E ainda o PNEC 2030

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

O Plano Nacional Energia e Clima 2030 (PNEC 2030) é o principal instrumento de política energética e climática no horizonte de curto-médio prazo. Este plano pretende estabelecer as metas, objetivos, linhas de atuação e medidas de ação em matéria de energia e clima, devidamente relacionados com as 5 dimensões: Descarbonização; Eficiência Energética; Mercado Interno de Energia; Segurança Energética; e Investigação, Inovação e Competitividade. Foi submetida a revisão do Plano Nacional Energia e Clima 2030 no passado mês de julho e decorreu uma consulta pública para a recolha de comentários até ao princípio de setembro. A consulta pública ficou concluída a 5 de setembro, tendo recebido 177 participações de diversos setores da sociedade, o que demonstrou um grande interesse da sociedade civil pelas questões climáticas e energéticas. Depois de analisadas as contribuições, documento seguiu para aprovação do Governo e da Assembleia da República.

Um documento que pretende definir um projeto de desenvolvimento estratégico para Portugal, aproveitando o potencial das energias renováveis para estimular a economia, criar empregos verdes e garantir a segurança energética, deve ser coerente no que se refere aos objetivos e as linhas de atuação com as respetivas medidas de ação. O que não é fácil devido às inerentes contribuições de diferentes instituições com perspetivas e visões diferenciadas.

Por isso, vou aqui discutir, neste âmbito, duas áreas que já aqui abordei ao longo dos tempos: a dos combustíveis de baixo carbono e a do solar térmico de concentração.

A esmagadora maioria dos combustíveis consumidos nos transportes, líquidos e gasosos, já estão a ser parcialmente descarbonizados através da incorporação de biocombustíveis de origem renovável (biodiesel, etanol, biometano). A eletrificação do transporte rodoviário, tem desafios tecnológicos, económicos, ambientais e mesmo sociais, pelo que demorará o seu tempo e provavelmente não será a solução para todas as utilizações necessárias.

O PNEC refere a inclusão de combustíveis de baixo carbono de origem biológica e sintéticos, mesmo a nível de algumas medidas de ação. Mas seria importante desenvolver um plano nacional para os combustíveis líquidos de baixo carbono, como aliás já foi feito por exemplo, para o biometano e o hidrogénio verde.

Relativamente ao solar térmico de concentração, o PNEC 2030 reconhecia esta tecnologia como tendo o potencial de poder ser uma componente despachável de eletricidade e apresentava uma perspetiva de 300MW, representando uma inclusão deste tipo de tecnologia no sistema energético. E na primeira revisão submetida à Comissão Europeia em meados de 2023 essa capacidade instalada era referida em alta para o dobro, aumentando inclusive a sua fração no sistema eletroprodutor apesar de também a capacidade total deste ser revista em alta.

Verificou-se agora que na versão de consulta pública o solar térmico de concentração continua a ser mencionado mas de forma mais vaga em termos de objetivos, o que não se entende, sendo que é importante estabelecer objetivos concretos.

Voltando agora a uma apreciação mais global, refira-se que há vários fatores que devem ser tomados em linha de consideração, não de forma isolada, mas de forma interrelacionada. Entre esses fatores devem estar a segurança do aprovisionamento, a gestão do sistema eletroprodutor, a incorporação nacional na cadeia de valor e, naturalmente, o custo.

É necessário que um documento destes expresse uma visão e uma ambição política que pretendam dar uma resposta à descarbonização da economia com todas as envolvências relacionadas. Mas o Conselho Nacional de Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) refere que este plano é insuficiente e pouco concreto, concretizando ainda que embora haja intenções “certamente positivas” no documento, este apresenta-se “sem metas, indicadores ou meios claros”. Na generalidade, as metas não são claras e as medidas concretas “são inexistentes ou pouco fundamentadas”, diz o CNADS, mencionando ainda que o plano “não fundamenta opções e critérios de cálculo essenciais, em especial nas previsões da procura e da oferta de energia” e que não tem também em conta os efeitos da evolução tecnológica, da inovação e dos preços da energia, a lógica do mercado ou os princípios do poluidor-pagador e utilizador-pagador. O CNADS sublinha ainda que a transição “renovável” deve ser feita “na medida do necessário” e a taxa de carbono, deve crescer “de forma previsível e com significado económico, pois dificilmente se atingirão as metas de redução de outra forma”.

Uma outra entidade, o Conselho Português para a Saúde e Ambiente, criticou também este plano ao referir que a saúde ficou de fora do mesmo e que esta é o melhor argumento para mobilizar a população para a necessidade de uma transição energética.

Também a ZERO diz que PNEC 2030 “aumenta a ambição” mas sem um “caminho claro para a neutralidade carbónica”. Esta associação considera que um dos aspetos mais críticos do PNEC 2030 será a viabilidade do cumprimento das metas face às políticas e medidas propostas, dado que carecem de detalhes suficientes para garantir a sua credibilidade e não definem de forma adequada a sua contribuição para alcançar os objetivos. É ainda referido que consideram que deveria ter sido dado maior destaque à eficiência e pobreza energéticas.

No entanto, apesar destas críticas, o PNEC 2030 revisto parece mais completo e esse caminho terá de ser seguido nos planos para os decénios seguintes. Planos esses que deverão incorporar alguns destes aspetos que lhes poderão atribuir uma maior coerência de forma a conferir alguma estabilidade e previsibilidade tão necessárias ao grande desafio da descarbonização da economia nacional.

 

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