A lealdade como dever de quem aconselha a investir 

Por A. Barreto Menezes Cordeiro, professor e jurisconsulto da Menezes Cordeiro

Os deveres dos intermediários financeiros podem ser sistematizados em duas categorias: os deveres específicos e os genéricos da organização interna. Nos deveres específicos incluem-se os deveres de sigilo, informação ou adequação, assim como o dever de prestação principal; enquanto nos genéricos de organização interna falamos nos deveres de compliance, de auditoria interna ou de gestão de riscos. 

A estas duas categorias de deveres acresce uma terceira que não se limita aos intermediários financeiros, mas que abrange todos os intervenientes do mercado: são os deveres genéricos relativos ao bom funcionamento do mercado que assentam sobretudo nos deveres de defesa do mercado, de não manipular o mercado ou de não utilizar informação privilegiada.  

Mas o que gostaria de trazer hoje para aqui é o chamado dever de lealdade que molda a posição jurídica dos intermediários financeiros, enquanto sujeitos fiduciários. 

Numa prestação do serviço de consultoria para investimento, o intermediário financeiro não está apenas obrigado a prestar aconselhamento ou sequer a prestar um bom aconselhamento, mas a prestar o melhor dos aconselhamentos. 

O dever de lealdade ter-se-á por cumprido, em princípio, quando existir uma coincidência entre o instrumento financeiro aconselhado e aquele que deva ser aconselhado à luz do regime que regula o dever de adequação. 

Mas, apesar da imparável produção legislativa europeia, o dever de atuar no melhor interesse do cliente não se encontra totalmente plasmado na lei, ou seja, ele tem espaço de aplicação para lá dos regimes concretos consagrados pelo legislador. Vejamos como: 

1) o dever de ponderação efetiva – a tomada de decisões não pode circunscrever-se a uma aplicação mecânica de procedimentos internos;  

2) o dever de não atuar a mando de outrem – a tomada de decisões deve resultar de uma ponderação própria ou autónoma. Se um intermediário financeiro aconselhar a subscrição de valores mobiliários apenas porque um terceiro o ordenou, violará do dever de lealdade; 

3) dever de voltar atrás na decisão tomada – tanto por se verificar que as circunstâncias se alteraram, como por se concluir que o procedimento aplicado não foi o legalmente exigido ou o mais adequado; 

4) dever de apenas considerar os factos relevantes – a tomada de decisão não pode ser condicionada por elementos não exigidos por lei ou desadequados perante a situação concreta; 

5) o dever de não incentivar os clientes a agir precipitadamente ou irrefletidamente; 

6) o dever de não aproveitamento da falta de conhecimentos ou de experiência do cliente. 

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