Wuhan, quatro anos depois: o dia em que o mundo mudou devido a um vírus que ainda não sabemos de onde veio

Wuhan, 2020: os rumores do encerramento espalharam-se rapidamente pela cidade chinesa devido a uma estranha pneumonia que já se havia espalhado, tendo sido confirmado, entretanto, que era transmitido entre humanos. Pouco depois das 22 horas do dia 22 de janeiro, confirmaram-se os rumores através de alertas nos telemóveis – o último avião ia sair da cidade às 10 horas do dia seguinte. A partir dessa altura, ninguém poderia entrar ou sair de Wuhan.

No dia seguinte, as ruas da cidade de 11 milhões de pessoas estavam praticamente vazias, com as lojas fechadas. “Encerraram todos os meios de transporte. Estamos presos” referiu o proprietário de uma floricultura. Os moradores ‘raparam’ os supermercados para enfrentar um confinamento incerto com as despensas cheias.

Nessa altura, a Comissão Nacional de Saúde adiantou que havia 574 pessoas infetadas, no entanto os jornais chineses garantiram que o número já ultrapassava as 6 mil. O vírus obrigou a China a dar um passo sem precedentes: o aeroporto de Wuhan, que tinha entre 600 e 800 voos diários, foi fechado, assim como o metro e comboios. Havia soldados às portas das estações para impedir a circulação – nos acessos à cidade, viaturas policiais bloquearam as estradas principais e montaram barricadas nas estradas secundárias.

Permaneceram abertos uma dúzia de hospitais para tratar pessoas com os sintomas do vírus, que entraram em colapso: o pânico coletivo instalou-se uma vez que ninguém sabia muito bem como se espalhava o vírus.

O jornal espanhol ‘El Mundo’ testemunhou as cenas caóticas iniciais que se iriam repercutir por todo o mundo nos meses seguintes: a pandemia, em termos de nível de alerta global, começou quando a China ordenou o encerramento de Wuhan a 23 de janeiro de 2020.

Quatro anos volvidos, Wuhan continua a carregar o estigma de ter sido o epicentro global de uma pandemia que provocou mais de 7 milhões de mortos em todo o mundo, cuja origem ainda hoje é desconhecida – a teoria predominante entre os cientistas é que o vírus é originário de morcegos, passou para outro animal e sofreu uma mutação que permitiu que se espalhasse entre humanos. Mas há muitas incógnitas: qual é o elo perdido nessa cadeia de infeções, quem foi o paciente zero e quando é que exatamente o vírus SARS-CoV-2 começou a circular em Wuhan.

Outra teoria, que não pode ser descartada neste momento, apontou para uma fuga num laboratório de segurança máxima em Wuhan, que estava coronavírus de morcegos.

A controvérsia mais recente surgiu na semana passada, quando um painel do Congresso dos Estados Unidos acusou a China de atrasar a publicação da sequência genética da Covid nos primeiros dias da pandemia. “A China atrasou em cerca de duas semanas (do final de dezembro de 2019 ao início de janeiro de 2020) a publicação de informações sobre o patógeno responsável pela Covid-19”, apontaram os responsáveis americanos.

A 23 de janeiro, em Wuhan, era claro que a primeira grande fonte de propagação tinha sido um mercado de frutos do mar e animais selvagens, cujo inventário continha mais de 40 espécies, desde porcos-espinhos até filhotes de lobos, vivos ou mortos. Alguns dos animais chegaram do sul da China, onde estão os morcegos-ferradura, os principais candidatos a hospedeiros originais do vírus. Mas falta saber o ‘salto’ para os humanos: dois estudos, liderados por Michael Worobey, biólogo evolucionista da Universidade do Arizona, e Kristian Andersen, virologista do Scripps Research Institute, na Califórnia, colocaram a culpa diretamente nos cães-guaxinim: os animais poderiam ter sido infetados na quinta que os vendeu ao mercado entre novembro e dezembro de 2019, tendo depois o vírus saltado para comerciantes e clientes.

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