só entre os 20 e os 29 anos, de acordo com os dados da Direcção-Geral da Saúde, os casos cresceram 89,3%.” (in publico.pt de 21/06/2021). E, evitar como? Evitando que se possam reunir para beberem copos, evitando ajuntamentos, evitando que vejam a seleção nacional de futebol todos juntos nas esplanadas, etc. etc. Como? Alocando forças de segurança em número suficiente para os dispersar. Estas ações, em meu entender, seriam bem mais eficazes e reduziriam bem mais o número de infetados do que a recente medida governamental de limitar as deslocações de e para fora da AML (Área Metropolitana de Lisboa) ao fim de semana. Porquê? Porque, ao contrário das nossas autoridades de saúde, não estou nada convencido que o vírus esteja adormecido durante a semana e que, por artes mágicas, acorda à sexta-feira a partir das 15:00 e, qual criança hiperativa, volta a adormecer, cansado de tanta atividade, segunda-feira às 06:00. Mais: dentro da AML — que por sinal é uma zona “pequenina” que só abrange os concelhos entre a Ericeira e Setúbal — continuamos todos alegremente a poder festejar e conviver sem constrangimentos e sem consequências de maior. Aqui e acolá, existem algumas restrições mas, nada de muito assertivo e que evitasse mesmo o caos que se avizinha. Estamos a caminhar a passos largos para outro confinamento e as autoridades continuam sem tomar uma posição de força que vise impedir a concretização dessa fatalidade. E, sim, trata-se de uma fatalidade porque será fatal para a nossa economia se tal voltar a acontecer. E o senhor Presidente da República já percebeu isso: “Marcelo afasta retrocesso no desconfinamento e diz que SNS está “sem pressão grave” (in Publico.pt de 12/06/2021). Se quisessem seriamente controlar a pandemia era proibir ajuntamentos, ponto. Proibir ajuntamentos de qualquer forma ou feitio e estabelecer regras claras e com consequências para quem ousasse não as cumprir. Porque é da saúde do país que se trata e o bem-estar de alguns não se pode sobrepor ao futuro de todos. Se quisessem mesmo e seriamente controlar o avanço da pandemia não era uma cerca sanitária à AML como um todo que se impunha, mas uma cerca sanitária individual a cada um dos concelhos da AML durante a semana e ao fim de semana e no mínimo durante uma quinzena. Era impopular? Era. Mas, era eficaz. Agora, com estas medidas? Como acreditar que o comportamento de alguém que consegue legalmente, ao fim de semana, ir surfar à Ericeira de manhã e beber uma “jola” na praia com os amigos seguido de um almocinho de choco frito em Setúbal, passando ainda por uma esplanada na Caparica para ver o pôr do sol e acabar num restaurante em Lisboa a jantar é menos perigoso que o do desgraçado que sai da capital para visitar os familiares em Abrantes sem frequentar espaços públicos? E por outro lado, são de lamentar declarações absolutamente fora de propósito de quem exerce (mas provavelmente há muito que deveria ter deixado de exercer, tantas são as “gaffes”) altos cargos públicos como: “Ferro apela a portugueses que vão “em massa” até Sevilha, mas cidade está em alerta vermelho” (in Observador 24/06/2021) no mesmo dia em que o governo endurece as medidas de controlo da pandemia. Uma irresponsabilidade. Estas são as incoerências que, infelizmente, nos regem.

A somar a tudo isto, a saúde económica das nossas empresas, sobretudo as do setor privado, não tem sido acautelada. A nossa bazuca está quase totalmente virada para o investimento público ao invés da grega que privilegia a recuperação do setor privado. Fruto da geringonça certamente. “PRR. ‘Míssil’ grego arrasa ‘bazuca’ portuguesa” (in expresso.pt de 156/05/2021) ou, como escreveu Joaquim Miranda Sarmento no eco.pt a 26 de abril de 2021 “Não tem uma aposta clara nas empresas, na atração de investimento e nas exportações. É uma lista de investimentos e gastos públicos que não foram feitos nos últimos 10-15 anos, por restrição orçamental.”.

Consequências? Uma das consequências é obvia: o aumento do desemprego que, tendo começado há já alguns meses, se vai fazer sentir ainda mais nos próximos tempos. Exemplos recentes como: “Altice confirma despedimento coletivo. Processo vai avançar “nas próximas semanas” (in 24.sapo.pt de 22/06/2021) ou “Banco BCP admite recorrer a despedimento coletivo” (in 24.sapo.pt de 18/06/2021) juntam-se a outros como “Recorde. Trabalhadores arrastados por despedimentos coletivos duplicam em 2020” (in dinheirovivo.pt de 2/01/2021). O ano de 2021, com a perda de turistas, sobretudo ingleses, devido à nossa incapacidade em manter os indicadores controlados — e não, não houve uma teoria da conspiração inglesa com vista a uma final da Champions, houve apenas incapacidade nossa em manter a pandemia controlada dentro dos limites estabelecidos —arrisca-se a ser um ano recorde no que aos despedimentos diz respeito. E isso é muito grave. Tão ou mais importante do que evitar que os hospitais transbordem, é evitar que o desemprego continue a subir. Porque o desemprego é o maior de todos os flagelos sociais, o maior entrave ao crescimento económico e ao bem-estar das populações. O empobrecimento da nação começa aí. Um desemprego elevado traz criminalidade, traz problemas sociais, psicológicos e, por fim, traz igualmente problemas de saúde pública muito mais difíceis de controlar do que aqueles que estamos a tentar controlar presentemente. Cada notícia sobre intenções de despedir no nosso país deveria fazer soar todas as campainhas no governo, na presidência e na Assembleia da República. É o Portugal que conhecemos que está a morrer para dar lugar a um país mais pobre, mais “estado-subsídio-dependente” dependente. Ao contrário do que alguma esquerda que nos governa possa pensar, não é o estado nem são as empresas estatais que fazem aumentar as exportações ou o nosso PIB. A bem de todos, salvemos o emprego direcionando a bazuca para quem, efetivamente, gera mais emprego, mais riqueza e mais bem-estar.

PUM! Tiro de bazuca sim, mas no setor privado.

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