IA generativa: resolver problemas reais

Por Syed Hoda, Digital Innovation leader na AWS

No início dos anos 2000, o tema da grande feira anual de tecnologia, Consumer Electronics Show, eram os microondas, máquinas de lavar loiça, frigoríficos e outros eletrodomésticos com acesso à Internet. A possibilidade de ter estes dispositivos ligados à Internet parecia algo fantástico, que o futuro nos reservava.

No entanto, mais de duas décadas depois, é pouco provável que conheça alguém que tenha uma máquina de lavar loiça com acesso à Internet, muito menos uma cozinha inteira. Então, o que é que correu mal? Basicamente, esses novos eletrodomésticos inteligentes não foram adotados porque não foram criados para resolver problemas do cliente. Em vez de se concentrarem na funcionalidade, os fabricantes destes dispositivos concentraram-se no uso de ‘tecnologia pela tecnologia’, como se se tratasse de um tipo de projeto ‘científico’. Atualmente, são peças de museu, recordadas por poucos e possuídas por ainda menos.

O entusiasmo em volta da Inteligência Artificial (IA) generativa é grande e está a crescer todos os dias. Tal como aconteceu com as grandes transições tecnológicas anteriores, como a Internet e a cloud, sabemos que a Inteligência Artificial, o Machine Learning e a IA generativa têm potencial para provocar grandes mudanças em todo o mercado.

Em vez de se perderem em planos evasivos, os CEO e os membros dos conselhos de administração das pequenas e médias empresas (PME) devem perguntar-se a si próprios: O que é que a IA generativa significa para o meu negócio? Como é que a IA generativa vai afetar a proposta de valor da minha empresa? Como irá afetar a proposta de valor dos meus clientes – e quando veremos os seus resultados? Como é que a IA generativa vai mudar o meu modelo de negócio? E a minha organização, está preparada para estas mudanças?

São muitos temas em que pensar – mas é importante compreender que estas são questões básicas de negócio. Estas questões foram colocadas sempre que uma nova tecnologia foi introduzida no mercado. Quando a Internet surgiu ou quando a cloud foi introduzida.

As empresas que dedicaram tempo a estas perguntas e as entenderam como parte do ‘negócio’ tiveram resultados muito diferentes das que não o fizeram. A tecnologia deve ser utilizada para resolver problemas.

Em 2002, a FedEx apercebeu-se que a papelada que os seus 40.000 estafetas FedEx Express tinham de preencher cada vez que recolhiam ou entregavam uma das 3,5 milhões de encomendas com que lidavam diariamente, lhes ocupava demasiado tempo. A empresa estabeleceu uma parceria com a Motorola, Inc. para desenvolver os dispositivos portáteis FedEx PowerPad, concebidos para serem customizados e para eliminar a necessidade dos estafetas da FedEx Express preencherem tanto papel, poupando-lhes 10 segundos em cada paragem. O investimento de 150 milhões de dólares foi projetado para poupar à empresa cerca de 20 milhões de dólares por ano.

A Netflix também utilizou a tecnologia para melhorar a sua proposta de valor. Esta empresa foi criada pois o seu fundador percebeu que os clientes estavam descontentes com as multas pagas no videoclube, quando se atrasavam a entregar os filmes. Então, criou um modelo de envio por correio, com pagamento de um valor mensal e sem multas de atraso. Depois, quando a tecnologia de cloud computing se desenvolveu, a Netflix fez algo corajoso. A empresa mudou de modelo, passando do bem-sucedido modelo de DVD por correio para o streaming a pedido e ilimitado. Conseguiram continuar a inovar porque não se tornaram complacentes. Em vez disso, a Netflix continuou a perguntar: “O que é que poderia melhorar a experiência do nosso cliente?” Tal como a FedEx, a Netflix utilizou a tecnologia disponível para resolver problemas reais.

Daqui a vinte anos, ninguém se lembrará de metade dos ‘projetos científicos de IA’ que estão hoje a ser desenvolvidos. Mas se os líderes das PME trabalharem a partir dos pontos fracos apontados pelos clientes, e procurarem soluções para os resolver através do recurso a tecnologia adequada – depressa acabarão por criar soluções brilhantes e duradouras.

De acordo com um estudo da McKinsey, publicado a junho de 2023, o impacto potencial da IA generativa na economia global é significativo. A McKinsey estima que as novas aplicações de IA generativa deverão gerar entre 2,6 e 4,4 biliões de dólares. Entretanto, estima-se que a IA como um todo – que inclui a análise avançada, o Machine Learning tradicional e Deep Machine Learning – venha a representar valores estimados entre 11 e 17,7 mil milhões de dólares.

Quando se pensa em IA generativa, é útil voltar à velha parábola da tartaruga e da lebre. A lição da fábula – firmeza e determinação que versus rapidez e caos vencem a corrida – também pode ser aplicada à questão da IA generativa.

A IA generativa tem a capacidade de transformar a forma como fazemos negócios, como trabalhamos, como servimos os nossos clientes; não é de admirar que deixe todos entusiasmados, mas devemos avançar com um objetivo definido. Veja-se o ChatGPT, por exemplo. Esta ferramenta tornou-se popular – e dominou o ciclo mediático – devido à sua acessibilidade e rapidez. E, embora por si só já seja impressionante, nem sempre foi claro como pode ser utilizada para ajudar no desenvolvimento empresarial.

Ignorar a IA generativa não é solução. Esta é uma ferramenta de negócios profundamente importante e com um potencial ainda desconhecido.

A Internet e a cloud ajudaram algumas empresas a resolver problemas importantes e a introdução da IA generativa tem o mesmo potencial. Mas se for um líder de uma PME que está apenas centrado no ChatGPT, então, provavelmente está focado na ferramenta errada. Em vez disso, importa ignorar o tema da moda e dedicar energia a resolver problemas a longo prazo. As empresas com maior quota de mercado serão as que conseguirem desenvolver projetos de aplicação significativos, que resolvam problemas reais e proporcionem mais valor aos seus clientes.

Já respondeu às grandes questões estratégicas sobre a proposta de valor e os modelos de negócio da sua empresa – e agora? Há três perguntas que ajudam as PME a perceber o potencial impacto que a IA e as iniciativas de IA generativa podem ter nos seus negócios:

A primeira é ‘O quê (e para quem)?’ Que problema estamos a tentar resolver e para quem? Quais são as dificuldades específicas? Em que é que o novo processo/experiência é melhor? Quais são os benefícios mensuráveis?

Segunda questão ‘Como?’ Devemos utilizar a IA, o ML ou a IA generativa para resolver determinado problema? Porquê? Esta é a melhor forma de o resolver? Poderíamos resolvê-lo de outra forma? Quais são as vantagens/desvantagens destas alternativas?

E última questão ‘Quando?’ Como devemos financiar e priorizar determinada iniciativa (há abordagens alternativas)? Com uma tecnologia que tem um poder de transformação tão grande como a IA, é necessário avaliar cuidadosa e conjuntamente a ‘facilidade de execução’ a rentabilidade que trará (ROI). Por exemplo, qual é a viabilidade da iniciativa, em termos dos dados e ferramentas, face aos recursos/competências necessários? Tenha cuidado para não embarcar simplesmente nos projetos com ROI mais elevado, pois alguns podem ter um nível de dificuldade também muito elevado. Da mesma forma, não ignore os projetos com um ROI mais modesto, que têm objetivos fáceis de alcançar mas que podem proporcionar conhecimentos valiosos e trazer maior confiança a toda a equipa.

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