Ai (In)Felicidade! – O Fado Português

Por Joana Santos Silva, Professora de Estratégia e Diretora de Inovação do ISEG Executive Education

O povo português não é conhecido pela sua exuberância, joie de vivre ou festejos coloridos. Somos conhecidos pela música sofrida do fado, pelo estoicismo silencioso, a sobriedade e resiliência do nosso povo.

Em 2011, as Nações Unidas adotaram a resolução da Felicidade e assim passou a constituir uma medida de desenvolvimento da sociedade. Desde 2012 existem rankings de felicidade por país. Se acham que em Portugal até somos felizes…. afinal temos sol, praias e cerveja barata… desengano-vos, estamos apenas em 59º lugar (nota 5,91 em 10).

No topo do ranking há 4 anos consecutivos, encontramos a Finlândia seguida pela Dinamarca, Suíça, Islândia e Noruega.

Poderá a solução para a felicidade consistir em viver num país com temperatura ártica?

A felicidade é calculada com base na economia, no bem-estar político, social e ambiental, na satisfação geral e saúde física e mental. Focando nesta última variável, de acordo com a Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, 1 em cada 5 portugueses sofre de uma perturbação psiquiátrica. Somos unicamente superados pela Irlanda do Norte, que vive debaixo de uma nuvem de chuva permanente….

Na perspetiva da incidência, as perturbações mentais e de comportamento são as segundas mais prevalentes, exclusivamente ultrapassadas pelas doenças cardiovasculares, a principal causa de morte em Portugal. Dos 29 países que integram a OCDE, Portugal é o quinto que mais consome ansiolíticos e antidepressivos. De janeiro a março de 2021, foram dispensadas 2 544 635 embalagens de antidepressivos no nosso país.

A saúde mental constitui um desafio complexo, pois representa 12% da totalidade das doenças a nível mundial, subindo para 23% nos países desenvolvidos. Calcula-se que na Europa, os custos diretos com a saúde mental são de €460 Biliões. Não obstante, apenas 25% dos doentes recebe tratamento, considerado adequado em unicamente 10% dos casos. Em Portugal, apenas 0,8% dos custos associados com a saúde são destinados à saúde mental. Existe uma crise de acessibilidade a estes cuidados em todo o país.

A depressão é das doenças mais prevalentes no foro neuropsiquiátrico. Estima-se que 1 em cada 4 pessoas sofre, sofreu ou vai sofrer de depressão. Em Portugal, é considerada a principal causa de incapacidade (20% dos dias não trabalhados) e a segunda causa de perda de anos de vida saudáveis.

A saúde mental é um tema complexo pois é multifatorial, sabemos que o contexto e circunstâncias individuais têm impacto na incidência. Pobreza, desigualdade social, níveis baixos de escolaridade, desemprego, trauma, contexto familiar disfuncional, entre outros atuam como fatores de risco. Em paralelo à crise de saúde pública, o COVID-19 é também responsável por uma crise económica cuja dimensão ainda está por avaliar, contudo adivinha-se uma agudização da necessidade de cuidados. A título de exemplo, e de acordo com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, a subida de 1% na taxa de desemprego causa um aumento de 4,4% na taxa de suicídio.

A próxima epidemia será certamente relacionada com a saúde mental e bem-estar populacional. É imperioso investir na saúde mental garantindo

acesso a cuidados de qualidade e de continuidade para toda a população necessitada. Não podemos aspirar a ser um país desenvolvido e próspero com uma sociedade deprimida, ansiosa e viciada em benzodiazepinas (mesmo que haja sol).

Queremos ser felizes e mudar de fado!

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