A caixa do nada

Por Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

Este não é um artigo machista, sexista ou desrespeitador de qualquer género.

Todos os conjugues masculinos de um casamento clássico têm um pequeno refúgio que se chama “caixa do nada”. Acontece quando querem ficar “hipnotizados” sem fazer nada em frente à televisão, com o comando na mão, a mudarem de canal de forma sincronizada, sem sequer se aperceberem do que está a ser transmitido. Estão na sua “caixa do nada”, de cérebro vazio, em que as células não comunicam entre si, apenas a permitir que o sistema nervoso parassimpático assegure as funções básicas como respirar. A “caixa do nada” é como uma sala vazia, sem móveis nem quadros, sem cor na parede, sem porta e sem algo que permita despertar a atenção. Um vazio confortável e tranquilo em que nos refugiamos para não cansar a mente. Estamos ali, apenas a respirar e ver a variação de luz na tv. Mas este processo de relaxamento é constantemente interrompido pela pergunta : “ o que estás a pensar?”. A resposta é verdadeira, “nada!”. Esta resposta deixa a contraparte louca de fúria pois é inconcebível para uma mulher estar sem pensar em nada. A sua mente está sempre a processar informação. E pronto, lá vem a invasão da caixa do nada, com perguntas do estilo :” diz lá a verdade, há algum problema? Em que estás a pensar?”, “foi algo que aconteceu no trabalho” ou connosco?”… “NADA!”. Ou seja, temos de impedir a invasão da nossa “caixa do nada”, resistir estoicamente, senão começam a querer invadir o nosso vazio e colocar um “sofá”, um “tapete da moda”, uma “peça decorativa” e lá vai a nossa caixa do nada ao ar… temos de resistir e repetir “nada”, “nada”, “nada” aquele interrogatório inquisitivo que se segue!!! Interrogatório inocente pois “nada” para o género feminino, é genuinamente inconcebível. 

Este cenário cómico com que ambos os conjugues certamente se identificam, assemelha-se muito a uma conferência que tive o prazer de assistir do WI group sobre “the power of data”. Uma conferência repleta de jovens em que o único engravatado era eu. Julgo até que aumentei a média etária para 35 anos quando cheguei.

Entendi que a maior parte dos líderes das organizações são como eu, não percebem nada do futuro: do “big data”, do “business intelligence”, do “marketing automation”, do “machine learning”, do “SEO”, do “paid media”, do “programmatic”, do “content marketing”, do “social media”, do “UX/UI”… ufa !!! Fechei-me na minha caixa do nada e já não ouvi nada sobre “trendspotting”. No entanto decidi abandonar a minha “caixa do nada” quando entendi que tudo isto me pode fazer aumentar o número de leads qualificados, de aquisição dos clientes, de aumentar a lealdade, de oportunidades de “cross selling”, proporcionar uma oferta customizada e aumentar o “ROI”. Ou seja gerar EBITDA. E de forma sustentável através do “ToFu / MoFu/ BoFu” que avalia a viagem do consumidor desde o “awareness”, passando pela consideração, chegando à decisão, à compra, à retenção e ao “after sales”. Bem sei que saí da minha “caixa do nada” e pareço um especialista de “big data”, mas não sou. Continuo sem perceber nada do futuro. Não tenho sensibilidade para o momento de apocalipse do talento neste segmento. Não consigo avaliar as formas de risco da cibersegurança, do “data breach” e do “ransonware” embora percebo o seu impacto pelos exemplos a que temos assistido nos últimos tempos. Portanto os CEOs das organizações têm de sair da “caixinha do nada” e estar preparados para o “admirável mundo novo”. Ou seja liderar é mesmo rodearmo-nos de cidadãos e profissionais melhores que nós. O único conforto que tenho é que a maior parte dos CEOs sabem hoje menos que eu. E todos conhecem a história do leão que corria na savana, atrás de 2 caçadores para os comer: o caçador que quer sobreviver apenas tem de correr mais depressa do que o outro!