Os desafios da Ética Informática em tempos de evolução tecnológica

Por Leonardo Souza, IT Consultant – Bee Engineering

 

James Moor, filósofo e professor americano, definiu em 1985 que um problema típico em Ética da Informática surge porque há um vácuo de política sobre como a tecnologia deve ser utilizada. Ele ressalta que os computadores disponibilizam novas capacidades, e estas, por sua vez, dão-nos outras opções de ação. Refere-nos também que, muitas vezes não existem políticas de conduta nestas situações ou que a legislação existente parece inadequada.

A definição de Moor mostra-se mais atual do que nunca. Estamos a viver momentos de grandes evoluções tecnológicas. Por consequência disso, com mais frequência, surgem questões de ética a serem resolvidas ou analisadas. Este debate ajuda a que se possam moldar melhores práticas de estudo, desenvolvimentos e ideias para além do âmbito da tecnologia da informação.

Os profissionais de tecnologia, quer sejam eles engenheiros, programadores ou idealizadores, deveriam pensar mais nos impactos sócio-culturais e ambientais sobre aquilo que é criado antes de avançarem para a etapa de desenvolvimento do produto/serviço. Desta forma, podem contribuir para a resolução de problemas éticos que podem ser causados, apresentando soluções para que o poder tecnológico criado não cause danos irreparáveis.

As redes sociais podem ser citadas como exemplo onde existem problemas éticos a serem resolvidos. São aplicações que armazenam uma quantidade incomensurável de dados sobre utilizadores  levando-as a conhecer em detalhe a nossa personalidade e gostos. Por outro lado, temos participantes que nem sempre as utilizam para o mesmo fim e que acabam por causar conflitos através de contra-informação e de abusos verbais. Neste sentido, penso que quem gere estas “media sociais” deveria estar cada vez mais empenhado em desenvolver algoritmos capazes de minimizar estes problemas. Dito isto, tenho de fazer uma ressalva: a Inteligência Artificial é muito bem-vinda. Contudo, questiono-me como será possível criar uma solução para os 32% de jovens raparigas que afirmam que, quando se sentem mal com o seu corpo, o Instagram as faz sentirem-se pior. Há aqui um grande desafio, não só informático.

Recentemente, Tristan Harris, co-fundador do Center for Humane Technology disse numa entrevista ao programa “60 Minutes” da CBS que as empresas de “media social” estão a lucrar com o ódio online dos americanos. Se analisarmos com mais detalhe, isto não acontece só nos EUA. As redes sociais no Brasil por exemplo, são utilizadas constantemente como palcos de guerra, principalmente quando o tema é a política. Precisamos de ter mais poder sobre o que aparece na nossa “timeline”. Deveríamos poder optar pelos assuntos que desejamos que nos apareçam.

Por falar em Inteligência Artificial, temos de estar mais abertos à discussão sobre os seus impactos. Até há poucos anos tínhamos os computadores a trabalhar connosco em forma de suporte às nossas atividades diárias. Hoje temo-los a trabalhar por nós, a par de todo o tipo de organismos eletrónicos por assim dizer. Temos os robôs, máquinas agrícolas, drones a fazer os transportes de encomendas, entre outros. São tecnologias incríveis, mas penso que nunca foi tão necessário discutir ética como agora. É preciso levar em consideração os impactos sociais. Afinal uma só máquina com inteligência artificial já é capaz de substituir uma grande quantidade de pessoas.

Considero justo que, tanto os idealizadores como os compradores destas tecnologias se preocupem em oferecer alternativas para que as pessoas possam manter ou fazer evoluir os seus postos de trabalho. Há aqui mais um grande desafio, estes postos poderão ser mantidos em forma de monitorização/manutenção das máquinas ou então será necessário que aprendam a programá-las.

Já estão disponíveis em alguns lugares do mundo muitas tecnologias com inteligência artificial. No setor da agricultura por exemplo há máquinas que cultivam o solo, irrigam e tomam a decisão de colher os melhores frutos. Há restaurantes que já preparam a nossa comida utilizando-se de robôs e não tarda a chegar o dia onde todos os meios de transporte serão autónomos. Isto já não é grande novidade, mas interrogo-me se não iremos perder uma das nossas melhores capacidades, a de raciocinar. Afinal, com tantas tecnologia a fazer de tudo por nós, corremos o risco de gradualmente irmos perdendo a nossa inteligência.

Percebo que de uma forma geral, a sociedade não esteja tão preocupada com a forma como que os seus dados estejam a ser utilizados, nem com a Inteligência Artificial. De facto, não deveria desde que fossem motivadas e formuladas políticas para orientar essas ações. Entendo isto como um fator não limitativo à criação de novas tecnologias, mas sim como um instrumento que nos permita tanto criar como conviver com tecnologias cada vez mais inteligentes sem prejudicar o nosso ecossistema.

A verdade é que a evolução ou revolução tecnológica da qual fazemos parte é imprevisível. Poucos sabem o que está por vir. Após o lançamento de uma nova tecnologia é espoletada nos seres humanos uma nova necessidade que outrora não existia da qual após a sua utilização é quase impossível abandonar. São exemplo disso, os telemóveis e a própria internet. Portanto, enquanto sociedade, de forma geral, devemos estar preparados eticamente para fazer o bom uso do que por aí vem.

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