Lítio marinho: uma nova oportunidade?

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

 E mais uma vez lá vem o lítio à baila. Tem-se falado nas reservas de lítio do país, na sua exploração, na oposição de parte da população e de alguns atores relacionados, na importância para a economia, nos problemas ambientais, na necessidade deste metal para a eletrificação da economia, nas soluções futuras que não passam por este elemento químico, enfim, em muitos prós e contras associados. Não há quase um dia que passe sem que este tema não surja nos media.

A procura de lítio tem crescido continuamente e consequentemente o preço do carbonato de lítio. Estimou-se que, para um período de 35 anos a terminar em 2050, o consumo de lítio será de mais de 5 milhões de toneladas, o que representa mais de um terço das reservas de lítio total conhecidas onshore. Reservas essas que se preveem extintas em 2080. Sinais de alerta!

Tem sido divulgada a relevância das reservas de lítio do nosso país, no âmbito europeu e mundial, embora com algum contraditório relativamente ao seu potencial. Mas existe outra possibilidade, interessante para um país com uma zona económica exclusiva (ZEE) tão grande: a extração de lítio metálico da água do mar.

A ZEE portuguesa compreende 3 subáreas: a subárea do continente (287 521 km2), a subárea dos Açores (930 687 km2) e a subárea da Madeira (442 248 km2). É referido que a ZEE de Portugal é a 3.ª maior da União Europeia, de tal ordem que cerca de 11 % da ZEE da União Europeia pertence a Portugal, sendo a 20.ª maior do mundo. Estes valores dão-nos uma dimensão das potencialidades desta nova possibilidade.

Além disso, um outro aspeto interessante, com isto relacionado, é o facto de a distribuição geográfica dos recursos de lítio onshore ser concentrada em poucos países. 98% do total das reservas estão concentradas no Chile, Argentina, China e Austrália. Já o mar banha muitos mais países, sendo, portanto, um recurso muito mais “democrático”. Com todas as vantagens geopolíticas e geoestratégicas inerentes, podendo ainda a água do mar ser uma fonte de lítio quase inesgotável no futuro, dada a quantidade existente.

Atualmente o lítio é obtido a partir de minérios e também de lagos salgados. No entanto, estimativas efetuadas apontam para que a quantidade lítio existente nos oceanos ser muitos milhares de vezes superior (há referências a mais de 10 mil vezes!) à da existente em terra. Por isso esta quantidade é apontada como sendo muitíssimo superior à quantidade estimada para consumo humano em anos vindouros, pelo que o impacto da sua extração da água do mar seria quase nulo. Porém, a sua concentração na água do mar é muito baixa, na ordem de 0,1 a 0,2 partes por milhão (ppm) sendo que há quem também fale em 30mg/l, o que exige métodos adequados para a sua obtenção.

Existem soluções técnicas para a extração do lítio da água do mar, por exemplo utilizando eletrólise com energia fornecida por via solar e utilização de membranas específicas, que permite uma extração mais controlável e rápida, parecendo ser esta uma tecnologia auspiciosa. Esta técnica permite obter diretamente lítio metálico. E ainda por cima sem impacto ambiental assinalável. Outras soluções são também possíveis, como métodos baseados em adsorção e diálise, mas com muito menos eficiência e rapidez, sendo que o lítio concentrado no final está ainda dissolvido em água e requer tratamento posterior para se obter lítio sólido.

O método mais auspicioso utiliza compartimentos divididos por uma membrana com células fotovoltaicas na parte superior, para promover a eletrólise, células essas que são flutuantes permitindo a sua utilização offshore, sendo perfeitamente escalável em termos de dimensão ou de aumento do número de compartimentos.

Sabe-se inclusive que existem já empresas portuguesas e consórcios que estão a trabalhar neste domínio, com outras tecnologias, embora em fase de desenvolvimento e ainda não de aplicação industrial. Mas o futuro parece risonho, assim estas iniciativas tecnológicas e empresariais tenham êxito.

Num país que se diz na vanguarda da transição energética, aqui fica mais uma vertente em que podemos tomar a dianteira. E ainda por cima com o recurso à mão! Por isso, os decisores políticos deverão ter esta possibilidade na sua equação de decisão.

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