Estamos sozinhos no Universo?

Por Arlindo Oliveira, Professor do IST e Presidente do INESC

 

Winston Churchill é mais conhecido como estadista e como o primeiro-ministro britânico que conduziu o Reino Unido durante a segunda guerra mundial. Embora as suas facetas de político, orador e historiador sejam as mais conhecidas, Churchill era uma pessoa culta, inteligente e multifacetada, tendo inclusive ganho o Prémio Nobel da Literatura em 1953 por diversas contribuições, incluindo as suas memórias de guerra.

Porém, a sua curiosidade e inteligência permitiram-lhe endereçar temas muito diversos, com profundidade, conhecimento e pertinência. O título desta crónica é um ensaio escrito por Churchill nos anos 30 e revisto no final dos anos 50, onde o estadista se debruçava sobre a possibilidade da existência de vida noutros planetas. Este ensaio foi recentemente redescoberto e uma análise do seu conteúdo foi publicada na prestigiada revista Nature, pelo conhecido astrofísico Mario Livio. O que é impressionante no ensaio, escrito há mais de meio século por um não especialista, é a sua correcção, profundidade e relevância. Churchill aborda a questão de uma forma estruturada e científica, identificando em primeiro lugar como se pode definir a vida, de seguida quais os requisitos que um planeta deve ter para poder desenvolver e suportar vida e, finalmente, onde será possível encontrar planetas com essas características e qual a probabilidade de isso vir a acontecer.

Como refere Mario Livio no seu artigo na Nature, o raciocínio que Churchill segue no seu ensaio é inatacável, tanto à luz do que se sabia em meados do século XX como também à luz da ciência moderna. A inteligência, conhecimento e argúcia que Churchill revelou na abordagem a um problema que não era da sua área são talvez tão surpreendentes como a curiosidade que o levou a abordar uma questão inteiramente irrelevante para o mundo da política, em que se movia.

Para aqueles que, como eu, acreditam na contínua e sustentada evolução da sociedade, suportada pela evolução da ciência e pelo aprofundamento dos valores humanistas, a comparação entre a profundidade do pensamento de Churchill com a superficialidade das intervenções dos políticos actuais é desconcertante. Seria difícil, se não impensável, que um político moderno tivesse a inteligência e a visão que Churchill teve quando escreveu o agora famoso ensaio.

Pelo contrário, a adopção de políticas erráticas pelos governos, face ao aparecimento de um novo vírus, responsável pela pandemia de COVID-19, demonstra bem a falta de profundidade do conhecimento científico dos decisores políticos, em praticamente todos os países. É certo que a comunidade científica exibiu, também ela, muitas divergências e pouca clareza na abordagem a este problema. Por um lado, os rápidos desenvolvimentos que resultaram na sequenciação do vírus e na criação de vacinas eficazes surpreenderam, pela positiva. Pelo contrário, no que respeita aos riscos e medidas a adoptar, a publicação de conclusões contraditórias e a reduzida objectividade das análises não têm ajudado a criar uma visão clara do problema, mesmo dentro da comunidade científica. Mas, de facto, é normal e comum que a opinião da comunidade científica demore a convergir em situações cujas características se alteram muito rapidamente, e nada justifica o carácter errático das medidas que praticamente todos os países têm tomado no combate ao COVID-19. Esta situação deve-se, em grande parte, à falta de cultura científica dos decisores políticos e à sua excessiva sensibilidade à opinião pública.

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